Capítulo 2

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CAPITULO 02

Após a conversa que tive mais cedo com Brian Fontana na sala de reuniões da editora 100 palavras, voltei para o escritório onde estava o resto da minha equipe. Era um grande salão, ocupado por quatro mesas de carvalho em formato retangular. Cada mesa era uma estação de trabalho equivalente a cada membro da equipe. Eram quatro mesas, mas éramos apenas três. A Outra mesa era para a impressora e para a bagunça de papeis que não conseguíamos manter nas nossas estações.

Em cada estação havia um computador, sempre ligado e esperando alguém usá-lo, além de muitos papeis e livros espalhados fazendo com que apenas a pessoa que utiliza o espaço pudesse se encontrar no meio daquela confusão de palavras soltas. Minha estação fica no lado superior esquerdo da sala, ao lado do espaço de Tom, que fica no lado inferior esquerdo. No lado oposto ao meu fica a estação de Samantha e, ao lado dela, a mesa quatro que apelidamos carinhosamente de buraco negro, pois tudo se perdia ali.

Brian tem sua própria sala. Por mais que ele gostasse de trabalhar em equipe, sua sala permitia que ele desfrutasse de momentos a sós com seus pensamentos e com musicas calmas. Nos não tínhamos o mesmo privilégio. Trabalhamos juntos diariamente e tínhamos que suportar os diferentes padrões de personalidade existentes na equipe.

- O Que o Brian queria? – perguntou Samantha logo que eu me sentei à mesa.

- Queria jogar meu celular pela janela – disse eu, com meu melhor sorriso de canto de boca e minha melhor cara de “isso é normal, acontece sempre”.

- Não vai mudar nada, não é Julia? Quase nunca vi você usando o celular. Assim, no modo convencional: para fazer e receber ligações. – Tom falou sarcasticamente ao meu lado. - Se você comprar um despertador, ele vai suprir tudo que você usava no seu celular.

- Não iria mudar nada se ele tivesse jogado meu telefone fixo pela janela, eu nem iria me incomodar. Eu ainda teria dado tchauzinho pra ele lá do alto. Porém Tom, não conta pra ninguém, mas hoje em dia um celular serve para mais coisas que fazer e receber ligações. A Atualidade mandou um beijo e um tweet pra você, vê se chegou. – essa foi minha retórica para Tom, seguida de uma bolinha de papel que eu amassei e, certeiramente, joguei bem em sua cara.

A Relação entre nós, membros da equipe, era sempre assim. Ao longo do tempo fomos adquirindo certa intimidade que nos fazia parecer até membros de uma família. Samantha Brent está aqui desde que comecei. Aliás, já estava aqui antes de eu começar. Aos 26, ela era é uma das mais populares e requisitadas editoras dentro na empresa. Completamente oposta a mim, é uma mulher capaz de seduzir qualquer pessoa só com uma simples conversa de 2 minutos no intervalo do café. Divertida e encantadora, todos na editora gostavam de tê-la por perto, mas o privilégio era nosso. Era meu, pois ela tornou-se uma grande amiga.

Já o Thomas entrou na editora na metade do ano passado. Veio transferido da sede de Eyed Soul para a filial aqui em San Side. Um jovem de 25 anos, com belos olhos azuis e muito talento. Tom se interessa por poesias e poemas, principalmente. É um grande entendedor de autores e histórias, gosta de citar passagens e curiosidades de obras famosas no meio de conversas, o que me fez considera-lo bastante esnobe aos meus olhos. Além do que, tenho certeza que ele tem em sua agenda momentos reservados exclusivamente para me tirar do sério. A Conversa que estávamos tendo era um desses momentos:

- Você está muito crescidinha para iniciar uma guerra de bolinha de papel, não acha Julia? Na próxima bolinha eu vou aí e jogo sua resma de papel pela janela só para não ficar fora da nova tendência da editora. – disse Tom, divertido. Detive-me apenas em responder com um riso sarcástico.

- Mas por que ele jogou seu celular pela janela, Julia? – Sam trouxe-nos de volta para o que realmente interessava.

- Brian sugeriu que eu escrevesse um novo livro e disse que as tecnologias e a comodidade a qual estou acostumada estão atrapalhando a minha mente e, consequentemente, a minha criatividade. Chegamos à conclusão... bem, ele chegou a conclusão por mim que eu precisava mudar minhas rotinas em busca de inspiração para uma nova obra. Temo que ele esteja coberto de razão. Isso pode justificar esse ato gratuito de grosseria.

- Julia, por mais irritante que o Brian possa parecer, ele está certo. – Sam concordou. - Nos anos que trabalho aqui, conheci algumas pessoas da editora que tiveram essa mudança de vida sugerida por ele e se deram bem. Uns lançaram grandes sucessos no mercado e outros descobriram até uma nova vocação, uma nova vida, uma nova personalidade a partir disso. Tenho um grande conhecimento de causa a respeito disso porque fui uma dessas pessoas.

Sam disse isso e me deu seu melhor sorriso. Levantou de sua cadeira e, enquanto se dirigia à máquina de Xerox no fundo da sala, eu a acompanhei, incrédula:

- Não acredito que você nunca mencionou isso para mim!

- Nunca falei porque, desde que conheci você, eu sabia que mais cedo ou mais tarde Brian iria te sugerir a mesma coisa. A Surpresa sempre vale a pena, não é? – disse piscando.

- É, às vezes. Mas esse não foi o caso. Gostaria de estar preparada. Agora estou pirando por dentro.

- Não fique com medo. O Futuro só é assustador na nossa cabeça e nos conselhos dos nossos pais.

Esbocei um sorriso tímido e retornei para minha cadeira. Fiquei alguns minutos encarando a área de trabalho do meu computador. O Papel de parede era uma foto da Rússia, precisamente da praça vermelha de Moscou. Sempre fui aficionada pelo país e tomada por um sonho de, quem sabe, morar lá algum dia. As imagens das paisagens russas sempre faziam crescer em mim um sentimento de liberdade utópica. O Quão seria bom estar lá nesse momento fazendo um anjo de neve no chão da praça como uma criança ao invés de estar aqui no meio dessa confusão na qual entrei quase que sem querer.  Tom me tirou do meu devaneio:

- Já sabe por onde começar a sua mudança de vida, a jornada inesperada?

Essas palavras me fizeram rir um pouco. Jornada inesperada. Realmente estava me sentindo como o pequeno hobbit, tirado da companhia de suas saborosas refeições e do conforto do seu lar para viver, quase que a força, aventuras na terra média. A Diferença que não foram 13 anões que me tiraram da rotina e sim o dragão. Brian e sua desolação.

- Sei. A Primeira mudança vai começar pela minha casa. Não sei ainda para onde eu vou, mas vou procurar minha independência antes de encontrar a minha história.

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