Dia 30 de agosto de 1989 às 17hr40 - Presente

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Noite escura, sem estrelas, sentado na bancada de um bar, cansado, calado e só. Seus olhos expressavam uma meditação e concentração profundas, ou talvez apenas distrações passadas, de medos perdidos no tempo. Seus cabelos negros e suados davam um toque de adrenalina a cena, porém estava calmo. Suas sobrancelhas grossas e desarrumadas em constante movimento e as caretas que fazia com os lábios deixaram suas dúvidas evidentes. Um homem de meia idade.

- O que vai querer? – Perguntou o garçom. Não houve resposta, nem troca de olhares. – Senhor?

- Oi – olhou para o garçom, confuso – nada por enquanto, valeu.

Os olhos castanhos, fixos no nada, sem emoção e sem movimento, mas segurando lágrimas que não poderiam esperar mais para sair. Apoiou sua testa na bancada e, mais uma vez, olhou para o nada, sem esperanças.

- Que porre, hein? – Mais uma interrupção inesperada. Uma voz feminina e bêbada.

Piscou lentamente os olhos, saindo de seu transe profundo, cansado da vida ou de qualquer interrupção inapropriada. Levantou o rosto e olhou para o problema.

- Olha aqui...- parou, quando viu que o problema tinha um rosto conhecido – ...na verdade, eu...estou bem.

Agora tinha o que fitar. Segurou mais uma vez as lágrimas em seus olhos, secos pelo tempo, e respirou fundo. Afinal, as interrupções nem sempre são um problema em si, às vezes são um impulso para continuar a viver.

- O que foi então? – Ele não tirava os olhos dos dela, por mais que ela tentasse tirá-los – Não sou tão bonita assim, tá? – Sorriu.

- Não é isso, é que... você parece muito com alguém que eu conheci...

Talvez ele tirasse uma foto, para nunca mais ter que olhar para o vazio. Os cabelos negros da garota bêbada chegavam à cintura, as sobrancelhas bem delineadas, os cílios eram longos, o nariz...não era fino..., magra, de bochechas rosadas e bem maquiada, parecia ter 19. Mas seus olhos mereciam destaque. Não há cor que se compare ao verde daqueles olhos, nem nuvem que se compare ao branco que o envolvia. Seus olhos eram como grandes lagos: frios e quietos, atraindo todos para uma hipnose profunda e à uma sensação de êxtase inexplicável. Algo misterioso, mas também um bom lugar para se esconder de seus medos. Reconfortante.

- Uma garrafa de cerveja e uma porção de fritas, por favor! – Se virou para o garçom – Ah é? – Se voltou para o homem

- É sim – saiu do transe mais uma vez – só que mais nova.

- Se for a sua vó eu vou tomar essa sozinha. – Mais um sorriso.

- Não. – Sorriu também – É uma história interessante, na verdade. – Coçou a cabeça, nervoso.

- Por que não começa pelo seu nome?

Os olhos verdes da menina se fixaram no rosto de seu admirador, intrigados. Apesar de ainda atrair olhares, ela não parecia ter tido uma noite assim tão boa. Não era preciso observá-la por muito tempo para perceber suas olheiras, a vermelhidão das pálpebras e a tinta preta escorrida no canto dos olhos. A maquiagem escondia segredos. E o homem sabia disso.

- Daniel. – Respondeu, estendendo a mão.

- Amanda. – Disse, retribuindo o gesto.

O pedido foi entregue e, sem demora, a garrafa foi aberta e as batatas temperadas com pimenta. Amanda encheu um copo americano até a borda, mas Daniel só pegou umas batatas. Talvez estivesse tímido, ou, quem sabe, pretendesse levar a garota bêbada à casa dela ou talvez...

- Valeu, mas eu não bebo – esboçou um sorriso, depois de recusar a oferta.

- Cada doido com sua mania. – Zombou Amanda.

Seguiu-se um momento de silêncio. A garota bêbada tomou mais uma dose e o rapaz apenas abaixou a cabeça, constrangido. Os sons dos carros na rua, de uma TV ligada ao lado e do garçom reclamando das dívidas, além dos que deviam a ele, ainda existiam, mas tudo estava em silêncio para os dois. Ambos suavam pensando em qual seria a próxima frase a ser dita, mas nenhum deles falava coisa alguma. Era o pior dos silêncios, um silêncio mortal.

- Então, - Amanda cortou o silêncio – vai contar a história, ou não?

Daniel levantou os olhos e voltou a fixa-los em Amanda. Não se sabe se estava apaixonado sem motivo aparente por uma desconhecida num bar qualquer, ou se era apenas sono, mas o estado hipnótico em que se encontrava não era normal. Talvez estivesse surpreso com algo ou alguém no lugar errado e na hora errada, ou talvez no lugar certo e na hora certa, mas de forma inesperada. Só se pode dizer que Daniel com certeza estava confuso há muito tempo, e talvez essa conversa com uma garota bêbada num bar qualquer acabasse com suas dúvidas. Mas disso ele não tinha certeza. Iria arriscar.

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