Starting Now

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O telefone toca três vezes antes de eu ter coragem de atender e quando enfim tenho a resposta do que queria saber o dia todo só quero fugir. Desabo e sem dizer nada ele sabe o resultado. Estou grávida.

De repente tudo congela, não consigo parar de chorar, não consigo respirar, o pânico domina todo o meu corpo, sinto meu coração disparar e meu corpo tremer.

Samuel fala um monte de coisas, mas nada chama a minha atenção o suficiente, nenhum vai ficar tudo bem e a gente pensa nisso depois. Penso milhares de coisas ao mesmo tempo, na gravidez, no Valério, nos meus pais, na minha bulimia...

– Lu, calma...– Ele parece nervoso e a culpa por fazê-lo se sentir assim me faz sentir ainda pior. Meu corpo treme ainda mais e tento contar como ele pediu para controlar minha respiração, mas não adianta. Nada funciona... Parece que estou vivendo esse inferno a uma eternidade, Samuel já tentou milhares de coisas e nada parece ter resultado.

– Lu, preciso da sua ajuda pra conseguir fazer isso, vamos tentar? – Dou um meio aceno, minha cabeça não está ali ainda, mas em todo o resto.

– If you don't wanna see me... Did a full 180, crazy... canta comigo, Lu, não sei a letra toda. – Samuel canta 'Don't Start Now' da Dua Lipa completamente fora do ritmo e me pega de surpresa chamando minha atenção por um segundo.

– Thinking... 'bout the way... I was...– Canto pausadamente, é difícil sobrepor os pensamentos para lembrar a letra dessa música.

– Did the heartbreak change me?... Maybe...– Samuel continuou e eu dou um minissorriso para ele, está funcionando.

– But look... at where... I ended up. – Minha respiração segue ofegante, porém um pouco mais devagar.

– I'm all good already... So moved on, it's scary...

Continuamos cantando até o fim da música e a cada verso mais focada nisso fico e aos poucos a sensação de pânico vai passando e começo a permitir que meus músculos relaxem um pouco.

– Obrigada, Samu, de verdade... Não sei o que teria feito se estivesse sozinha. – Disse quando enfim já me sentia um pouco melhor.

– Não foi nada, como está se sentindo?

– Ainda em pânico, mas um pouco mais controlado agora...

– Seja o que for vai ficar tudo bem, Lu. No final tudo se ajeita. – E eu sei que o comentário dele é na melhor das intenções, mas é a última coisa que preciso ouvir agora. Não sinto como se fosse ficar tudo bem.

– Não vai, Samu, e mesmo se forem vai tudo ser diferente daqui em diante. E eu não queria que nada mudasse ao mesmo tempo que queria que tudo mudasse, não queria que fosse desse jeito... O que diabos eu faço agora, Samu? – Um par de lágrimas solitárias cai do meu rosto. Pensei que já tinha chorado todo o meu estoque, mas uma vez estava enganada.

– Não sei, Lu. Mas você sabe, só você pode decidir, mas não precisa ser agora. A Lu de amanhã pode pensar nisso. – Novamente não é a frase certa, nem ele vai acertar sempre em como me consolar. Acho que ninguém na verdade, algumas coisas simplesmente não têm como ser consoladas.

– Não sei se a Lu de amanhã quer pensar nisso... Pode me levar pra casa? Acho que preciso ficar um pouco sozinha.

– Claro. – Fomos andando, nenhum de nós tinha dinheiro para pagar um táxi e Samuel estava sem a sua bicicleta. O trajeto é quase todo em silêncio, Samuel tenta puxar algum assunto umas duas vezes, mas meus monossílabos demonstram bem que só quero fica um pouco sozinha com meus pensamentos e o moreno desiste de tentar.

Assim que chegamos Samuel me abraça e me dá um beijo na bochecha antes de ir. Entro em casa ainda desnorteada, e me surpreendo ao ver meu pai sentado no sofá encarando a porta como se estivesse me esperando. Algo está errado, ele parece muito muito irritado e eu não faço ideia porque.

