17. O Olhar da Janela

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Da janelinha no Palácio Tenente, a paisagem pacata de Amedoína dava nos nervos de Danúvio

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Da janelinha no Palácio Tenente, a paisagem pacata de Amedoína dava nos nervos de Danúvio. O vilarejo, quieto e sucinto, parecia, a seus olhos, errado de certa maneira. Ele observava aquelas árvores de tronco e folhas vermelhas emoldurando as ruas sujas e vazias, a sobrancelha levemente erguida. Em seu rosto, o calor e a aridez da região pinicavam como pequenos insetos. Gotas de suor se acumulavam em sua testa e pescoço. Ele se sentia deslocado, como que usando os sapatos de outra pessoa. Mas não era apenas isso.

Tornando para o quarto vazio e sem graça, o príncipe deixou um suspiro escapar pelos lábios, os pés chutando o piso de madeira. A quietude, a calmaria, a brisa cálida que soprava e os pássaros negros empoleirados nos telhados de palha, tudo era tão pacato e monótono que era difícil conter um arrepio de apreensão. Algo estava prestes a acontecer, o menino podia sentir, algo grande, poderoso e assustador, embora não desse exatamente para saber o que.

Assim fora aquela noite em que seu pai encontrou a morte.

Danúvio não tinha exatamente como saber, mas era assim que contava Dragoberto: um dia pacato, de sol alto, brisa tranquila e sem grandes solavancos, até que uma tempestade se formou. Vasculhando a memória, tudo que Danúvio se lembrava era das luzes — riscos fortes e incompreensíveis tomando o céu atrás da janela turva da água da chuva e o som de algo grande e abafado estourando do lado de fora. Após, a queda daquele considerado dos maiores reis de Tomi-Sulim, um rosto que, embora familiar ao jovem príncipe, ele jamais teve a honra de encontrar em vida. Agora, naquele vilarejo estranho e distante, solitário sobre sua cama fedorenta e desconfortável, Danúvio sentia na barriga o frio da tempestade que se aproximava. Ele se perguntava, com uma voz retumbando a seus ouvidos, se estava pronto para o que viria.

E será mesmo que estava?

— Pensativo, alteza? — A voz do sujeito sobressaltou Danúvio, que virou os olhos para a porta entreaberta do quarto, por onde entrava um Licarlo com os cabelos molhados e uma camisa diferente, bege e solta, evidenciando um pouco de seus músculos.

O príncipe tentou disfarçar o desconforto e segurou o cabo de Cortagritos como se não pudesse evitar.

— Estou apenas indignado com a demora desse tal Patolá. Ora, que tipo de tenente faz o filho da rainha esperar por todo esse tempo? É um desrespeito que não pode ser tolerado!

Licarlo sorriu, assentindo com a cabeça. Suas feições eram leves e simpáticas, mas a pele parecia castigada e endurecida.

— De fato, 'tamo sendo feito de otário aqui. Mas eu não culpo o Patolá, pra ser sincero. — Ele tinha se adiantado pelo quarto e se aproximado da janela. Olhava para o lado de fora com um misto de admiração e... medo? — Tem algo errado com esse vilarejo, isso eu posso te dizer. Sete anos andando esse reino todo, e poucas vez eu senti essa... sensação, sabe?

Danúvio mordeu o lábio.

— De que algo muito ruim tá prestes a acontecer?

Licarlo o observou, erguendo as sobrancelhas.

O Presságio do Sineiro: Rastro de FogoOnde histórias criam vida. Descubra agora