3. Congresso internacional do medo

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Provisoriamente não cantaremos o amor, 
que se refugiou mais abaixo dos subterrâneos. 
— C. Drummond de Andrade


Heidi bateu a porta do Range Rover de sua mãe logo atrás de Vasti. Elas tinham acabado de chegar no colégio e a música habitual que começava a tocar a partir das sete da manhã ficava mais alta e nítida conforme se aproximavam da entrada principal. O pátio com acesso ao jardim recreativo já estava abarrotado de alunos para o momento da missa de sexta-feira.

O padre Tim apareceria, faria o discurso de um verdadeiro cordeiro de Deus e, então, conduziria a reza matinal a fim de amenizar os pecados lascivos dos adolescentes, mantê-los devotos e nas rédeas. Heidi não era uma menina religiosa e, às vezes, sentia-se uma completa farsa.

— Hoje a gente reza, amanhã a gente peca — Marcela entoou baixinho apenas para as amigas escutarem, com os olhos cheios de malícia, mas atentos ao padre Tim.

— Amém — Vasti e Lorena disseram juntas, sorrindo uma para a outra com a conexão. Heidi revirou os olhos e procurou por Carol no meio dos alunos, encontrando-a entretida com um garoto cujo nome não recordava.

— Quem é aquele menino com a Carol? — perguntou para a irmã, que seguiu o olhar de Heidi no mesmo segundo.

— Ah, é o Ben. Ele joga futebol com o Conrado, eu acho — ela disse com um tom que Heidi não soube decifrar se era de aprovação ou não. — Eles estão ficando há uns dias, mas nada sério.

Heidi foi incapaz de esconder a expressão de desalento que tomou conta de seu rosto, sentindo uma pontada de um sentimento que nunca teve coragem de nomear, mas que agora precisava encará-lo porque estava cada vez mais frequente. Sentiu ciúmes e um forte impulso de chorar. Heidi não era estúpida, tampouco se iludia com as migalhas de afeto que recebeu de Carol.

Exceto pelo beijo. Heidi se iludiu com o beijo e foram dois anos em negação, mas agora ela estava pronta para assumir o que sentia para si mesma. Sentia-se compelida a encarar o fato de que seus sentimentos por Carol eram tão reais quanto urgentes. No entanto, sabia que jamais teria uma chance com ela.

Com o fim do sexto período, Heidi se despediu de Melissa e esperou a irmã no saguão do colégio para irem para casa juntas, já que nenhuma das duas tinha atividades extracurriculares na sexta-feira — exceto Vasti, que praticava arco e flecha às quatro da tarde. Heidi revirou os olhos. A irmã sempre enrolava ao menos vinte minutos para pegar suas coisas e descer para encontrar com ela.

— Heidi, a bailarina solitária. — Ecoou a voz que fez Heidi sofrer de um leve sobressalto, virando-se apenas para encontrar Rebeca Villar encostada na pilastra a dois palmos de distância. — Meus passarinhos sussurraram algumas coisas que me deixaram muito curiosa, sabia?

— Ah, é? — Heidi não tentou dissimular interesse. Rebeca era imprevisível demais e ela não queria arriscar ser um alvo. — E que coisas foram essas?

— Dois nomes juntos que me chocaram — respondeu com o veneno escorrendo de seus lábios, empurrando-se para longe da pilastra para poder ficar de frente para Heidi. — Heidi e Conrado. Juntos. Imagina o meu choque?

— Imaginei — Heidi não sabia de onde vinha aquilo e o que Rebeca pretendia ao encurralá-la daquele jeito, mas resolveu apenas dar de ombros. — Chocante.

— Não banca a sonsa comigo — ela sorriu com falsa polidez. — Qual é a sua com o Conrado?

— Qual é a minha com o Conrado? — Heidi repetiu, tentando colocar sentido na pergunta. — Até onde eu sei somos amigos?

Minha Sina CarolinaOnde histórias criam vida. Descubra agora