Coffe & Sunflowers - KNJ

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P R I M E I R O

A brisa de primavera levava as pétalas das flores de cereja por toda a calçada, eu caminhava despreocupado sentindo os aromas, me perguntando o que aquele ano me traria. As pessoas já estavam em suas correrias diárias, era como se eu estivesse deslocado de tudo aquilo, um escritor tende a andar em contrapasso das outras pessoas que tem uma rotina.

Gostava de ver seus movimentos e como reagiam em todo o seu arredor, me decepcionava sempre quando não conseguiam perceber as belezas diárias que os cercavam, aquele sorriso direcionado por aquela pessoa especial, um bilhete de boa sorte para aquele teste tão esperado, um café expresso pela manhã, seu moletom preferido te acompanhando por longos anos, tantas coisas para lhe fazer sorrir fácil.

Bem, eu sorri quando vi que a fila dentro da minha cafeteria favorita estava pequena, que meu café favorito estava com desconto, e que ainda tinha boa parte da manhã para apreciar a paisagem e o cheiro de café sentado no meu lugar favorito. Todos temos aquilo que te dá paz durante o dia, eu gostava de coisas simples, era facilmente intrigado pelo novo e como um imã o seguia para desvendar cada pedacinho.

O vapor saia da xícara de porcelana branca inebriando meu olfato, as cores vivas já tomavam as roupas, era praxe que tivessem casais andando por aí com sorrisos contidos e bochechas rosadas. O cinza da cidade movimentada ainda estava lá, os trabalhos atrasados também e lembrar disso tirou um pouco da minha paz de espírito, deixei que o último gole de café forte descesse queimando o esôfago enquanto vestia meu sobretudo preto que que contrastava com a calça caramelo de sarja acompanhada por uma camisa branca sem gola e decote em forma de "v".

O sino da porta ressoou quando eu a empurrei, segurei para que duas moças pudessem entrar, me coloquei no caminho de volta para casa rezando para ter inspiração para escrever algo decente, nenhuma das minhas histórias atuais me enchiam o peito e se elas não podiam encher a mim mesmo quem dirá os leitores que discorriam seus olhos por sobre as letras. Caminhei um pouco mais apressado, o editor logo ligaria para saber as novidades e eu não teria nem sequer meia ideia para lhe dar.

Talvez eu devesse prestar mais atenção por onde caminhava,estava indo para o rumo totalmente oposto ao de casa, parei abruptamente quando me dei conta de que não sabia onde estava, tinhas algumas lojinhas ao redor, qual a possibilidade de eu ter entrado num portal dimensional? Com toda certeza, zero.

Baguncei o cabelo em frustração pensando onde tinha deixado o meu juízo, ou minha cabeça. Olhei ao redor pensando onde eu poderia conseguir informações, uma ajumma saiu pela porta da sua loja, em frente tinha uma banca com algumas flores e ela sorria para alguém que ainda estava fora minha visão, caminhei em passos lentos para apreciar o sorriso de criança daquela senhora. Ela usava um vestido creme quase branco, seu cabelo grisalho estava preso em um coque baixo, ela tinha um casaquinho marrom por sobre o vestido.

Sua voz soou e eu pude ouvir o pedido:

- MyungHee, traga as hortênsias, alguém tem que apreciar sua beleza até que elas murchem, são as últimas da estação. - Ela abanou a mão chamando quem quer que fosse.

- Aqui halmeoni, quando os girassóis vão florescer? - A voz delicada chegou aos meus ouvidos os acariciando, era um timbre entre o grave e o agudo. Era baixa e gentil.

Então eu vi sua silhueta sair, com um vestido branco estampado de rosas em tons de azul e lilás os cabelos pretos caíam como cascata negra em seus ombros, e um arco azul claro do tom das hortências segurava os fios rebeldes, o blazer do mesmo tom do arco em seu cabelo a deixou com um ar de menina-moça, parecia uma boneca de porcelana.

- Elas precisam de algum tempo ainda, querida. - A senhora tirou a bandeja com os vasos de hortênsias das mãos da garota e assim que a pequena me notou agarrou-se ao vestido da avó chamando sua atenção.

As cores de uma vozOnde histórias criam vida. Descubra agora