Capítulo catorze

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Lojas e lojas, minutos virando horas, atendentes e mais atendentes sem a menor simpatia ou relevância se escondem atrás de vitrines luxuosas demais para podermos pagar.

Vestido de onça? Não é o meu estilo. De zebra? Não, também. De cobra? Pelo amor, eu não sou um zoológico!
E as sandálias de salto quinze finíssimo? Não mesmo, super desconfortáveis! Principalmente com suas minúsculas tiras "de sustentação" que machucam meus pés.

Por que nenhuma loja compreende o meu jeito?

- Gente, eu estou exausta! Não achamos nada para mim. Por que estão mais animados para isso do que eu?

- Não mesmo, temos uma última loja para ir. Por favor, estou sentindo que vai dar certo dessa vez.

- Vamos, animação, docinho! Já estamos aqui mesmo, não é?

- Tudo bem, tudo bem. Última chance.

Eles comemoraram e me puxaram para um estabelecimento pequeno, com uma mesa redonda de pés de madeira e tampa de vidro repleta de revistas de moda no centro, bem abaixo de um lustre para lá de luxuoso. Os detalhes em cristal pareciam uma chuva e lançavam fragmentos de luz colorida nas paredes brancas e nos inúmeros vestidos de festa que ocupavam as duas laterais inteiras.

A loja estava estranhamente vazia, então andamos pelos cabides, olhando as opções. Nenhuma me encheu os olhos, gosto de coisas discretas e, de preferência, que escondem minhas "curvas".

- Boa tarde, o que desejam? - levamos um susto enorme com o homem alto e gordo que usava um belo terno azul celeste.

- Essa coisinha linda está procurando um vestido de festa para hoje. - anunciou Luzia com a maior naturalidade.

O atendente aproximou-se de mim a passos rápidos e curto, pegou meu queixo entre o dedão e o indicador, parando seus olhos castanhos em cada detalhe do meu rosto assustado.

- Tenho a roupa perfeita, querida. Espere um momento, por favor. - ele entrou por uma portinha e voltou com uma capa preta no cabide. - O vestiário é bem ali.

- O-obrigada... - eu não sabia se tinha saído uma afirmação ou uma pergunta, mas obedeci logo.

Sendo sincera? Eu estava tão nervosa de não achar uma roupa que me sirva! Tirei o uniforme e as luvas, abri a capa e, caramba, que vestido lindo!

A parte superior era de renda bege, com mangas longas até os pulsos e uma abertura que chega na metade das costas. A saia, que começa após um cinto discreto e fino embutido, é de tule roxo e vai até meu joelho, ela também conta com alguns pontinhos prateados que dão um toque especial.
Encarei minha imagem no espelho do vestiário, eu estou realmente linda! E meus cortes estão todos escondidos.

Passei a mão pelo meu corpo, sentindo todas as texturas agradáveis do vestido, isso deve ser o olho da cara.

- É para hoje, Lisa?

- Hã? Ah, claro. - destranquei a porta e saí. Um a um, os olhares dos presentes foram se iluminando como se estivessem diante de uma das maravilhas do mundo. A vergonha começou a me tomar o rosto em forma de um rubor forte. - Eu queria algo... Mais discreto, sabe? Algo que me deixe mais... Que afine mais a minha imagem, entende?

- Querida, não entendo não. Por que você quer esconder toda essa beleza, garota? Está parecendo uma modelo, vai ser a sensação da festa! Tenho o sapato perfeito.

- É que eu... Me sinto tão feia por ser...

- Gorda? - ele abaixou seus óculos minúsculos e respirou fundo.  Eu não sabia o que esperar. - Feio não é ser gordo, feio é diminuir as pessoas para se sentir melhor. - não respondi, apenas esperei o homem pegar um tênis baixo dourado de festa e colocar em meus pés.

Saí de lá ainda calada, com a dita roupa nas mãos.
Nem tive tempo de voltar para meu apartamento, porque os gêmeos me levaram para nos arrumarmos juntos.

Tomei banho primeiro, lavei os cabelos e deixei que a água levasse as coisas ruins que me aconteceram nessa semana. Ao sair do banheiro, fui para o quarto de Luzia , já que ela insistiu que me ajudaria em tudo.

Minha amiga vasculha o próprio armário, tirando tantos produtos estéticos que quase tive certeza de que ela entraria para Nárnia. Enquanto isso, me sequei e ia pegar meu vestido quando a menina me interceptou com um frasco de hidratante.

Não sei para que tanto exagero, mas não contrariei.

Com uma trança embutida na lateral, pérolas para enfeitar e o resto de meu cabelo solto, estava pronta. Luzia passou uma maquiagem bem básica em mim, com um blush rosado e batom nude fosco.

Ela vestia um macacão longo preto, enfeitado com margaridas delicadas e de alcinhas. Além disso, uma jaqueta jeans clara fechava o look com uma sandália de salto bege. Sua maquiagem continha um belo batom vermelho e uma sombra esfumaçada marrom, o cabelo estava preso em um coque despojado com cachos caídos no rosto.

Agora o Julian... Ele vestia uma calça jeans clara rasgada nos joelhos, uma camisa social branca sobreposta de um suéter mostarda com duas listras horizontais rosa bebê na altura do peito. Um tênis branco fechava tudo e Luzia passou base e iluminador nele à força. Eu só ri dessa situação, mas no final, ele ficou se achando o artista. Julian deixou seus cachos livres, jogando-os em um black power e ficou tão lindo... Mais lindo do que o normal.

Antes de sairmos, deixei uma carta do lado de fora do portão, caso meus amigos secretos apareçam essa noite.

Os mais diversos tons de rosa e cinza infestavam o salão, engrenagens e outras peças de máquinas pendiam do teto como um convite à curiosidade, a iluminação amarelada deixava o ambiente aconchegante e instigante.
Em uma mesa no canto, há inúmeras coroas prateadas também de peças e engrenagens, com pedras furta-cor nas pontas. Imagino ser uma lembrancinha do aniversário, que está relativamente cheio. Não faço ideia de quem é o ou a aniversariante, então apenas espero alguém se aproximar de nós três.

- Luzia! Julian! Sejam bem-vindos! - uma mulher linda avança em nossa direção em todo seu glamour. Salto alto de strass prata, vestido curto e de saia bufante com um longo rabo cinza brilhante e cabelos ondulados em rosa pastel. - E você, lindinha, quem é?

- Elisabeth, prazer.

- Cecília. Você é vizinha deles, não é? Como você dorme? Eles fazem tanto barulho por serem desastrados! - sorri. Não achei que seria tão fácil fazer amizade com alguém. - Nossa, você tem um sorriso tão bonito! Devia ser modelo, o que me diz?

- Ah, eu quero fazer Relações internacionais.

- Uma coisa não impede a outra. Sou designer de interiores, mas estou dando uma flertada séria com física.

- Uau, isso é incrível!

- Todos nós somos, mas chega de conversa e é hora de mexer o esqueleto! Vamos logo! - ela enganchou seu braço no meu e foi andando para a pista de dança.

Tenho um ótimo pressentimento sobre essa noite.

Estrelas sob a janelaOnde histórias criam vida. Descubra agora