— A Alphaniana I é o transmissor quântico mais veloz que já foi lançado! — expliquei, com o orgulho batendo no peito. — Bom, ainda não lançado... Mas pode ter certeza de que em poucos dias estará em todos os laboratórios!
— Mas qual é a real funcionalidade dele? - questionou Lisa, curiosa, porém levemente descrente.
— É-É... transferir particulas em nível quântico - Lisa me pegou de supresa. Se tinha uma coisa que eu não tinha pensado era na utilidade. Será que isso era algo importante?
— Mas já existem diversos transmissores moleculares! A Watson Technologies faz isso há uma decada — explicou com uma gargalhada sem graça, como a de quem não queria ser a estraga-prazeres do grupo. - Como você acha que fazem os efeitos de filmes 7D se não teleportando a chuva pra dentro da sala do cinema no momento certo, por exemplo? É a tecnolo--
— Na verdade não é só isso, tem um detalhe especial — Ela estava certa. Era inútil.
— Calma, não quero dizer que é inútil — A desgraçada sabe ler mentes. — Com certeza você tem algo bom aí para me mostrar.
— Claro, com certeza — respondi, apressado e sem graça.
Era minha chance, minha única chance. Estava prestes a realizar a primeira apresentação extraordinária do meu mais novo e misterioso - até para mim — produto. E ainda para uma das pessoas que mais marcou minha história acadêmica e iniciação profissional. Tinha que dar meu melhor.
— Vamos começar — declarei, estufando o peito como um grande e orgulhoso fundador de multinacionais faria. O que não é meu caso, diga-se de passagem.
Caminhei até a máquina esquisita e lancei um olhar conquistador para minha máquina de café expresso superpoderosa — para todos os efeitos, era este o formato do corpo do primeiro protótipo. Fazia algum tempo que eu não tomava café líquido, provavelmente desde que as cápsulas de cafeína sintetizada se tornaram acessíveis, mas eu certamente sabia colocar a cápsula no slot e apertar o start para fazer a mágica. E foi o que fiz.
Sem mais palavras, fui em direção à máquina sobre o balcão, saquei lentamente a cápsula que continha a substância enquanto acariciava o corpo arredondado da máquina com a outra mão, aproximei a placa de Petri elétrica do dispositivo e iniciei a explicação com o ar de quem mexia com aquilo há séculos.
— Imagine que a substância dentro desta cápsula é um fragmento de uma mente. Assim como o verdadeiro fragmento mental, a substância BG-75A é um composto etéreo e pode ser facilmente perdido. Por este motivo, precisamos mantê-la dentro desta cápsula de carbono-14 niquelado até que a maquina comece a processar. Para proteção posterior, preciso de um obstáculo para que ela não se misture, uma redoma de vidro tratada por sais de urânio inativado.
Enquanto falava, busquei na outra mesa a esfera e encaixei estilosamente sob a boca da máquina, apoiada sobre a base, fazendo Lisa rir da minha cara disfarçadamente. Fingi que não notei e continuei minha cena, inserindo a cápsula dentro do bocal da máquina, na parte superior, e me preparando para pressionar o botão mágico.
- Agora falta um só passo. Apertando este botão, o sistema vai reconhecer sua identidade vital e, se você for o dono da mente transferida, o fragmento vai ser liberado da cápsula e envolvido pelo plasma até que ela vá para outro lugar, a placa de Petri.
Chegara o momento. Estava com meu dedo contra o botão e Lisa contra minha crença de que algo funcionaria.
Tudo ocorreu como esperado. Botão pressionado, cápsula cortada, substância absorvida e plasma liberado.
A substância etérea se quebrou em diversas partículas, o que seria impossível de notar caso o plasma não as iluminasse. Eram nítidos os raios cruzando o elemento.
Restava um único passo. Liguei a placa de Petri e um holograma surgiu para que eu pudesse ver o que ela estava recebendo. Em questão de segundos, surgiu a primeira mancha da substância.
Meus olhos brilhavam por ver pela primeira vez meu melhor experimento funcionar, mas o brilho dos olhos de Lisa certamente ofuscava os meus. Algo que durou pouco tempo. Com 40% da transferência concluída, o gerador perdeu potência e o laboratório ficou sem energia.
