4. O GRANDE DIA

13 1 0
                                    

Quando voltamos para a caminhonete, Sally grita tão alto que algumas pessoas do lado de fora da Imporium param para observar o que está acontecendo. Não imaginava o quão histérica ela poderia ficar por não ser aprovada na Classificatória.

- Eu não acredito. – ela diz. – Se eles estão reunindo Híbridos, acho que deveriam reunir todos os Híbridos.

Depois que passamos pela barreira que leva ao nosso Eixo, tento não olhar para trás. A beleza do 1º Eixo dá lugar à monotonia de minha rua, que mesmo com sua fama de direitos e deveres, traz uma sensação bastante familiar para acalmar meus instintos.

- Nós avisamos, Sally. – eu digo. – Além do mais, não vejo o porquê de ficar assim. Você pode entrar na Segunda Chamada na metade do processo.

- É, mas já imaginou o olhar de julgamento das pessoas? – diz Sally. – Nem pensar!

- Tudo bem, querida. – meu pai interrompe. – São só três meses de diferença. Sei que você vai ficar melhor e eles até podem te dar uma segunda chance se você explicar a situação.

- E entrar quando todos já estiverem bem na minha frente? Avançados? – ela grita. – Não, muito obrigada. Quer saber, eu nem queria mesmo.

Caímos na gargalhada quando entramos em casa. Depois de tomar banho e jantar, volto para o meu quarto e deito, afundando minha cabeça no travesseiro. Pressiono dois dedos nas têmporas e massageio suavemente, a fim de tentar deixar a mente vazia. Foi um dia exaustivo e preciso descansar. Reviro-me várias vezes e, quando cochilo, sou interrompida por uma batida na porta.

- Posso entrar? – meu pai entreabre a porta.

- Você já está dentro. – eu digo, sorrindo.

Meu pai fecha a porta com o maior cuidado possível, como se pudesse acordar mais alguém no quarto. Ele senta ao meu lado, de frente para meu rosto. Basta um único olhar para que ele entenda o que está se passando dentro de mim. Ele afasta uma mecha do meu cabelo para trás da orelha e quando deixo a cabeça descansar no toque de sua mão, percebo que ele trouxe um copo de leite.

- Você está me tratando como se eu fosse uma garotinha. – eu digo.

Meu pai ri e umedece os lábios. Levo o copo à boca e deixo o calor do líquido esquentar meu corpo, descendo através de minha garganta, esôfago, até chegar ao estômago. Consigo notar o sabor do mel que ele sempre usa para adocicar a bebida.

- Você é e sempre será a minha garotinha. – ele fala, baixando os olhos distraidamente.

- Como a Sally está?

- Ela já se conformou em tentar se inscrever novamente, em meio às "criancinhas", como ela diz. – ele adiciona. – Sabe, Tessa, amanhã será um dia longo.

- E põe longo nisso!

- Olha, quero que saiba que você é muito importante para mim e não é nenhum Eixo que vai definir isso. Estou orgulhoso de você e pelo resultado de sua avaliação.

- Está? – franzo o cenho.

- Estou. – ele diz. – Você precisa descansar agora. Já chega por hoje.

Ele levanta e apaga a luz do abajur em forma de roda gigante que ganhei em um concurso de soletrar na quarta série. Meu pai me deixa sozinha com meus pensamentos, que começam a pesar sobre meus cílios, fazendo-me esquecer por um breve – realmente breve – instante de que amanhã é o grande dia, e eu estou minúscula esperando que ele chegue.

***

Acordo com o despertador alarmando ao lado de minha mesa de cabeceira. Segundo algumas informações contidas na pasta, não precisamos levar roupas nem acessórios. Durante o banho, deixo a água fria escorrer pelo meu corpo e levar todas as impurezas que puder. Queria que ela fosse capaz de levar embora o nervosismo.

IndomávelOnde histórias criam vida. Descubra agora