Equilibrar a Verdade

Capítulo Oito

No momento em que Theo entrou na pequena boutique, sentiu-se claustrofóbico. Depois de três semanas a ver Theo fechado em casa, mais uma vez por culpa da jornalista, a sua mãe tinha tirado o dia para ir com ele comprar roupas novas. Ela conduzira um dos carros que ele gostara mais, na altura em que podia sair de casa; um carro preto que, embora caro, era bastante discreto. Linda garantira-lhe de que aquela boutique era completamente segura, mas Theo preferira ainda assim levar todo o seu disfarce completo.

Com a sua sorte, não se surpreenderia se encontrasse Arden Kallis à saída da loja de roupa.

A mãe de Theo estava decidida a comprar roupas mais coloridas, que não chamassem muito a atenção, e tinha noção do limbo que a situação do seu filho significava. Passados cinco anos de tudo aquilo, e dois desde que Theo saíra de casa pela primeira vez, estava mais que na hora de ele tentar inserir-se na sociedade pelo nome de Peter Landon. Tinha que deixar Theo para trás sempre que fechasse a porta da frente de sua casa e tinha que deixar de fugir sempre que alguém olhasse para ele durante mais que cinco segundos. Tinha que começar a viver a sua nova vida, uma oportunidade que nem todos tinham. Afinal, não tinha feito tudo aquilo para viver o resto da vida fechado em si mesmo e na sua casa.

Os vizinhos haviam servido como o teste inicial. Theo tinha sempre cuidado para não ser visto a sair de casa e, quando via pessoas a passarem na estrada, saía sempre pela porta que levava ao quintal. Isto porque toda a gente sabia quem era o casal que vivia naquela casa e sabiam exatamente de quantos membros a sua família consistia. Theo não fazia parte da família, tanto quanto as pessoas sabiam, e Peter Landon muito menos. Com os vizinhos, aqueles que poderiam desconfiar mais facilmente, a acreditarem que Peter não vivia naquela casa, mas num dos apartamentos da parte mais traseira do bairro, tudo parecia estar a melhorar.

Arden Kallis estragara tudo, algo que Theo suspeitava que era perfeitamente comum na vida da jornalista. A forma como ela o olhara fazia-o querer gritar e admitir o seu maior segredo para o mundo, para finalmente viver livre e não ter que fugir dela ou de outra pessoa qualquer. Mas, claro, ele não podia. Seria completamente ostracizado por toda uma sociedade – um mundo, até – que não fazia ideia do que era ser ele. Ser Theo, enquanto tinha que se ser Peter Landon, porque não se podia ser Theo publicamente.

- Olá, Linda! Como posso ajudar-te? – a dona da boutique cumprimentou a mãe de Theo assim que a senhora de cabelos brancos entrou, com um sorriso grande e hospedeiro. Os seus olhos, passado três segundos, pousaram em Theo. Em Peter, melhor dizendo.

- Este é o Peter, o filho de um amigo do John. Temos um problema, Joan. É que...ele só veste preto. – a dona da loja acompanhou Linda no riso alto que ela soltou. – Estou sempre a dizer-lhe para mudar de estilo, mas só ontem, quando lhe perguntaram se estava de luto, é que ele me deu razão.

- Não te preocupes. Sei exatamente o que lhe dar para ele experimentar. – Joan sorriu para a mãe de Theo, com um sorriso que dizia perfeitamente que o seu interesse era vender. – Peter, olá, prazer em conhecer-te.

- Igualmente. – Theo respondeu, na voz que tinha criado para Peter. A sua mãe olhou para ele, quase espantada pela facilidade que ele mostrou em falar numa voz completamente diferente da sua.

A dona da loja saiu por uns momentos para as traseiras da loja, indicando que iria buscar alguns artigos para se saber o que Peter gostava mais. Quando estavam sozinhos, Linda cruzou os braços e olhou para o seu filho com uma sobrancelha levantada. Nunca tinham saído juntos à rua porque era demasiado arriscado, só o fizeram naquele dia porque Joan conhecia Linda há anos suficientes para a deixar estacionar no parque subterrâneo do prédio em que a loja estava situada. Theo sorriu, embaraçado com o facto de a sua mãe estar a presenciar toda a aura que emanava dele quando ele assumia o papel de Peter Landon, então não disse nada. Limitou-se a encolher os ombros e a sorrir, ainda um pouco envergonhado, com bochechas coradas.