9. Incenso fosse música

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isso de querer
ser exatamente aquilo
que a gente é
ainda vai
nos levar além
— Paulo Leminski

Os dias passavam e a vontade de conversar com Vasti sobre tudo o que estava acontecendo aumentava gradativamente no peito de Heidi. Ela não conseguia mais olhar para a irmã sem sentir a necessidade de se abrir, contar tudo o que estava entalado na garganta, mas temia a reação que teria. As investidas de Conrado continuavam e descobriu da pior forma que as pessoas estavam falando sobre eles, insinuando que estavam juntos.

Não era de se admirar que agora Rebeca tinha a atenção voltada cem por cento para Heidi e atenção indesejada era a última coisa que precisava naquele momento. Por isso, sabia que precisava ser honesta com Vasti e confiar que seu segredo mais bem guardado não seria recebido com pesar, mas com compreensão e aceitação. Heidi via em Vasti alguém em quem podia confiar e esperava que suas crenças não caíssem por terra, porque não havia ninguém no mundo que a protegia com tanta garra como Vasti.

Sentada no assento da janela, deixou de lado o romance russo que lia e observou por alguns instantes Vasti estudar em silêncio. Com o coração batendo com a fúria de cem cavalos trotando a toda velocidade, decidiu então que precisava ser honesta mesmo que o gesto acabasse como um tiro no pé.

— Vasti? — chamou.

Deitada de bruços na cama de casal de Heidi, Vasti se rodeou de livros e cadernos, com fones de ouvido que a impediam de escutá-la.

Heidi não entendia como ela conseguia se concentrar com ruídos nos ouvidos e chegou à conclusão de que aquilo podia ser uma estratégia de estudo, uma forma de estudar sem se incomodar com o que acontecia ao seu redor.

Suspirando fundo, pegou uma das almofadas espalhadas no banco com espaço para até três pessoas e jogou na irmã, conseguindo, enfim, chamar sua atenção. Vasti tirou um lado do fone do ouvido, encarando-a com leve sobressalto.

— Que foi?

O coração de Heidi parecia uma verdadeira escola de samba. Nervosa, mas decidida, gesticulou para que a irmã fosse até ela. Vasti deixou os livros de lado e largou os fones na cama, sentando-se de frente para Heidi.

— Eu quero conversar com você sobre uma coisa — começou, pronunciando as palavras bem devagar. Ainda dava tempo de mudar de ideia, mas continuou: — Eu não sei como falar, então vou tentar ser bem direta...

— É sobre você e o Conrado? — Vasti interrompeu sua linha de raciocínio e algo em sua mente a fez pensar naquilo como uma deixa para desistir. — Porque se for, já deu para perceber que vocês estão meio que juntos, então não precisa ficar nervosa em me contar.

— Vasti, não. Não é isso... Quer dizer, a gente se beijou algumas vezes, mas não... — ela freou as próprias palavras, incerta e nervosa, mas não podia recuar agora. — Eu não gosto do Conrado desse jeito.

— Heidi, tá tudo bem. Eu sei que você tem seu tempo. Sempre teve — Vasti pegou as mãos da irmã entre as suas e a fitou com zelo e atenção. — Você não precisa fazer nada que não queira e eu sei que sou suspeita para falar, mas o Conrado é um menino muito legal. Talvez se você der uma chance...

— Vasti, eu não vou ficar com o Conrado — Heidi se apressou em dizer, sentindo os olhos lacrimejarem quando a irmã a encarou com a expressão de confusão. — Eu não vou ficar com ele nem com nenhum outro menino porque não é... — ela suspirou antes de confessar baixinho: — Porque eu não gosto de meninos.

— Você o quê? — Vasti piscou de repente, confusa e atônica com palavras que não conseguia achar sentido. — De onde... O que... Que loucura é essa, Heidi?

Minha Sina CarolinaOnde histórias criam vida. Descubra agora