A chácara

58 11 1
                                    

Moro no interior, em uma pequena chácara que herdei de meu avô. Vivemos apenas eu, meu marido e meu filho Lucas, de seis anos.

Ainda há, em todo canto dessa casa, fotos antigas dos meus parentes há tempos falecidos. Estão todos pintados em quadros estranhos, como era comum na época. Nem parecem pessoas de verdade.

Gosto do chão de madeira e dos móveis de mogno, ainda que deixem a cada tão escura, mesmo durante o dia. Não me importo, no entanto. Mantenho as luzes apagadas, pois isso me ajuda a dormir.

Como qualquer criança travessa, meu filho adora passear pelas redondezas, subir em árvores, comer fruta do pé, nadar na cachoeira e sair para cavalgar com o pai. Eles gostam do interior, ao contrário de mim. Tenho passado a maior parte do meu tempo na cama, assistindo algum filme na televisão ou simplesmente adormecendo sob a escuridão da chácara antiga.

Todos os dias, desde que nos mudamos, meu marido acorda bem cedo para fazer o café e sai para dar uma volta com Lucas. Meu filho é o seu companheirinho de aventuras. Ele diz que não gosta dessa casa, que sempre acha que alguém o está chamando enquanto dorme. Isso o assusta, mas meu marido e eu combinamos de não deixá-lo se acostumar a dormir na nossa cama.

Todas as manhãs, antes de sair de casa, meu menino entra em meu quarto e me dá um beijo na bochecha. Como faz isso assim que acaba de escovar os dentes, seu beijinho é sempre gelado e ele ri quando eu me arrepio.

— Tchau, mamãe. — Ele diz.

— Tchau, amor. — Respondo de olhos fechados.

Hoje de manhã, após o beijo, ouço os passinhos de Lucas pelo assoalho, correndo em direção ao quintal. Por alguma razão, perco o sono, então me levanto e olho pela janela. Vejo meu filho correndo pelo terreiro, mas não vejo meu marido. É quando ouço o barulho do chuveiro e entendo que meu marido ainda nem terminou de tomar banho.

Penso que Lucas deve ter apenas saído para brincar. Levo a mão ao rosto e sorrio, ainda com a lembrança de seu beijinho amoroso.

Saio do quarto, rumo à cozinha. No entanto, quando passo em frente ao quarto do meu menino, congelo imediatamente. Ele está deitado, dormindo feito um anjo. Vou até ele e toco em seu braço. Tento acordá-lo, mas não consigo. Não quero acreditar, mas meu filho parece morto. Ele está morto.

Histórias estranhasOnde histórias criam vida. Descubra agora