19 - Não há nada de ruim que não possa piorar.

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Assim que perdi o cão de vista, percebi que um carro vinha se aproximando, resolvi, sabe-se lá o porquê, sair da estradinha e me esconder. Os nervos não estavam no lugar, e eu conhecia o barulho do caronte, não eram os meninos. Bastou eu abaixar atrás de uma moita e o furgão preto passou como um foguete. Estava voltando do castelo. Fudeu, pensei. Os caras do furgão sabem que a gente está ficando no Vladimir, dependendo da merda que o King fez, estamos ferrados.

Avistei o castelo de Dom Vladimir. Fui me aproximando escondido. A nossa opala caravan não estava estacionada. Só faltava essa! Será que desencontramos? O ambiente estava em silêncio. Era preciso saber o que as pessoas do furgão queriam e onde estavam meus amigos. Fiquei atrás de uma das esculturas de diabos, observando por um tempo. O criado Aragão passou apressado com aquele cavanhaque estranho de psicopata. Logo ele voltou correndo e entrou no castelo com um molho de chaves nas mãos. A Helga o esperava na porta com as feições nervosas, demonstrando que algo não estava bem. Falava coisas para o empregado nanico, mas eu não ouvia. Aparentemente o anão gigante fizera alguma besteira, pois ela estava muito nervosa. De repente, ouvi um grito infernal vindo de dentro da casa. Era o Vladimir, com certeza! Aragão foi até a casa de ferramentas, uma pequena construção atrás do castelo e voltou com dois enormes cães. Eram dobermans e pareciam bravos. Logo o criado soltou os animais, que saíram farejando pela mata, enquanto ele os seguia com uma barra de ferro na mão. O dia já vinha bem claro. Eu, que até então estava morto de sono, agora, tomado pela adrenalina, permanecia em alerta total. Já tinha a certeza que tínhamos entrado em confusão. Mas não entendia até então o porquê.

Os cães logo me encontrarão, pensei. Melhor sair daqui.

Estava me preparando para deixar o esconderijo, quando ouvi novamente um barulho de carro se aproximando. Dessa vez era um jipe do exército. Parecia ser o mesmo veículo que cruzou por nós quando chegamos. Mas não era um carro oficial, apenas pintado com as cores camufladas. Um rapaz de bigode farto e suíças estacionava enquanto aquele mesmo senhor de olhar duro no banco traseiro esperava para poder descer. Vladimir foi recebê-lo no carro. Agora parecia sorrir e tentava transmitir calma, apesar dos gritos que emitira momentos antes. Trocaram um cumprimento estranho, uma espécie de continência, porém diferente das que eu via na TV. O dono da casa parecia mais simpático do que o usual, mas demonstrava nervosismo. Chamou o senhor para caminharem pelo jardim da casa. O velho estava impaciente. Vieram circundando o gramado e pararam muito próximos ao meu esconderijo. Eu não tinha escapatória, o jeito era segurar a respiração e não emitir nenhum som.

- Você disse que tem meus dois meninos. Falou o velho. Mal cheguei à Pouso Azul e já voltei animado.

- É, tivemos sorte de encontrar o perfil que o senhor estava procurando.

O velho esfregava as mãos impacientemente. Seus olhos brilhavam.

- E eles são fortes, como pedi?

- Ora, sim. Respondeu Vladimir. Dois rapazes bem grandes.

- Melhor assim, melhor assim. O senhor falava enquanto continuava a esfregar as mãos velhas. E podemos vê-los?

- Claro, sim, sim. O senhor sempre foi um dos mais antigos companheiros de nossa irmandade. Continuou Vladimir. Terá sempre o melhor tratamento. A melhor sala de preparo, as melhores ferramentas. O senhor merece, coronel.

- Você sabe que eu gosto de meninos fortes, não é? Quanto mais forte, maior o prazer de trabalhar sua coragem. Eles aguentam bastante.

Deve ser um daqueles pederastas enrustidos, pensei. Será que o Vlad é um cafetão de velhos bichas?

- É sobre isso que preciso falar com o senhor. Consegui dois touros para o coronel. Mas um deles conseguiu fugir, enquanto estávamos fazendo o seu transporte. Já estamos com os cães na mata e logo minha equipe está chegando. Ligaram de Bela Vista dos Pinhais. Sei que informei o senhor antes dos meninos estarem efetivamente presos no meu calabouço, mas te garanto, se puder entrar e descansar, que terá sua dupla pronta para o trabalho até o meio dia.

Funerária do RockOnde histórias criam vida. Descubra agora