CAPÍTULO 20
Aquela semana passara tão rápida quanto uma piscadela de olho, involuntária e imperceptível. Todos estavam focados na inauguração da primeira Megastore da nossa editora, que viria em boa hora para divulgar nosso trabalho e alavancar as vendas.
Para onde se olhava, era possível ver pessoas correndo de um lado para o outro com papéis nas mãos, telefones aos ouvidos ou simplesmente gritando ordens e palavras de incentivo, inspirando-nos a fazer um bom trabalho naquela decisiva semana.
Brian não parou sentado um minuto sequer naqueles últimos dias. Passou a semana indo à megastore e voltando a editora, intercalando com reuniões e auxílio à alta cúpula, tratando dos últimos detalhes da inauguração. Vez ou outra levava Sam e, às vezes, Tom consigo para acompanhar os preparativos no local da nova loja e eu reclamava por ele não me chamar uma vez sequer.
- Brian quer que eu viva, que eu saia, conheça lugares novos mas me deixa trancafiada na editora enquanto todos vão conhecer a megastore.
Ele ria e limitava-se a dizer que me deixava porque confiava em mim para manter a nossa parte da editora de pé em sua ausência, ou porque queria me fazer surpresa, ou também porque queria que eu ficasse com o trabalho mais fácil porque eu era a mais nova. Enfim, as desculpas variaram e o fato é que não conheci a loja até o dia de sua inauguração.
Naquela semana eu ainda me permitia olhar para Tom com desconfiança. E Tom me olhava de volta, sabendo que eu estava desconfiada, e ria ou fazia alguma brincadeira para me tirar do sério. Na primeira vez em que ele foi chamado para acompanhar Brian eu disse:
- Tá vendo, Sam? Até o Tom, a pessoa mais pouco confiável e sem credibilidade desta empresa o Brian convida para acompanha-lo e eu fico.
- Eu, pouco confiável? – Tom levou a mão direita ao peito e fez uma cara de quem havia sido ferido por um tiro pelas costas. – Que absurdo! Nunca mais repito isso! – Disse tentando se fazer de sério.
- Repito quantas vezes eu julgar necessário! – Retruquei de volta.
Ele fez uma cara de espanto, abrindo a boca e arregalando os olhos em breve silêncio. Se aproveitando da ausência de Brian na sala, falou: – Você não sabe do que eu sou capaz, Hale. Você não sabe o que eu faria com essa sua boquinha linda se eu escutasse você repetir isso novamente...
- Ah é? Ia fazer o quê? – Desafiei.
Olhou para os lados, se aproximou de mim e falou baixinho: - Ia cala-la com um beijo aqui mesmo! Não me tente, mulher! Adoro te ver com ciúmes de mim.
- Ah, você quer me beijar aqui? Espera que eu vou resolver esse seu problema já! – Disse aproximando meu rosto ao dele. Mas ao invés de beija-lo, peguei seu celular que estava em seu bolso direito da calça e trouxe até mim. Coloquei na função “câmera”, fiz um bico com os lábios e tirei uma foto do meu rosto inteiro. Devolvi o celular e disse: - Está aí, pode me beijar aqui à vontade. Aliás, se não me contar o que aconteceu domingo passado, vai ser só por ai mesmo que você irá me beijar daqui pra frente.
Voltei a sentar em minha cadeira enquanto Sam ria de um lado e Tom do outro. Nesse momento, Brian apareceu na porta da nossa sala chamando Tom, que saiu fazendo cara de cafajeste e balbuciando em silêncio na minha direção:
“Adoro mulher brava.” Piscou para mim e saiu, seguindo Brian que já estava muito a frente.
- Não entendi o que acabou de acontecer aqui. – Sam falou. – O Que foi isso: uma briga, uma brincadeira?
- Foi uma briga em tom de brincadeira. Você já teve a sensação que seu namorado estava te escondendo alguma coisa?
- Já. Algumas desconfianças foram superadas e outras, infelizmente perduram. Digo infelizmente porque uma relação tem que ter uma base sólida em confiança, senão não funciona. Ou melhor, funciona, mas na base do medo. Medo de estar sendo enganada e sendo feita de idiota. Mas é legal ver o modo como vocês travam suas brigas, assim se divertindo. Esse clima de amizade vocês não podem perder nunca. – Sorriu meio de lado e baixou a cabeça enquanto passava a mão pelo teclado do computar sem pressionar nenhuma tecla. Seus pensamentos pareciam tê-la levado para longe dali, mas eu resolvi trazê-la de volta.
