Capítulo um - Perdoe a maneira como te olho.

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Seul, 1992.

07:32AM

Já tinham exatos dois minutos que o despertador gritava em meus ouvidos praticamente estourando os meus tímpanos. Tannie latia na porta do apartamento, provavelmente para o cara que joga aqueles malditos papeis com números tediosos que sairiam da minha conta bancária no começo do mês.

E bom, eu estou deitado com o travesseiro tapando meus ouvidos enquanto eu tento ter a coragem de levantar e me deparar com mais um dia rotineiro e entediante. Já sou tão acostumado com o latido do projeto de cão que eu tenho, que mal me importo com o som agudo que ele harmoniza. Ainda tem a parte que não tenho vizinhos, isso facilita pro cachorro latir o quanto quiser também.

Até cogito a hipótese de bater a minha punheta matinal costumeira, mas pensando bem, eu de fato vou tomar um esporro bem gostoso do meu fiél e melhor amigo por estar, mais uma vez, atrasado para o ensaio da banda. Como de costume, Yoongi irá me receber com um dedo do meio enquanto Jimin ri da situação, e nem um "bom dia querido Kim e melhor vocalista da Quick's" eu vou levar. Então meu prazer vai ter de esperar um pouco.

Ah, rotinas...

Quando finalmente deixo a minha covardia de lado, ando em passos lentos até a cozinha para preparar um achocolatado bem quente já que a neve caía rala do lado de fora e o frio ardia o meu nariz e minhas orelhas.

Coloquei uma roupa casual qualquer ainda beberricando o chocolate enquanto eu fingia uma certa pressa, e pensava em uma boa desculpa pra quando eu chagasse na academia e desse de cara com um Yoongi de cabelos cor de menta emburrado pelo meu atraso. Todos saberiam que eu estou mentindo, mas não é como se eu me importasse. Então apenas pensei na desculpa mais esfarrapada possível e sorri com a minha própria cara de pau.

Arrumei os fios agora vermelhos -que pintei ontem mesmo em um dos meus muitos momentos de tédio- da minha franja e coloquei meus óculos de grau com uma blusa de manga preta e calças da mesma cor, apertadas. Mesmo com todo o frio que está fazendo, eu gosto de mostrar meus braços fechados de tatuagens coloridas, admito. Então resolvo colocar as mangas da camisa até o cotovelo e dou um sorriso malefício pra mim mesmo no espelho confessando o quão gostoso eu estou. Saindo do banheiro, procuro por qualquer uma de minhas jaquetas de couro jogadas ali e ando até a minha pequena -mas organizada- sala novamente. Dou uma piscada pro meu projetinho de cão e verifico a comida dele pra que ele não morra até eu voltar, logo depois dando uma acariciada rápida, bagunçando o pelo fino dele e me virando de costas em seguida.

E até que em fim eu consigo sair de casa. Nem eu mesmo aguento meus atrasos, mas tudo bem também. Por conta deles, na maioria das vezes eu saio de casa sem comer e minha barriga ronca a maior parte dos ensaios. Desço as escadas do meu apartamento - que na verdade é uma quitinete em cima da loja de CDs que eu trabalho, e que é do meu padrasto, e consequentemente minha também, até mais do que dele, já que o mesmo prefere as bebidas do que qualquer tipo de trabalho - procuro pela chaves da minha A10 Muzees da cor azul pelos meus bolsos e pela primeira vez, estão mesmo ali.

Antes de entrar na minha querida caminhonete azul, faço um carinho bobo em sua lataria. Eu amo esse carro com todas as minhas forças, não só porque eu paguei todas as prestações com meu suor e consegui comprar ela quando eu ainda tinha 16 anos, mas porque ela é minha companheira pra todas as horas e por mais velhinha que esteja, é linda.

Me sinto lisonjeado dirigindo a bichinha, espero que ela saiba disso.

Aperto o acelerador e bato algumas vezes com força no aquecedor enquanto saio com o carro do local de estacionar, já encontrando a pista movimentada. O bendito aquecedor definitivamente não funciona mais -mas é sempre bom tentar -porém desisto quando observo o trânsito chato que o centro de Seul se encontrava aquela hora da manhã, então apenas coloco uma touca preta que estava jogada no banco do carona para me aquecer mais. Bufo ainda parado no trânsito já procurando pelo meu antigo e fiél companheiro de estresse: o Malboro vermelho.

Entre Telas e Guitarras [KTH + JJK]Onde histórias criam vida. Descubra agora