– Isso são horas? – Ele pergunta e dá para perceber ainda mais a raiva na sua voz. O que foi que eu fiz? Me lembro do aviso do Valério, será que ele falou algo com nosso pai?

– Desculpa, eu perdi a hora estudando na biblioteca.

– Você não se cansa de mentir? Eu sei que você não estava lá, liguei para o colégio... Com quem você estava? – A cada palavra a raiva dele parece aumentar e eu começo a sentir medo. Nem quando ele descobriu sobre o meu lance com o Valério ele parecia tão descontrolado e raivoso.

– Estava com o bolsista que anda trazendo aqui pra casa, né? Ou já é outro? – Meu pai está em pé e relativamente perto de mim, mas não consigo responde-lo na velocidade que gostaria ainda estou muito atordoada.

– Não sei do que você tá falando... Samuel é meu amigo.

– Seu irmão já contou tudo, não adianta mentir...

– Valério disse o que? – Pergunto confusa. O que diabos Valério disse de mim?

– Sei que ele passou a noite aqui ontem e não sei quantas mais, quando você sabe muito bem que não quero ninguém aqui em casa, principalmente um bolsista. Aqui não é lugar pra isso.

– Ele só estava me fazendo companhia, não queria ficar sozinha... Nós não transamos ou qualquer merda que você estiver pensando.

– Você acha que eu sou idiota? ­­ Que vou acreditar nisso? Não quero mais esse moleque aqui. Está me ouvindo? – Disse irritado e bem próximo de mim, tão perto que se quisesse me dar um tapa ele poderia facilmente.

– Está me ouvindo Lucrecia? – Consigo sentir sua respiração em cima da minha e respondi baixo. Nunca senti tanto medo dele na minha vida toda, algumas lembranças vêm na minha cabeça, mas as afasto.

– Sim... – Acenei com a cabeça.

– Espero que você aprenda a escolher seus namorados melhor de agora em diante.

– Samuel não é meu namorado, mas se fosse não seria um erro...

– Escuta uma coisa, garota, eu já to de saco cheio disso tudo. – Disse apertando meu braço com força me pegando de surpresa. – Minha vontade era mandar você e seu irmão para fora, eu só não faço isso, porque chamaria muita atenção e bem porque sua mãe não quer. – Meu braço dói muito, ele está segurando com muita força, mas não reclamo não quero dar esse prazer a ele.

– Então, você para de graça e me obedeça, já to por aqui com tudo isso... Agora vai para o seu quarto e fica lá o máximo que eu puder, não me responsabilizo se tiver que olhar pra você mais uma vez hoje!– Saio dali calmamente, porém quando finalmente chego no outro andar desabo a chorar mais uma vez meus dias nessa casa estão contados.

Chegando no meu quarto penso em entrar, mas desisto assim que coloco a mão na maçaneta. Dou meia volta e sem hesitar entro no quarto do Valério. Fecho a porta dele e fico alguns segundos sem dizer nada, esperando que ele me note ali.

– Desculpa, Lu, eu não devia ter contado ao papai... Eu tava irritado e com ciúmes...– Ignoro completamente o que ele disse, a fofoca dele é o menor dos meus problemas.

– Nós precisamos conversar. – Falo grosseiramente estou extremamente irritada com ele, mas não é hora para resolver isso.

– Ele te machucou? – Val fala se aproximando enquanto olha meu braço ainda vermelho do aperto.

– Sim, mas não importa.

– Claro que importa. Eu vou...– Diz ele ameaçando sair do quarto.

– Você não vai fazer nada, Val. – Chamá-lo assim soa estranho, mas ao mesmo tempo certo. Não quero mais estar brigada com ele, não gosto de mim quando estou. – Precisamos conversar, mas não é sobre isso.

– Sobre o que então?

– Estou grávida, Val... e é seu. 

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