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   Brian não tinha dormido muito bem.

   Sua transformação levou ele a fazer várias perguntas sobre o seu passado e sua espécie, ele não conhecia tudo o que deveria, só lembrava de pequenas coisas como a aparência de sua mãe biológica, o comportamento pacífico de seu cardume, os feitiços proibidos...

   — Cardume... — Ele abriu os olhos, sentindo sua cauda tocando na parede de tão grande que ela estava. — Eu me transformei enquanto dormia?

   Ele sentou na cama, passando a mão pelos cabelos e olhando para a cauda, ainda a estranhava. Desistiu de tentar compreender aquilo, trocou a cauda por suas pernas e se levantou, afinal, queria aproveitar o seu dia livre antes de ir trabalhar na segunda-feira.

   Enquanto estava no banheiro escovando os dentes, escutou gritos vindos da cozinha, largou tudo e desceu as escadas correndo, se deparando com uma situação totalmente inesperada.

   Seus pais estavam encostados na parede, apavorados, e haviam dois estranhos na sala, um deles era uma mulher loira e magra, com belos olhos azuis, acompanhado por um rapaz também loiro, este com olhos verdes e um corpo musculoso. Os dois usavam uma espécie de armadura feita com escamas de um material metálico, e seguravam espaçadas.

   — Calma! Calma! — Ele gritou, se colocando entre seus pais e os estranhos. — O que é isso?!

   Os dois olharam para Brian de cima a baixo, recolheram as espadas e se ajoelharam na frente dele, com a mão no peito.

   — Mestre. — Os dois disseram em uníssono. — Viemos resgatá-lo.

   E Brian desmaiou.

   •••

    O tritão acordou ainda um pouco atordoado, estava sentado no sofá, seus pais estavam ao lado e os dois estranhos estavam sentados no chão, na frente dele, a mulher tinha um sorrisinho e os olhos brilhando, enquanto o homem parecia estar de mal humor.

   — Não queríamos assustá-lo dessa maneira mestre. — A mulher abaixou a cabeça.

   — Certo, eu não sou o mestre de ninguém, e quero saber quem são vocês! — Ele disse um pouco assustado.

   — Lury não é, ele nem sabe identificar as pessoas do próprio povo. — O loiro disse.

   — Fica quieto B'hen. — Ela o cortou. — Podemos explicar tudo mestre, mas antes, precisamos ter certeza de que você é um dos nossos, poderia mostrar suas costas?

   Brian ficou um pouco apreensivo, uma estranha simplesmente entrou na sua casa, ameaçou seus pais e ainda queria que ele tirasse a camiseta? Mesmo assim, ele atendeu ao pedido, levantando-se do sofá, se desfazendo da peça e virando de costas.

   — É a marca B'hen, só pode ser ele. — A mulher se levantou, tocando a pele dele. — Não foi forjada ou desenhada por ninguém, simplesmente faz parte dele...

   — Você sabe o que significa? Isso apareceu em mim ontem.

   — É claro que sabemos, é o símbolo de Estera Maris, o seu cardume, os membros da família dos líderes nascem com esta marca.

   — Não é bem mais fácil explicar a história toda desde o começo pra ele? — O loiro cortou sua parceira.

   — Está bem seu chato. — Ela franziu o cenho. — É melhor se sentar mestre, não é uma história tão breve assim.

   Brian sentou e respirou fundo, esperando para que todas as suas dúvidas fossem sanadas. A loira limpou a garganta e começou a falar.

   — Bom, o cardume Estera Maris é um dos cardumes mais antigos que existem no mar, éramos conhecidos por ser um clã extremamente pacífico, éramos proibidos de praticar feitiços e práticas de guerra, pois assim acreditávamos que viveríamos para sempre em paz, nunca interferimos em guerras de outros cardumes e sempre nos deslocamos para evitar conflitos... Mas todos nós, seres do mar, sempre tivemos um inimigo em comum, os humanos, o humano que encontrasse uma sereia poderia enriquecer, a exibindo como um troféu para o mundo, extraindo tudo o que ela poderia produzir...

   Houve uma pausa, a loira fuzilou os pais de Brian com o olhar e continuou a falar.

   — Até hoje não sabemos ao certo o que aconteceu, mas vários pescadores de uma mesma região começaram a perseguir nosso cardume, e nós não sabíamos como nos defender... Tivemos muitas perdas, incluindo a nossa rainha. — Ela tentou sorrir para Brian. — Você é igualzinho a ela.

   Aquela era uma boa explicação para a tiara que sua mãe usava.

   — O nosso líder sobreviveu ao ataque, mas ficou muito ferido e morreu um tempo depois, seu pai disse que você estava seguro, em um lugar bem longe dali, mas não tínhamos recursos para rastreá-lo ou trazê-lo de volta ao cardume. Depois desse ataque, todos tiveram permissão para aprender sobre os poderes e técnicas de guerra, e foram criados os patrulheiros. Nós patrulheiros tentamos nos misturar com a sociedade para conseguir informações, mas nossa missão no momento era chegar até o nosso herdeiro. Ontem você chegou até a idade adulta, está pronto para liderar, e isso acabou nos mandando um sinal.

   — Um segundinho aí. — Brian cortou. — Vocês querem que eu simplesmente apareça pra um monte de seres do mar como um rei?!

   — Sinceramente, é isso mesmo. — O loiro confirmou.

   — Eu vou fazer vinte anos ainda!

   — Está apto, já houveram reis mais jovens. — A loira cruzou os braços. — Seu avô Bri  segundo chegou ao trono com dez anos.

   — Bri segundo!?

   — Você é o Bri quarto, e tem o sangue da família que lidera, deverá voltar conosco para o mar e assumir o seu posto.

   — Eu sequer tenho direito a um tempo para pensar? — Brian quase gritou. — Vocês não podem chegar aqui impondo o que eu devo fazer da minha vida!

   — Nenhum de nós está dando ordens ao senhor, mas precisamos de um líder. — Lury abaixou a cabeça. — É claro, pode ter um tempo para pensar.

   — Se quiser visitar o nosso cardume para pensar melhor... — B'hen sugeriu.

   — Seria ótimo, você poderia dar uma olhada na nossa estrutura, e também começar a escolher sua rainha.

   Brian quase engasgou.

   — Além de ter que assumir um posto que eu nunca quis eu vou ter que me casar?!

   — Bom... É a tradição. — A loira deu de ombros.

   — Eu não sei como sua "tradição" reagiria a isso, mas eu tenho um namorado.

   — Tudo perfeitamente bem. — A loira disse indiferentemente.

   — Sério? Foi mais fácil do que eu pensei..
  
   — Depois do massacre, houveram alguns problemas, como falta de mulheres, e algumas coisas passaram a ser liberadas, por exemplo, o B'Hen é casado com um tritão.

   — Isso é realmente necessário agora? — O loiro arqueou uma sombrancelha.

   — Então... Eu posso levar o Roger comigo pra seja lá onde seja Estera Maris?

   — É claro, de que cardume ele é? — Lury questionou, fazendo Brian coçar a nuca.

   — Então... Como eu posso dizer... O Roger é humano.

  

Beyond The Sea • MaylorOnde histórias criam vida. Descubra agora