24. Capítulo 24

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XingChen aceitou ser internado numa clínica de repouso por um tempo, para se tratar da depressão. A-Qing ia todos os dias de visita. Em um determinado momento do tratamento, ele precisou enfrentar Song ZiChen e Xue Yang, mas não conseguiu ir até a prisão ver o mais novo. ZiChen, por outro lado, mal o deixou falar no telefone, foi correndo até a clínica para visita-lo.

-Como você está? – perguntou pegando uma das mãos dele sobre a mesa, mas ele puxou a mão de volta junto ao corpo. Eles conversavam numa área comum da clínica. XingChen parecia ainda mais calmo que o normal, claramente sob efeito das medicações, ele estava quase aéreo. De longe, a médica que o acompanhava, observava a conversa, pronta para intervir se necessário. 

-Eu tô melhorando... E você? – respondeu com a voz levemente arrastada.

-Também estou bem. – ele sabia que XingChen não estava, mas mesmo assim achava que dizer isso melhoraria as coisas. Era ainda mais doloroso vê-lo ali do que quando ele se recuperava do acidente, sua cabeça pendia levemente para um dos lados e seus movimentos eram lentos, como se estivesse com sono. Mas ZiChen estava grato por finalmente poder vê-lo depois de 2 meses tendo acesso a poucas informações que A-Qing soltava – Sinto sua falta, XingChen... – o outro não respondeu, ele estava cabisbaixo e mexia nos próprios dedos sobre a mesa – O que eu fiz naquele dia... Não foi certo... Nem ter te mandado embora, ou ter ido atrás de você depois... Na primeira vez eu fui fraco... Sabe, não fiz por mal, mas fui fraco e rude... Eu tinha que ter ficado com você e te apoiado... Eu sei... Sempre soube, só não queria aceitar... E quando eu fui atrás de você eu apenas... Apenas queria te proteger... Tive medo que algo acontecesse... Que ele estivesse com você por outras intenções...

-Porque ninguém poderia simplesmente se interessar por mim como se interessaria por alguém normal... Não é?

-Não foi isso que eu falei, XingChen! Por Deus, não distorça minhas palavras. Eu nunca fui bom em me expressar, sempre falo besteira, por favor, entenda... É claro que alguém pode gostar de você de verdade, eu gosto de você de verdade! Mas eu duvido muito que alguém que tenha cometido tantos crimes possa gostar de alguém. Mesmo você sendo maravilhoso! Você é maravilhoso! Só pra deixar claro. E é normal também, não se refira a si mesmo como se fosse de outro planeta. – o outro deu um meio sorriso torto e triste, aquelas palavras, mais uma vez, o machucaram.

-Eu acho que já ouvi demais… - refletiu, mas ainda sem sair do lugar.

-Você... Também não sente minha falta?

-Eu estaria mentindo se dissesse que não, ZiChen... Mas não consigo mais encaixar nós dois... Não faz mais sentido...

-Com aquele assassino faz mais sentido pra você? - o outro soltou uma fraca risada sem humor.

-Você, que pode enxergar, olhe onde eu estou... Dê uma boa olhada nesse lugar... Algo faz sentido pra alguém que está aqui? Alguém aqui parece não estar completamente perdido? Porque eu estou. Me perguntar o que faz sentido pra mim é quase uma piada ruim...

-Você mudou muito... – se lamentou.

-Sim... Você também não é o mesmo de antes... Ou talvez seja... Eu que tive que perder a visão pra "enxergar" isso...

-XingChen... Nós tínhamos sonhos tão parecidos pro futuro... Você se lembra? De todas as promessas que fizemos... Do que queríamos construir juntos... Das crianças que adoraríamos… Nosso casamento...

-Atualmente o único sonho que eu tenho é parar de ser dopado e conseguir sair daqui… - ZiChen podia notar claramente a tristeza e o cansaço naquelas palavras, decidiu não insistir mais.

-Se tiver algo que eu possa fazer... Se eu puder te ajudar a melhorar... Por favor, me diga.

