Dia 30 de agosto de 1989

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Naquela noite eu não dormi. Era a primeira em dias e eu fiquei surpreso por não ter acontecido antes. Deitado na cama, passei horas jogando uma bola de tênis no teto, o que garantiu uma marca escura e redonda na tinta branca. Como eu sempre fazia nessas ocasiões, deixei o rádio ligado para tentar distrair minha mente, mas ela acabava repetindo a frase "aonde está você? Me telefona. ". Assim, passei meu resto do dia 29, desperdiçando um tempo precioso em remorso e confusão. Não estava pronto para o que aconteceu.

Minha manhã não foi tão diferente, o que mudou foi que, dessa vez, a psicóloga resolveu tomar seu café sozinha na casa para os hóspedes. Até pensei em dar uma passada lá, mas no final das contas continuei sentado na minha cadeira de balanço do lado de fora da casa. Apesar das tentativas, minhas ideias ainda pareciam um grande monte de bobagens. O pensamento de um adolescente, só que decidindo coisas muito mais adultas, como o desapego. E ali eu estava, mais uma vez refletindo sobre a minha eterna solidão.

- Bom dia, senhor Viana! – Me cumprimentou Tomás. – Senhor? Está tudo bem?

- Ah, oi! – Eu finalmente reparei sua mão estendida – Tudo bem com você?

- Não parece que você esteja tanto quanto eu.

- Que bom que você está bem. – Voltei a comer meu pão seco e a olhar para o nada.

- No que está pensando, doutor?

- Em nada. Vai comer vai.

- É sobre Bianca?

- Também. Olha, o café já está esfriando, por que não se apressa?

- Eu não vou lanchar com vocês hoje. Tenho coisas mais importantes a fazer.

- Como o quê? – Me levantei da cadeira e entrei na casa junto dele.

- Preciso me encontrar com ela, Daniel.

- Que bobagem você está pensando em fazer?

- Nenhuma delas soa bem.

- Então não devia fazer. – Parei bem entre ele e a escadaria.

- Saia da frente.

- Não vai dar.

- Há dois dias você se encontrou com sua esposa, Viana. Eu tenho todo o direito.

- Mas ela não sabe ficar de boca fechada? – Perguntei para mim mesmo.

- Ela confia em mim, devia começar a fazer o mesmo.

- Eu não confio, por isso eu vou com você.

- Ótimo. – Ele subiu apressadamente pelas escadas – Me espere em frente a garagem, não vou demorar muito.

Ele demorou muito. Esperei em frente ao portão durante quase 30 minutos e não houve nenhum sinal de que ele estivesse por perto, a ponto de eu começar a acreditar que ele havia me enganado. Pensei em ir procura-lo, porque comecei a temer pelo resto precioso de tempo que todos nós ainda tínhamos, mas caso ele estivesse por perto, talvez, se eu me distanciasse, nunca mais teria a chance de evitar que ele fizesse uma burrada. Mas, depois que ele chegou, abriu o portão e entrou rapidamente no Porsche preto que eu tinha dirigido dois dias atrás.

- Hoje eu dirijo, doutor.

*

Fizemos mais uma vez o percurso conhecido da cidade, o mesmo que eu apresentei para você há pouco tempo, mas agora passamos por ruas que eu desconhecia, por dentro de bairros que eu já tinha ouvido falar. E eram belos bairros. A parte nobre da cidade, com suas casas requintadas, pequenas, porém extremamente elegantes e limpas, cada uma com seus próprios jardins. Os prédios, também impecáveis, traziam coberturas deslumbrantes enfeitadas por orquídeas, algumas samambaias e outras plantas, exóticas ou não. A quietude das ruas e a tranquilidade com que tudo acontecia ali estava ainda para ser narrada por outra pessoa melhor do que eu, sem dúvida. A casa de Tomás era logo depois do paraíso.

Depois de NósWhere stories live. Discover now