Capítulo 02.

2K 394 165
                                    

Minha mãe estacionou o carro em frente ao internato. Dei uma olhada pela janela.

Havia uma construção simples de dois andares como primeiro plano, as escadas levavam a portas duplas de vidro. A estrutura era antiga, mas as janelas e portas, assim como a pintura e o prédio de cinco andares que se erguia para trás, eram modernos.

Resmunguei mentalmente. Era tudo o que eu queria: uma escola nova com pessoas novas e estranhas para chamar de família, que droga!

- Você quer que eu entre com você? - Minha mãe perguntou.

- Não. - Respondi instantaneamente. Tudo o que eu não precisava era uma mãe me ajudando a entrar na escola nova no terceiro ano do Ensino Médio. - Sei me virar sozinho.

Olhei para os papéis que minha mãe havia dado em minha mão. Ali estava tudo que eu precisava. O número da minha sala de aula, o número do meu armário, o número do meu quarto... Eu não precisava da minha mãe para isso. Na verdade, no momento eu não estava precisando da minha mãe para nada.

- Espero que você se divirta. - Ela disse.

- Sem chances. - Disse, sem nem olhar para ela.

- Você sabe que eu te amo, não é?

Segurei a mala preta aos meus pés pela alça e abri a porta do carro.

- É, eu sei. - Botei um pé para fora.

- Não vai dizer que me ama de volta?

- Você sabe muito bem que não. - Puxei a mala para cima com um grande esforço para tirá-la do carro. Não sabia como tinha conseguido enfiar aquele monstro naquele pequeno espaço entre o banco e o painel.

- Vai embora sem nem me dar um beijo e um abraço?

- Exatamente. - Eu disse, ainda sem olhar para ela. - E declare-se culpada por isso.

- Culpada? - Ela perguntou com um ar de inocência.

Olhei para ela pela primeira vez e arqueei uma sobrancelha.

- Você me jogou em um internato sem a minha permissão.

- Eu sou sua mãe. - Ela retrucou. -  Não preciso da sua permissão para nada, eu que mando em você.

- Que beleza! - Disse ironicamente. -  Deus me concede o livre arbítrio e você, uma mera mortal, o tira de mim.

- Falando em Deus... - Ela disse, evitando a discussão, e se curvou até abrir o porta-luvas à minha frente. - Eu vi que você deixou isso em cima da minha cama como um ato de rebeldia.

Peguei a correntinha que ela havia me dado alguns anos atrás. Era de ouro e tinha um crucifixo, também de ouro, pendurado nela. Havia deixado em cima da cama dela para mostrar o quão  descontente estava com a sua decisão de me jogar em um internato.

- Não foi um ato de rebeldia, foi um ato de indignação para mostrar o quão estou indignado com você por tudo isso. - Fiz menção de que ia sair do carro.

- Se eu sofrer um acidente de carro quando estiver voltando para casa e morrer... - Ela disse. - você vai ficar com peso na consciência por só ter me culpado nos meus últimos minutos de vida.

Olhei para ela, perplexo. Como ela podia falar isso? Ela não tinha coração? Não se brinca com esse tipo de coisa.

Abri a boca para falar algo, mas voltei a fechá-la. Depois encarei ela de cara feia.

- Isso é jogo baixo. - Disse.

- Mas é a verdade. - Ela rebateu.

Suspirei e saí do carro, batendo a porta com força. Me curvei sobre a janela, com os braços apoiados na porta, e a encarei de cara feia.

Chamas da Ilusão -L.sOnde histórias criam vida. Descubra agora