15 - Victor Vitória Sa

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Não pretendo passar uma vida de lamentações atrás de portas.

Finalmente tenho a oportunidade de viver, de respirar a liberdade e colocar para fora tudo o que nos faz mal, exigindo o que simplesmente convém à uma pessoa normal e não gostaria de ceder ao marasmo de Victor.

Eu analiso tudo o que há a minha volta e tenho de tudo. Preciso saber como usar cada uma dessas coisas com uma pitada de insensatez. E que eu não seja criticada por isso. Vinte e sete anos faz de mim jovem demais para estar tão cansada da vida.

Fico feliz pelo emprego. Vou dar o que há de melhor e hoje ninguém me segura. 

— Hum! Que aspecto bom, Victor. Sábado à noite senti que estava bem melhor só pelo seu tom de voz. Como estão as coisas entre vocês? 

— Ali não tem volta. Não vamos correr atrás de macho, se é que me entende. Você não tinha uma namorada? Depois que liguei para você, lembrei disso.

— Nem lá nem cá. Não é namorada...

— Não? Olha que não aceito dividir coisas e pessoas com os outros signos.

— Só amiga, na verdade. A família é mais feliz quando pensa que sou solteiro pegador que não sossega o suficiente para namorar. Deve imaginar que homens com mais de trinta bem sucedidos deveriam estar no mínimo divorciados e com um filho.

— Entendi mais ou menos, mas não me convenci. 

— Amiga de pau. Pau amigo. — Murilo ergue as sobrancelhas e baixa o olhar para as gavetas. — Victor... Não dá para falar abertamente essas coisas com qualquer um. E sim, fico no armário que é mais tranquilo. Precisa ouvir minha mãe fazendo propaganda sobre mim para suas conhecidas. Parece que quer vender produtos da Abelha Rainha. 

— Entendo mais que perfeitamente. Por isso arrastou a asa pra cima do Victor.

— "Do" Victor?

— Coisa complicada, patrão. Entendo o que passa, Victor passou pelo mesmo. 

— Vamos trabalhar então? — Murilo seca uma lágrima discreta — Obrigado.

Sorrimos um para o outro e então sem mais conversas, Murilo me passa a situação de Diogo Chaves, o homem da espetacular voz, o mesmo que elogiou o Victor. Que voz! Imagino o porte dele só pela voz. Deve ser poderoso. Senhor vozeirão, eu o apelido.

— Bom dia, senhor Diogo. 

— Lá vem esse rapaz me chamando de velho. 

— Velho? Nem me passou pela cabeça. É costumeiro tratar os nossos clientes com certa formalidade. Vou me esforçar para chamá-lo de Diogo. O Murilo me passou a situação. Comprou equipamento novo. Claro que vou configurar. Hoje? Claro.

Minha empolgação não é estranha, Vitória não gosta de ficar presa. Afonso disse que ia pela manhã, pois é quem geralmente faz serviços externos, mas algumas condições fizeram Murilo desistir de envia-lo até Diogo. Reclamações sobre ele e especialmente elogios me elegeram para que eu fosse cumprir essa etapa.

Vou matar a curiosidade sobre o Senhor Vozeirão.

Dez minutos antes do almoço, Nero me liga com insistência e obviamente, que ignoro. Hora do almoço é para nos deliciarmos com o trivial, arroz, feijão, batata frita e bife, ouvir lamentações de Raquel sobre sua condição física, obesidade, cento e vinte e oito quilos de tristeza e ouvir a nova secretária reclamando do salário enquanto apreciamos o sabor da sobremesa, um pudim de baunilha com grumos mal dissolvidos de maisena. 

Victor VitóriaOnde histórias criam vida. Descubra agora