one day we'll reveal the truth

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Hospital em Martha's Vineyard.

Verão dos dezessete, depois do acidente.

Apesar de imaginarmos que lençóis de hospital são brancos como todo o restante, eu me lembro de que me cobriam com um azul, de tecido fino. Eu estava deitada em uma cama reclinada, coberta por um lençol azul.

O quarto estava tão quente que eu podia sentir minha pele melada. Me furaram com um acesso intravenoso no braço que formigava e incomodava.

Minha mãe e meu avô olhavam fixamente para mim. Ele segurava uma caixa de doces de Edgartown que havia trazido de presente, em pé, parado na beirada da cama. Fiquei tocada por ele lembrar que eu gostava dos doces de Edgartown.

Eu estava escutando música com fones de ouvido, então não dava para ouvir o que os adultos diziam. Minha mãe chorava. Estava preocupada? Eu estava bem. Ao menos, estava viva.

Meu avô abriu a caixa de doces, tirou um e ofereceu para mim.

Mas eu não prestava atenção em nada. Ouvia apenas a letra da música.

And if you're still breathing, you're the lucky ones
'Cause most of us are heaving through corrupted lungs
Setting fire to our insides for fun
Collecting names of the lovers that went wrong

Levantei a mão para tirar os fones do ouvido, e então poderia ouvir minha própria voz ao agradecer avô Harris pelos doces. Mas ela estava enfaixada. Minhas duas mãos estavam enfaixadas. E meus pés. Dava para sentir o curativo neles, debaixo do lençol azul.

Minhas mãos e meus pés estavam enfaixados porque estavam queimados.

Eis a verdade sobre a bela família Sinclair. Pelo menos, a verdade que meu avô conhece. A verdade que ele teve o cuidado de manter fora dos jornais. Uma versão ilusória sobre as ruínas da família.

Há dois verões, em uma noite quente de julho, Calum Thomas Hood, Luke Sinclair Hemmings, Zoe Sinclair Hemmings, Ashton Sinclair Irwin e Michael Sinclair Clifford, morreram em uma casa que pegou fogo, supostamente devido a um galão de combustível que derramou no quartinho dos fundos. A casa em questão se reduziu a cinzas antes que o corpo de bombeiros da região conseguisse chegar ao local. Pelo fato de ser construída em alvenaria antiga, as chamas se alastraram com facilidade e logo tomou todos os cômodos.

Lola Sinclair Atwood, neta do proprietário, estava presente na ilha no momento do incêndio, mas só percebeu o que estava acontecendo quando o fogo já estava bem avançado. Ela não teria controle da situação sozinha.

A imensidão de chamas a impediu de entrar na instalação quando se deu conta de que havia pessoas e animais presos lá dentro. Seus primos, um amigo da família, e dois cães da raça golden retriever.

Lola teve queimaduras nas mãos e nos pés na tentativa de resgate. Depois, correu para outra casa da ilha e telefonou para os bombeiros.

Quando a ajuda finalmente chegou, a srta. Lola Sinclair foi encontrada na praia pequena, com metade do corpo dentro d'água, em posição fetal. Ela não foi capaz de responder perguntas a respeito do que havia acontecido e pareceu ter sofrido traumatismo cranioencefálico. Teve de receber sedação pesada durante vários dias após o acidente.

Harris Sinclair, dono da ilha, recusou qualquer investigação formal a respeito da origem do incêndio. Muitas árvores dos arredores foram dizimadas.

Foram realizados os funerais de Calum Thomas Hood e Michael Sinclair Clifford em Nova York, onde residiam. Luke Sinclair Hemmings, Zoe Sinclair Hemmings e Ashton Sinclair Irwin, foram velados em Cambridge. Lola Sinclair Atwood não estava bem o bastante para comparecer. Ela não teve a chance de se despedir dos grandes amigos.

No verão seguinte, a família Sinclair voltou à ilha Beechwood. Ela se desintegrou. Eles ficaram de luto. Beberam muito. Depois construíram uma nova casa sobre as cinzas da anterior. Lola Sinclair não tinha nenhuma lembrança dos fatos que cercaram o incêndio, nenhuma lembrança do ocorrido. Estava traumatizada.

Suas queimaduras se curaram rapidamente, mas ela passou a apresentar amnésia seletiva no que dizia respeito aos acontecimentos do verão anterior. Insistia em acreditar que havia batido a cabeça enquanto nadava. Mas não aparecia sequela alguma na série de exames em que fora submetida. Os médicos presumiram que suas dores de cabeça debilitantes eram causadas por luto não reconhecido e culpa. Foi medicada com drogas pesadas e ficou extremamente frágil, tanto física quanto mentalmente. Os mesmos médicos aconselharam a mãe de Lola, Índia Sinclair, a parar de explicar a tragédia se ela não conseguisse lembrar sozinha. Era demais para ela receber notícias do trauma todos os dias, como se fosse novidade. Melhor deixar que lembre no seu próprio ritmo.

Ela não deve voltar à ilha Beechwood antes de ter um tempo substancial para se curar. Na verdade, qualquer medida possível deve ser tomada para mantê-la longe da ilha no ano subsequente ao acidente. Harris Sinclair, então, custeou toda uma viagem para a Europa na tentativa de manter a neta entretida e afastada de Beechwood no verão seguinte ao acidente. Lola começou a exibir um desejo inquietante de se livrar de todas as suas posses desnecessárias, até mesmo coisas de valor sentimental, quase como se pagasse por crimes do passado.

Sua mãe procurou ajuda profissional para explicar o comportamento de Lola e foi informada de que parecia uma parte normal do processo de luto. No segundo ano após o acidente, a família começou a se recuperar. Com o tempo, Lola expressou o desejo de voltar à ilha Beechwood. Os médicos e os outros membros da família concordaram: podia ser bom para ela fazer exatamente isso. Na ilha ela talvez conseguisse se curar.



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sim, vocês me tombaram. a maioria. eu não sabia mais como negar KKKKK minha tml virou um campo minado

tô infinitamente triste, e acredito que vocês estejam também — nem que seja um pouquinho.

pra isso, separei os capítulos.
esse é apenas uma introdução mas o próximo também já está postado! rola aí que tem mais

nos encontramos daqui a pouquinho.
segura esse coração, tá só começando

we were liars - cthOnde histórias criam vida. Descubra agora