CAPÍTULO 1 - AUROX

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CAPÍTULO 1 – AUROX
A carne do homem era macia, suculenta.
Foi uma surpresa o fato de ter sido tão fácil destruí-lo e fazer o seu coração fraco parar de
bater. - Leve-me para o norte de Tulsa. Eu quero sair à noite - ela
Foi com essa ordem que a noite deles começou. - Sim, Deusa - ele respondera
instantaneamente, saindo cheio de vida do canto da varanda no topo do prédio no qual ele tinha sido
feito. - Não me chame de Deusa. Chama-me... - ela parecera contemplativa. - Sacerdotisa - seus lábios
carnudos, rubros e brilhantes se curvaram em um sorriso. - Acho que é melhor se todo mundo me
chamar simplesmente de Sacerdotisa, pelo menos por um breve período. Aurox cruzou sua mão em
punho sobre o peito, fazendo um gesto que ele instintivamente sabia ser de um tempo antigo, embora,
de algum modo, achasse aquilo estranho e forçado. - Sim, Sacerdotisa. A Sacerdotisa passara rápido
por ele, gesticulando imperiosamente para que ele a seguisse. E ele a seguira. Ele havia sido criado
para segui-la. Para receber suas ordens. Para obedecer aos seus comandos. Então, entraram em uma
coisa que a Sacerdotisa chamara de carro, e o mundo voara. A Sacerdotisa ordenou que ele entendesse
o funcionamento daquilo.
Ele observara e aprenderam como ela tinha mandado. Pararam e saíram do carro. A rua tinha
um cheiro de morte, podridão, depravação e imundice. - Sacerdotisa, este lugar não... - Proteja-me! -
ela respondeu rispidamente. - Mas não seja protetor! Eu sempre vou aonde quero, quando quero e
faço exatamente o que quero. É o seu trabalho, ou melhor, o seu propósito, derrotar os meus inimigos.
E criar inimigos é o meu destino. Observe. Reaja quando eu ordenar que você me proteja. Isso é tudo o
que eu exijo de você. - Sim, Sacerdotisa - ele disse. O mundo moderno era um lugar confuso. Tantos
sons inconstantes. Tanta coisa que ele não conhecia. Ele faria como a Sacerdotisa ordenara. Ele iria
cumprir o propósito para o qual fora criado... Um homem deu um passo para frente, bloqueando o
caminho da Sacerdotisa. - Você é bonita demais para estar aqui neste beco tão tarde só com um garoto
para te acompanhar - os olhos dele se arregalaram quando ele viu as tatuagens da Sacerdotisa. - Então,
vampira, você deu uma parada aqui para usar esse garoto como um lanchinho, é? Que tal você me dar
essa bolsa e então eu e você vamos falar como é estar com um homem de verdade, hein? A
Sacerdotisa suspirou e pareceu entediada. - Você está errado em ambas as suposições: eu não sou
simplesmente uma vampira e ele não é um garoto. -Ei, o que você quer dizer com isso? A Sacerdotisa
ignorou o homem e olhou por sobre o ombro para Aurox. - Agora você deve me proteger. Mostre-me
que tipo de arma eu comando. Ele a obedeceu sem pestanejar. Aurox se aproximou do homem sem
hesitar. Com um movimento rápido, Aurox cravou seus polegares nos olhos arregalados do homem, o
que fez a gritaria começar. O pavor do homem o inundou, alimentando-o. Tão simplesmente quanto
respirar, Aurox inalou a dor que ele estava causando. O poder do medo do homem se dilatou dentro
dele, latejando quente e frio. Aurox sentiu suas mãos se endurecendo, mudando, tornando-se algo
mais. O que eram dedos normais viraram garras. Ele as puxou dos olhos do homem quando o sangue
começou a vazar dos ouvidos dele. Com o poder emprestado da dor e do medo, Aurox levantou o
homem, e o arremessou com força contra o muro do prédio mais próximo. O homem berrou de novo.