- Tudo bem com você, Sam? Você está me parecendo um tanto cabisbaixa hoje... Problemas no paraíso?
- Pfffff, o paraíso deixou de ser paraíso há muito tempo. Você falou sobre desconfiança e eu me lembrei do Danilo que, de uns tempos para cá anda muito estranho. Como se estivesse me evitando, sabe? Antigamente ele era toda disposição quando se tratava de conversar comigo e hoje raramente atende minhas ligações. Domingo agora eu acordei e nem sinal dele. Sumiu o dia inteiro e só reapareceu à noite sem me dar nenhuma explicação. Disse que havia saído para resolver uns problemas, mas não me disse quais eram. E essa não foi a primeira vez. Durante a semana ele às vezes some também. Eu nem insisto mais, sabe Julia.
No momento em que Sam falou isso, minhas antenas se ligaram na hora. Danilo sumiu no domingo, exatamente como Tom. Fiquei pensando que tudo isso poderia estar relacionado de alguma forma, mas não sabia como. Então lembrei que no dia da festa a fantasia eu havia ouvido uma conversa entre os dois falando exatamente sobre algum tipo de segredo que Tom também se recusara a me dizer qual era na época.
Ficou claro na minha cabeça que os dois, Tom e Danilo, guardavam um segredo juntos. Pela minha cabeça passou as piores coisas possíveis e imagináveis. Resolvi então que não contaria a Sam sobre isso, ela me parecia bastante estressada com tudo aquilo.
- Que estranho... – eu falei completamente imersa em meus pensamentos.
- Mas eu não quero mais pensar nisso, Julia. Vamos focar só no trabalho essa semana. Temos problemas demais aqui para trazermos mais alguns de casa, não é?
- É verdade. – Respondi sem muita convicção. Não conseguia parar de pensar no quão estranho era aquilo. Que segredo aqueles dois mantinham que os faziam sumir juntos durante dias inteiros? Só de tentar raciocinar a respeito eu já ficava com dor de cabeça. Tirei meus óculos e passeia mão no rosto, tirando o excesso de suor que se acumulara naquela região ao redor dos olhos. Coloquei-o novamente e resolvi que, naquela semana, só ia tentar pensar no trabalho.
Horas mais tarde, quebrei minha própria promessa e resolvi voltar ao assunto. Não por pura insistência, mas por notar que eu e Sam estávamos passando pela mesma situação. Porém em nenhum momento eu me vi triste pela minha relação com Tom, ao contrario de Sam com Danilo. Na conversa que tivemos mais cedo, ela pareceu carregar mais mágoas do que qualquer coisa ocasionada por uma omissão de fatos.
- Sam?
- Oi – respondeu sem tirar os olhos da tela do computador.
- Você ainda gosta do Danilo como gostava no começo do namoro?
Estava certa de que minha pergunta havia causado estranheza em Sam, que ficou vários segundos olhando para mim sem falar nada, apenas refletindo. A Cara estática como se tivesse dado uma tela azul no seu sistema interno.
- Ah, Julia... eu gosto dele. Só não gosto quando ele mente pra mim.
Sei como é!
Não sei como funciona o amor. Não sou e nunca fui expert nessa área. Não tenho bagagem nem experiência. Mas sei que sempre que nos propomos a amar queremos que dure para sempre. Talvez a rotina, o tempo, as pequenas coisas da vida que deviam ajudar o amor a aumentar acabe, por fim, atrapalhando. Talvez seja só o cansaço. Talvez você se veja vivendo uma vida que não devia ser a sua. Talvez o relacionamento amoroso que você tenha pedido a Deus ele tenha dado para outra pessoa.
O Que acontecia no relacionamento entre Sam e Danilo não era da minha conta. Mas se aquilo tudo, de certa forma, envolvia Tom, então eu gostaria de saber. Gostaria de saber para não me ver duvidando do futuro da minha relação como eu vi Sam fazer em minha frente.
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Do outro lado da cidade, uma floricultura recebia a visita de um jovem rapaz que passara para fazer um orçamento. Precisaria de flores. Estava visitando outros tantos lugares e anotando cada informação em um pequeno caderno. Todo aquele trabalho teria que dar um resultado positivo, apesar do ousado objetivo que tinha em mente.
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Querida Folha em Branco
Юмор“Eu nunca colocaria pressão em você se não acreditasse no seu potencial. Trabalhamos juntos há quatro anos e sei que você escreve muito bem, só lhe falta inspiração. E você não irá encontrar a inspiração sem descobrir as novas histórias que a vida t...