Depois da quimioterapia de hoje, e a 14ª que assisto e me faz destruir por completo, implorei para poder sair deste lugar com Rose - por pouco tempo - e todos acenaram afirmativamente. Como é curioso ela estar tão a morrer que nem os médicos saturam-na com negações. E por isso estávamos ambos de braço dado a passear pelo jardim enorme e de relva verde e seca por de trás do hospital.
Rose estava a sorrir, a observar os poucos pássaros que sobreviviam neste frio entre os galhos das árvores com pequenas flores e folhas mínimas.
A sua cabeça estava tapada por um meu gorro cinzento, nos seus ombros, por cima de um roupão, usa um casaco apertado e comprido ( até os joelhos ), um cachecol de lã laranja, talvez demasiado laranja para eu o considerar bonito. Mas as suas pernas continuam à mostra, enquanto ela calçava umas sabrinas.
Não havia mais beleza naquele jardim se não Rose, considerada doente cancerígena há seis semanas e meia, a rosa mais bela das rosas de todas, que em pequenos canteiros lutam para não congelar, peguei numa das flores com cuidado para não aleijar-me. A meio do caminho para o meio do caminho do banco de madeira pintado de verde, peço à Rose para levar a sua bomba de oxigênio, puxando-o atrás de nós ouvindo as rodas a girarem por falta de óleo.
Perto do banco apercebo-me que ela fica frustada ao respirar pondo-me num certo modo inquieto para chegar ao banco. Sentamo-nos no banco e tiro da lancheira duas sandes de atum, Ainda não tive tempo suficiente contigo para saber se gostas mais de atum ou de frango , penso a dar-lhe a sande.
- São de atum... - informo-a antes de ela abrir a embalagem.
- Maravilhoso - diz ela a dar uma trinca no pão.
Abro a minha e trinco-a, faço uma careta e sinto o sabor do atum com o ovo e a maionese, faço-a porque eu sinto o porquê de insultarem a comida dos hospitais, ser demasiado saudável. Eu penso que todos os humanos adoram o sabor a alimentos que nos fazem mal.
Pego nos dois pacotes de sumo de maçã e entrego-lhe um deles.
- Vamos brindar - ela diz, de novo maravilhando-me com o seu sorriso mas admirando-me com as palavras.
Enfio a palhinha no pacote de cartão - Hum... A quê? - acabo por perguntar cheio de medo de o fazer.
- Bem, ao nosso segundo encontro num ambiente cheio de plantas e uma vista gloriosa para o céu. - ela responde num tom de otimismo, antes de uma gargalhada curta e suave.
Sorri.
- Ao nosso segundo encontro num ambiente cheio de plantas e uma vista gloriosa para o céu! - os nossos sumos chocam um com o outro sobre as minhas palavras.
Bebo dois golos ao terminar o brinde e sinto a falta de açúcar nele.
Eu não tenho história com Rose, apenas algo que alguém perceberá sem sermos nós.
O primeiro beijo dela, o nosso primeiro beijo. Gosto de saber que guardou o seu primeiro beijo, se não o fizesse já não seria o primeiro, nunca mais voltaria a ser o seu primeiro. Pela sua ex-profissão sei que ela não é virgem e mesmo com ela guardou uma das primeiras vezes.
Pouco guardei para Rose, não sou virgem, o meu primeiro beijo não foi aquele ao som da batida da música da discoteca, não foi a primeira a ter o meu coração e não será a primeira a parti-lo.
Rose levanta-se, de mão dada á minha e com a outra a arrastar a bomba, fazendo com que o nosso lanche caia sobre o cimento do passeio, deita-se na relva uns cinco passos longe do banco e eu deito-me ao lado dela, mas com os pés no sentido oposto aos seus e com uma visão perfeita aos lábios finos dela.
- Luke? - vejo eles movimentarem-se com o meu nome.
Pisco os olhos e lambo o lábio inferior sentindo a argola que rodeia-o e respondo:- Rose?
- Eu não aguento mais... - ela encheu os pulmões, como toda a gente faz para consular o vazio que parece nos ocupar quando as lágrimas reais e sentidas querem fugir.
Eu não aguento isso, tentei dizer mas passou de um pensamento imediato.
- Um "mais" curto? Ou um "mais" comprido? - pergunto suavemente brincando com a relva nas minhas mão esquerda, a do lado do seu.
- Um "mais" curto... Talvez demasiado pequeno, Luke - suspira, e ouço a falha dos seus pulmões.
- Demasiado curto para um beijo? - pergunto agora a ver os seus olhos a verem os meus lábios.
- Desejo que não - como esta palavra deixa-me feliz.
Chego-me um pouco para cima a tornar o momento um pouco piroso para os leitores percebendo que o meu cálculo para beijá-la terá dado errado. Aproximo os meus lábios dos seus - Ao último beijo.
Ela sorri. - Ao último beijo.
Sinto os seus lábios a tocarem nos meus, sinto eles a aquecerem, a movimentarem-se encaixando-os nos meus, o meu sorriso e depois o dela, a junção dos nossos lábios de novo.
- Amo-te - sussurro e volto a beijá-la. Acho que a amo... Na realidade acho que ninguém sabe se ama alguém ou não, ninguém nos explica isto. Sei apenas que amo.
E sinto o inspirar mais pesado dela, os lábios fracos e utiliza o último expiro:
- Amo-te, Luke Hemmings.
Apenas mais um movimento dos seus lábios e mais nenhum acompanha o meu. Já não ouço a sua respiração. Fecho os olhos como ela têm os seus e expiro, aperto a rosa e corto-me nos espinhos.