11. A Boutique de Charlotte

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Tudo estava claro e esbranquiçado, como uma névoa que rondava o ambiente.

Eu estava no mesmo quarto rosa salmão que conhecia tão bem, de pé, em frente a um espelho embaçado. Vestia o vestido branco rendado que era de minha mãe, os cabelos jogados sobre os ombros. E ela estava lá, linda como sempre.

Seu reflexo me encarava no espelho, me olhando com aquele semblante tranquilo e encantado. Um sorriso sereno nos lábios, enquanto ela cantarolava aquela mesma canção.

Eu nunca conseguia identificar a letra, estava em francês, mas era a mesma canção em todas as vezes.

Eu me viro para olhá-la de frente, ver se ela está mesmo ali, e nada é como se fosse apenas sonho. Parece ser tão real.

Posso tocá-la, olhar para ela e enxergá-la, no sentido mais puro e verdadeiro de enxergar. E, por fim, digo aquela mesma palavra de todas as outras vezes, que me faz acordar imediatamente, e minha voz sai embargada e quase inaudível.

- Mãe?

Quando fiz 12 anos, pedi a papai que me matriculasse em um curso de francês, para que eu pudesse tentar entender a letra daquela canção

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Quando fiz 12 anos, pedi a papai que me matriculasse em um curso de francês, para que eu pudesse tentar entender a letra daquela canção.

Sei que mamãe a cantava para mim quando eu ainda nem havia nascido e que ela mesma foi quem a compôs, quando ainda criança, romântica do jeito que era. Já sondei papai e tia Madá a respeito da letra várias e várias vezes, mas nunca disseram nada que pudesse esclarecer coisa alguma.

O curso foi bom em si, aprendi a ler em francês, a escrever e a falar, mas minha habilidade de escuta é péssima. Por isso nunca compreendi a letra da música, apenas suponho, o que é extremamente frustrante.

Quase em todos os sonhos em que minha mãe aparece é basicamente a mesma coisa, apenas com alguns detalhes de diferença. Estou com o mesmo vestido branco, ela canta e termina sempre comigo a chamando e minha voz ecoando pelo espaço. Charlotte gosta de dizer que sonhos tem significados e que, como o meu se repete tanto, eu deveria buscar saber o que ele quer me dizer.

No entanto, eu mesma não sei se acredito em tudo isso, nessas psicologias astrais. Para mim, os sonhos apenas refletem o que está preso na nossa mente, seja nos incomodando, seja nos alegrando. Então prefiro acreditar que essa repetição toda não é mais do que a saudade pela minha mãe se expressando.

Mesmo assim, ainda comentei sobre ele com Madame Charlotte depois de termos chegado a sua grande reinauguração. O lugar estava lotado, e até um repórter do pequeno jornal da cidade estava presente, entrevistando a todos que quisessem falar.

- Eu não julgo você por me achar uma velha maluca, mas, sinceramente, acho que seus sonhos querem, sim, te dizer alguma coisa - Charlotte insistiu, após mais uma de nossas discussões sobre o assunto.

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