Capítulo 4

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Desembarcamos, eu e as minhas más intenções, numa ruazinha inclinada de Perdizes. Lá estava eu em frente ao interfone. Apto 42. Savannah – esse era o nome da garota que eu estava prestes a sacanear por motivos totalmente egoístas. A mesma que provavelmente me chutaria de volta para Baixo Augusta caso descobrisse que eu alguma vez a imaginei como uma vítima indefesa da minha própria falta de integridade. Que era exatamente o que eu estava pensando, parada ali, em frente ao seu prédio.


Quarto andar e nem um fucking elevador. Eu odeio esses prédinhos namastê de Perdizes. Muitos degraus depois e a Savannah abriu a porta nitidamente feliz com a minha visita. Encostou no batente como se já me esperasse há algum tempo e eu sorri. Um sorriso sincero, feliz de revê-la. Ela tinha aquele jeito que eu gostava, cabelo longo castanho claro e personalidade forte, era irresistível. Com o tempo, tínhamos desenvolvido uma cumplicidade uma com a outra que eu não tinha com outras garotas com quem ficava – mas algo me impedia de estar realmente com ela.


Minha falta de maturidade, provavelmente.


Ela era uma dessas adolescentes punks do interior de São Paulo que entraram na cena hardcore eletrônica quando vieram para a capital e uns anos depois caíram nuns sons experimentais depressivos – não sei bem explicar. Eu gostava. O sexo era de fazer qualquer uma agarrar os lençóis até rasgá-los. E eu também gostava de pensar que era para isso que nos ligávamos de tempos em tempos, ainda que essa fosse provavelmente só a minha perspectiva. E não a dela.


- Então quer dizer que você ainda está viva? – ela perguntou de braços cruzados, rindo, ainda encostada no batente.
- É... Ando meio ocupada, correria no trampo...Mentira.


Ela levantou a sobrancelha como se não acreditasse em mim, ainda rindo, e em resposta eu a beijei contra o batente. Meu deus, como eu precisava disso. Tem umas bocas que simplesmente se encaixam.


- Posso entrar? – perguntei, fazendo graça.E como se já soubesse a resposta, fui me dirigindo para dentro do apartamento com uma confiança desmedida.

- Na verdade – ela me segurou, tirando as chaves do bolso –, eu estava saindo para almoçar agora mesmo. Vamos?


Espera. Quê? Fiquei parada olhando para ela, sem reação. Não, você não está entendendo – eu preciso de horas intermináveis de sexo sapatão de qualidade. Você está realmente sugerindo que eu fique sentada por sabe-se-lá quanto tempo em um restaurante? Ah, não. Não, não. Não. Mas não mesmo. Não. Isso não está acontecendo, eu ri, indignada.


- Olha, eu posso até te acompanhar... – não me dei por vencida e a encostei de volta contra o batente da porta, fazendo graça – ...mas duvido que qualquer lugar ofereça o que eu estou com vontade de comer.


É. Eu estava pronta para tirar a roupa ali mesmo. Admito. Danem-se os vizinhos, os bons modos, a porra toda. Eu precisava de qualquer coisa que ocupasse a minha cabeça. E aquela era a solução ideal. Savannah colocou os braços ao meu redor e se aproximou do meu ouvido, enquanto eu descia pelo seu pescoço, beijando a sua pele. O clima entre nós duas começava a funcionar a meu favor.


- Hum. Eu estou morrendo de fome... – sussurrou e, antes que a minha mente poluída pudesse achar que ela tinha finalmente entrado na minha, Savannah me tirou de cima dela – É sério. Eu estou mesmo morrendo de fome. Vamos?!


Aquilo era vingança. Desgraçada. Eu podia ver ela se divertindo com toda a situação e achando graça na minha nítida cara de frustração. Isso porque, dez minutos antes, eu estava plantada em frente ao seu prédio imaginando-a como uma vítima da minha arrogância. Pois é. Agora eu que era arrastada para um almoço totalmente inoportuno, a três quadras dali, com a cara mais emburrada do mundo. Que ironia.

F*ckin' Siyoon (+18)Onde histórias criam vida. Descubra agora