Por ser um ambiente isolado, não tinha nenhuma fonte de luz, estávamos só nos e o breu. Na verdade, cada um de nós e o breu, não sabíamos onde o outro estava.
Tentei chamar por Lisa ou Marjan, mas a câmara de vácuo despressurizada, causou silêncio ao nosso redor. Escutava apenas a poucos centímetros de distância.
A melhor forma de encontrar algo no escuro é indubitavelmente tateando o ambiente. Mais seguro ainda se for pelo chão, e foi o que fiz. Ajoelhei-me e fui apalpando para cima pela borda da mesa em busca de algo ou alguém. Por sorte conhecia muito bem o laboratório e sabia para onde estava indo.
Após algum tempo apalpando, estava ficando preocupado, pois tudo o que encontrava eram equipamentos. Os malditos equipamentos que ficam no meio do caminho por culpa da minha falta de organização. Comecei a buscar mais rapidamente, investindo contra o ambiente, quem sabe eu esbarrava em algo que chamasse a atenção.
Em meio ao desespero, finalmente sentir meus dedos atingirem algo, uma mão, e cruzei os dedos para segurar a pessoa. Aquele momento me deixou extremamente aliviado. Eu conhecia aqueles dedos finos e pequenos, eram de Lisa, ela estava bem. Minha preocupação com Lisa era maior que com Marjan, já que Marjan não estava no ambiente da substância quando ela foi liberada.
Lisa, em um movimento de desespero, demorou para notar que se tratava da minha pessoa e se jogou sobre meu corpo, me derrubando. Emiti apenas um suspiro como quem foi pego de surpresa, mas ainda estava extasiado com o alívio. Agora a distância entre nós era de centímetros, quase milímetros, ela estava exatamente em cima de mim, então conseguia ouvir minhas reações.
Ao perceber quem era, Lisa caiu na gargalhada, me pressionando ainda mais contra o chão. Eu apenas me sentia bem.
— Achei que fosse um monstro — ironizou cochichando. Não entendi por que falava tão baixo se ninguém podia nos ver ou nos ouvir, mas eu gostei da sensação.
— Pois é, posso ser um se quiser.
Neste momento, ficamos em silêncio, não víamos a reação do outro, mas sabíamos pela proximidade e pelo ar emitido que ambos estavam rindo. Ela estava me pressionando bastante, quase esmagando, de forma que eu podia sentir sua respiração cada vez mais profunda. E além de mais profunda, estava nitidamente mais próxima. Apesar do escuro, eu podia notar que aqueles centímetros de distância se tornaram milímetros.
Uma pausa longa, nem sequer uma única palavra, apenas respiração, um ar leve rodeando nossos rostos. Como um impulso pela aproximação extrema dos rostos, minha única reação foi fechar os olhos. Não sei qual foi a dela.
Estávamos a micrômetros de distância, quando ouço um ruído perto de mim. Alguém falando, cortando o vácuo com sua voz berrante.
— É você Bob? — questionou Marjan, agachando para me tocar. Ela estava prestes a nos ver deitados. O escuro nos fez bem.
— S-Sim, estou ajudando a Lisa a levantar, ela não conhece o laboratório e achou melhor se manter no chão ao invés de esbarrar em tudo nesse escuro.
— Fez certo — concordou Marjan em tom duvidoso. — Você tem ideia do motivo do apagão?
— Sim, acionei o protótipo e ele funcionou. As partículas foram transferidas para a placa de Petri. Mas provavelmente consumiu energia demais para o gerador suportar.
Marjan parou por um momento, certamente estava pensando. E eu temia suas próximas palavras. Definitivamente não foram realmente as que eu estava temendo, mas parecia algo tão suspeito quanto:
— Mas se você ligou a máquina e as partículas carregadas brilham... e elas estão na placa de Petri... como estamos no escuro?
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Ayreon: O Experimento Final
Science-Fiction🥉[3º Lugar melhor ficção - Concurso Sunshine] 🥈[2º Lugar melhor ortografia - Concurso Diamante Azul] 2084 d.C. A humanidade está se destruindo aos poucos, o mundo está por um fio. Diante disso, cientistas do mundo todo se reuniram para enviar de v...