-Obrigado por tudo, ZiChen... Nós fomos tão felizes... – o esboço de um sorriso meigo surgiu em seus lábios e era genuíno – Descobrimos tantas coisas juntos... Sobre nós mesmos e um sobre o outro... Você fez parte dos meus dias mais felizes durante 4 maravilhosos anos... E são essas memórias que eu vou guardar de você. Eu quero lembrar do seu sorriso envergonhado, do seu olhar apaixonado quando me chamou pra morar com você, das vezes que eu acordei com o cheiro do chá que você fazia pra mim... É isso que eu vou guardar no meu coração. Mas nós dois... Não vamos construir mais memórias juntos... – disse se levantando da cadeira um pouco tonto, se segurando no tampo da mesa. O outro também levantou – Por favor, ache alguém que seja realmente bom pra você, que te ame sobre todas as coisas e que você também ame, que vocês se respeitem acima de tudo e que te faça infinitamente feliz porque, de coração, isso é tudo que eu desejo pra você. – ambos estavam lacrimejando. O mais alto não conteve o impulso e abraçou o corpo fragilizado a sua frente, XingChen hesitou, mas moveu um dos braços ao redor dele e esfregou suas costas delicadamente, enquanto a outra mão ainda se apoiava na mesa. Aquele era, definitivamente, um adeus.

XingChen ficou 6 meses internado na clínica, era difícil recuperar a si mesmo quando nem ele acreditava que poderia. Durante esse tempo, sua irmã o visitou uma vez para garantir que ele realmente estava bem e depois ele só permitiu que A-Qing o visse. Ela contava apenas noticias boas e engraçadas sobre o mundo e sobre a vida dela, ignorando totalmente os acontecimentos ruins. Eventualmente ele perguntou sobre Xue Yang, mas como ela não tinha ido à prisão, não tinha informações sobre ele, apenas sabia que continuava preso. Quando recebeu alta, o homem, com agora quase 25 anos, tinha que mais uma vez reorganizar sua vida, felizmente A-Qing era incrivelmente ágil e já tinha adiantado algumas coisas.

-Xiao-gege, semana passada eu liguei pro seu antigo emprego. - disse ela quando desceram do ônibus de volta para casa, era inverno mais uma vez – Eu disse que você seria liberado hoje e eles disseram que a pessoa que ficou no seu lugar era muito ruim! – ela falava de maneira teatral – Disseram que não sabia nem pegar uma criança no colo! Como alguém vai trabalhar com crianças sem nem saber como segurar uma? – ela riu e ele deu um sorriso que aqueceu seu coração – Então, eles querem que você vá lá amanhã, se tiver interesse, o emprego é seu de novo.

-A-Qing, você é surpreendente. Eu não sei o que teria sido de mim se não tivesse te conhecido. 

-Para, gege! Não fala assim. – disse envergonhada – Essa fala é minha... – ela saltitou ao redor dele e pegou sua mão livre, a que não estava com a guia, o puxando para dentro da casa, o cheiro que invadiu suas narinas era de seu prato favorito, a casa parecia diferente do que ele se lembrava, mais “aberta” e o ar parecia mais leve.

-O que mudou na casa?

-Você é muito perspicaz! Fiz pequenas reformas, pintei as paredes com cores mais claras, mudei uns móveis de lugar pra ficar mais espaçoso, joguei um montão de tralha velha fora. O que me diz? Parece mais com um lar agora?

-Sempre pareceu um lar, A-Qing. Mas sim, foi uma boa mudança, aposto que quando o verão chegar vai estar mais arejado.

-Sim! Também não tem mais fedor de mofo, bom, agora não dá pra saber por causa do cheiro da comida, mas mais tarde você vai sentir. 

-A-Qing... – chamou com a voz cheia de ternura.

-Sim, gege?! – ela estava radiante. 

-Muito obrigado. – disse ele abraçando-a. O topo da cabeça dela batia em seu peito, ele afagou seus cabelos enquanto ela ouvia as batidas de seu coração, feliz por saber que aquele corpo estava vivo, quente e pulsando.

-Muito obrigada também. – disse se afundando no abraço. 

-A-Qing... Amanhã depois que for recuperar meu emprego, vou na prisão...

-Você tem certeza? 

-Sim... Eu não quero deixar nenhuma ponta solta.


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