.𝟏𝟔.

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O interior do Volvo era tão imaculado quanto a parte de fora. Em vez do cheiro de gasolina e tabaco, havia só um perfume suave. Era quase familiar, mas não consegui identificar.

O que quer que fosse, tinha um cheiro delicioso. Quando o motor ganhou vida, ela mexeu em alguns botões, aumentou o aquecimento e baixou a música.



— É "Clair de Lune"? — perguntei. Ele olhou para mim, surpresa.

— Você é fã de Debussy?

Eu dei de ombros.

— Minha mãe ouve muita música clássica em casa. Só conheço minhas favoritas.

— Também é uma das minhas favoritas.

— Olha só — eu disse. — Temos alguma coisa em comum.

Eu esperava que ele risse, mas ele só ficou olhando para a chuva. Relaxei no banco cinza-claro, reagindo na mesma hora à melodia familiar. Como eu só a via pelo canto do olho, a chuva borrava tudo fora da minha janela em manchas cinza e verdes. Demorei um minuto para perceber que estávamos indo muito rápido; mas o carro se movia tão suavemente, que não senti a velocidade. Só a cidade passando rápido foi que deixou evidente.

— Como é a sua mãe? — perguntou ele de repente. Os olhos cor de caramelo me observavam com curiosidade quando respondi.

— Ela é meio parecida comigo, com os mesmos olhos e a mesma cor de cabelo, mas é baixa. É extrovertida e bem corajosa. Também é meio excêntrica, meio irresponsável e uma cozinheira imprevisível. Ela era minha melhor amiga. — Eu parei.

Era deprimente falar dela no passado.

— Quantos anos você tem, Tae? — A voz dele parecia frustrada por algum motivo que não consegui imaginar. O carro parou, e percebi que já estávamos na casa de Charlie.

A chuva estava tão forte que eu mal conseguia ver a casa. Era como se o carro estivesse submerso em um rio.

— Tenho 17 anos — respondi, meio confuso pelo tom dele.

— Você não parece ter 17 — disse ele. Como se fosse uma acusação. Eu ri. — Que foi? — perguntou ele.

— Minha mãe sempre diz que eu nasci com 35 anos e que entro mais na meia-idade a cada ano que passa. — Eu ri de novo, depois suspirei. — Bom, alguém tem que ser o adulto. — Parei por um segundo. — Você mesmo não parece aluno do segundo ano — observei. Ela fez uma careta e mudou de assunto.

— Por que sua mãe se casou com Phil?

Fiquei surpreso de ele se lembrar do nome; eu só falei nele uma vez, quase dois meses atrás. Precisei de um momento para responder.

— Minha mãe... é muito jovem para a idade dela. Acho que Phil a faz se sentir ainda mais nova. De qualquer forma, ela é louca por ele. — Eu não entendia, mas alguém por acaso acha que algum cara é bom o bastante para sua mãe?

— Você aprova? — perguntou ele

Dei de ombros.

— Quero que ela seja feliz, e é ele quem ela quer.

— Isso é muito generoso... Eu me pergunto...

— O quê?

— Acha que ela teria a mesma consideração com você? Independentemente de quem você escolhesse? — Os olhos dele ficaram atentos de repente, observando os meus.

— A-acho que sim — gaguejei. — Mas ela é a adulta, ao menos no papel. É meio diferente.

O rosto dele relaxou.

𝐓𝐰𝐢𝐥𝐢𝐠𝐡𝐭 | 𝐕𝐦𝐢𝐧 𝐕𝐞𝐫𝐬𝐢𝐨𝐧Onde histórias criam vida. Descubra agora