Que excitação maravilhosa, e terrível! Aurox mais ondulações de transformação pelo seu corpo. Meros
pés humanos tornaram-se patas de diabo. Os músculos de suas pernas se engrossaram. Seu peito
inchou e rasgou a camiseta que ele estava usando. E o melhor de tudo, Aurox sentiu chifres grossos e
mortais que cresceram na sua testa. No momento em que três amigos do homem correram para o
beco para ajudá-lo, ele tinha parado de gritar. Aurox deixou o homem na sujeira e se virou para se
colocar entre a Sacerdotisa e aqueles que acreditam que poderiam causar algum mal a ela. - Que
merda é essa? - o primeiro homem chegou correndo e parou de repente. - Nunca vi nada parecido com
isso - disse o segundo homem. Aurox já estava absorvendo o medo que começava a irradiar deles. Sua
pele pulsava com aquele fogo frio. - Aquilo são chifres? Ah, merda, não! Tô fora! - o terceiro homem se
virou e correu por onde tinha vindo. Os outros dois começaram a se afastar devagar, com os olhos
arregalados, em choque e olhando fixamente. Aurox se virou para a Sacerdotisa. - Qual é a ordem? -
em alguma parte distante de sua mente, ele ficou surpreso com o som da sua voz, em como ela tinha
ficado tão gutural, tão bestial. - A dor deixa você mais forte - a Sacerdotisa pareceu satisfeita - E
diferente, mais feroz - ela olhou para os dois homens em retirada e o seu carnudo lábio superior se
levantou em um riso de escárnio. Não é interessante? Mate-os. Aurox se moveu tão rapidamente que
o homem mais próximo não teve nenhuma chance de escapar. Ele espetou o peito do homem com
seus chifres e o levantou, fazendo ele se debater, berrar e sujar as próprias calças de medo. Isso
deixou Aurox ainda mais poderoso. Com uma forte sacudida de cabeça, o homem espetado voou para
a parede e depois para o chão, encolhido e silencioso, ao lado do primeiro homem. O outro homem
não fugiu. Em vez disso, ele pegou uma faca longa e de aparência perigosa e arremeteu contra Aurox.
Aurox fez uma finta para o lado e então, quando o homem se desequilibrou, ele pisou com força com
sua pata sobre o pé dele, rasgando o seu rosto enquanto o homem caía para frente. Com a respiração
ofegante, Aurox olhou os corpos dos seus inimigos derrotados. Ele se voltou para a Sacerdotisa. -
Muito bem - ela disse sem emoção na voz - Vamos sair deste lugar antes que as autoridades apareçam.
Aurox a seguiu. Ele andou pesarosamente, suas patas escavavam sulcos no beco sujo. Fechou suas
garras em punho ao seu lado, enquanto tentava compreender a tempestade emocional que fluía pelo
seu corpo, levando com ela o poder que havia alimentado o seu frenesi de combate. Fraco. Ele se
sentia fraco. E mais. Havia algo mais. - O que é? - ela perguntou de modo ríspido quando ele hesitou
antes de entrar no carro de novo. Ele balançou a cabeça. - Não sei. Eu me sinto... Ela gargalhou. - Você
não sente absolutamente nada. Você obviamente está pensando demais nisso. Minha faca não sente.
Meu revólver não sente. Você é minha arma; você mata. Lide com isso. - Sim, Sacerdotisa - Aurox
entrou no carro e deixou o mundo ficar para trás em ritmo acelerado. Eu não penso. Eu não sinto. Eu
sou uma arma. - Por que você está parado aqui olhando para mim? - a Sacerdotisa perguntou a ele,
encarando-o com seus gélidos olhos verdes.
- Eu aguardo as suas ordens, Sacerdotisa - ele respondeu automaticamente, pensando em como
era possível que ele a tivesse desagradado. Eles tinham acabado de voltar para a cobertura no alto do
majestoso edifício chamado Mayo. Aurox havia andado até a varanda e simplesmente ficara ali parado,
em silêncio, olhando para a Sacerdotisa. Ela expirou o ar com força. - Eu não tenho nenhuma ordem
para você neste momento. E você precisa ficar sempre me encarando? Aurox olhou para longe,
focando nas luzes da cidade e em como elas brilhavam de modo atraente contra o céu da noite. - Eu
aguardo suas ordens Sacerdotisa - ele repetiu. - Ah, por todos os deuses! Quem iria imaginar que o
Receptáculo criado para mim seria tão idiota quanto bonito? Aurox sentia a mudança na atmosfera
antes que as Trevas se materializassem da fumaça, da sombra e da noite. - Idiota bonito e mortal... A
voz ressoou na sua cabeça. O enorme touro branco tomou forma diante dele. Seu hálito era fétido, ainda que doce. Seu olhar era horrível e maravilhoso ao mesmo tempo. Ele era mistério, magia e caos
juntos. Aurox se ajoelhou na frente da criatura. - Levante-se e vá para trás... - ela balançou a mão,
dispensando-o com um gesto em direção ás sombras do canto mais distante da varanda. - Não, prefiro
que ele fique. Eu tenho prazer em observar minhas criações. Aurox não sabia o que dizer. Essa criatura
comandava a sua atenção, mas a Sacerdotisa comandava o seu corpo. - Criações? - a Sacerdotisa
colocou uma ênfase especial no final da palavra enquanto ela se movia languidamente em direção ao
touro corpulento. - Você sempre cria presentes como esses para seus seguidores? A risada do touro foi
horrível, mas Aurox percebeu que a Sacerdotisa não se sobressaltou nem um pouco - em vez disso, ela
parecia ser atraída cada vez mais para perto do animal gigantesco enquanto ele falava. - Que
interessante! Você está mesmo me questionando! Você está com ciúmes, minha cara impetuosa?
