𝙲𝚊𝚙𝚒𝚝𝚞𝚕𝚘 𝟾 ●𝑅𝑒𝒾𝓃𝒾𝑒𝓇●

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Ponto de vista - Reinier

Tudo que eu tinha era fruto de muita fé e esforço. Dava pra contar nos dedos em quem acreditou em mim, ou no meu sonho. Uma mão já fechava, minha família. E a outra se completava com os meus irmãos de vida... Não era segredo pra ninguém que eu rapidamente cresceria dentro de um time, de um clube. Tinha praticamente me criado dentro do Mengo, tinha credibilidade e apoio lá dentro. Nunca faltou nada. Só uma chance. Ela veio e me trouxe pra cá... e sinceramente, eu gostava pra caralho. De ver meus pais com o sorriso no rosto, de me sentir surreal perante os feitos, e principalmente, colocar mais fé em mim.

E todo esse sucesso e vitória, viria muitas responsabilidades e vantagens. Nem sempre as partes boas surgiriam da forma certa, como meu pai diz, viriam disfarçadas. E isso servia para as coisas ruins também. É uma merda não saber quem está do seu lado por gostar de você ou do que você é. Vivia numa constante briga interna com o meu eu do passado e o eu do futuro. Um deles só queria viver o que havia de bom, fazer as pessoas felizes e ser feliz pelo o que conquistou. O outro, bom, era difícil de entender esse cara... Queria tá no meio da ''alegria''. Nas festas como todos os outros, pegar todas mulheres lindas que estavam na volta e curtir o que havia de melhor.

Eu me sentia mal e perdido, eu me sinto mal e perdido. Não conseguia dar voz a nenhuma versão minha. Tive algumas crises de pânico depois do Mundial. A primeira crise foi no meio da euforia, os caras e eu estávamos muitos nervosos e apreensivos e me senti como se não estivesse naquela realidade, vivendo aquilo. Pedi pro auxiliar me levar pro vestiário enquanto os minutos finais rolavam. Até ai foi suave, piorou na volta pra casa... Medo, angústia e pânico me rondavam no vôo pro Brasil. Graças a Deus eu posso contar com os de verdade, Gerson ficou do meu lado o tempo inteiro e me distraiu tanto que eu até dei risada das merdas que ele dizia. Depois de alguns dias, iniciei meu tratamento com a terapeuta do clube, ia em todas as consultas, a mulher era muito boa. Conversávamos bastante, havia algumas atividades físicas e motoras pra fazer e logo comecei a me adaptar aquilo. Entretanto, a maior recomendação eu não seguia: terapia em família. Emily, a psicóloga, confirmou que os maiores resultados se desenvolvem quando o grupo familiar do paciente faz o tratamento junto e tem noção do que está acontecendo. Enrolei ela dizendo que iria contar assim que possível, mas isso era um defeito meu. Não me abrir. Meus pais estavam tão felizes com tudo que vinha acontecendo que eu não tive coragem de dialogar sobre as coisas ruins.

Disse a Emily que antes de iniciar a próxima temporada, eu iria conversar com a minha família, e dei certeza de que eles iriam me apoiar e me ajudar neste momento. A fé na minha família nunca seria em vão.

Só que eu precisava de um tempo. Será que essas crises não rolaram por conta do estresse? Ou simplesmente porquê eu não consegui lidar com as responsabilidades de um jogador profissional? Toda aquela cobrança e expectativa pode ter me sufocado sem ao menos eu perceber. Precisava de um tempo nas nuvens. Queria ficar suave com a minha irmã, e ainda tinha a Duda, que sempre estava do meu lado e me fazia bem pra caralho. Era isso cara, meu tempo, ser quem eu sou de verdade. Chamar os crias, poder beber sem pegarem no meu pé e sair um pouco da linha, eu merecia, não é?

Mas antes mesmo de eu colocar os pés no sítio, na verdade, um dia antes, tudo foi por água abaixo. Tinha começado um diálogo em casa sobre saúde mental e todo mal que aquilo estava causando nos jovens, queria sondar, preparar, pra logo partir pro ataque. Sou sagaz nisso, mas pelo visto foi uma péssima hora...

- Rei, é a sua chance! – meu pai gritou vindo do escritório, estávamos eu, minha mãe e a Be conversando na cozinha.

- O que aconteceu? – franzi o cenho o vendo posicionar o notebook na bancada bem na minha frente. Logo as duas mulheres vieram para trás de mim. Meu pai não respondeu minha pergunta e se afastou com um sorriso de orelha à orelha.

Na tela aparecia um e-mail, de um clube, já que percebi as palavras ''football club'' e ''Soccer''. Estava em espanhol mas eu conseguia compreender... li mais um pouco e senti meu estômago sumir e meus braços tremerem quando parei na frase que dizia:

                                              ''Proposta Real Madrid Club de Fútbol.''

AmadoOnde histórias criam vida. Descubra agora