A Sacerdotisa acariciou os chifres do touro. - Tenho motivos para estar? O touro a acariciou com
seu focinho. Onde ele tocou a Sacerdotisa, a seda do vestido dela se enrugou, expondo a carne macia e
nua que estava por baixo. -Diga-me, qual você acha que é o propósito do meu presente a você?"- o
touro respondeu à pergunta da Sacerdotisa com outra pergunta". A Sacerdotisa piscou e balançou a
cabeça, como se estivesse confusa. Então o olhar dela encontrou Aurox, ainda ajoelhado. - Meu
mestre, o propósito dele é proteção, e eu estou pronta para o que você ordenar para agradecer. - Eu
vou aceitar suas deliciosas oferendas, mas eu devo explicar que Aurox não é só arma de proteção.
Aurox tem um propósito, que é criar o caos. A Sacerdotisa inspirou profundamente, em choque. -
Verdade? - ela perguntou com uma voz suave e reverente. - Através dessa única criatura eu posso
comandar o caos? Os olhos brancos do touro pareciam à lua se pondo. - Verdade. Ele é, de fato, uma
única criatura, mas seu poder é vasto. Ele tem a capacidade de deixar o desastre no seu rastro. Ele é o
Receptáculo, que é a manifestação dos seus sonhos mais profundos, e eles não são o mais completo e
absoluto caos? - Sim, ah, sim - a Sacerdotisa suspirou as palavras. Ela se inclinou contra o pescoço do
touro, acariciando seu dorso. - Ah, e o que você vai fazer com o caos agora que ele está sob seu
comando? Você vai botar abaixo as cidades dos humanos e governar como minha rainha? O sorriso da
Sacerdotisa era bonito e horrível. - Rainha não. Deusa. - Deusa? Mas já há uma Deusa dos vampiros.
Você sabe muito bem disso. Você já esteve a serviço dela. - Você quer dizer Nyx? A Deusa que permite
que seus subordinados façam escolhas e tenham vontade própria? A Deusa que não interfere porque
acredita com tanta força no livre-arbítrio?
Aurox achou que podia ouvir um sorriso na voz da besta e ficou imaginado como isso era
possível. - Sim, eu me refiro a Nyx, Deusa dos vampiros e da noite. Você usaria o caos para desafiá-la? -
Não. Eu usaria o caos para derrotá-la. E se o caos ameaçar a estrutura do mundo? Nyx não iria intervir
e desafiar suas próprias regras para salvar seus filhos? E fazendo isso a Deusa não iria rescindir a sua lei
que concede o livre-arbítrio aos humanos e trair a si mesma? O que acontecerá então ao seu divino
reinado se Nyx mudar o que ele está destinado a ser? - Eu não posso dizer, já que isso nunca aconteceu
antes - o touro bufou como se tivesse se divertindo. - Mas é uma questão surpreendentemente
interessante, e você sabe o quanto eu gosto de ser surpreendido. - Eu apenas espero poder continuar a
surpreendê-lo muitas e muitas vezes, meu mestre. - Apenas é uma palavra tão pequena... - o touro
disse. Aurox continuou ajoelhado na varanda muito tempo depois da à Sacerdotisa e o touro terem partido, deixando-o de lado e esquecido. Ele ficou onde havia sido deixado, encarando o céu.

Destinada the house of nigth Onde histórias criam vida. Descubra agora