5. A estrela

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Heidi e Vasti passaram o fim de semana inteiro com o pai na casa de praia. Tomaram banho de mar pelas manhãs e flutuaram preguiçosamente na piscina até o céu mudar a cor de tons laranjas para o preto breu. Comeram a comida que o pai cozinhou com grande entusiasmo e passearam pela praia à noite quando ninguém conseguia dormir por causa do calor intenso de verão.

— Papai, você acha que algum dia você pode deixar de me amar? — Heidi perguntou na manhã de domingo, quando estavam sozinhos, sentindo os cantos dos olhos arderem só de pensar em dizer para ele o segredo que guardava em seu peito.

— Que pergunta é essa, filha? — ele a encarou com estranheza, enxugando as mãos no pano de prato quando terminou de cortar as frutas para o café da manhã. Vasti ainda estava dormindo e só levantaria quando a comida estivesse na mesa.

— Você e a mamãe criaram eu e a Vasti com expectativas que talvez eu não consiga corresponder — Heidi desviou os olhos da figura de um metro e noventa de altura, os cabelos pretos e lisos bagunçados pela brisa fresca que entrava pela janela.

— Que expectativas são essas? — Buarque perguntou, colocando as frutas cortadas num recipiente de vidro, rindo com o pensamento que surgiu em sua cabeça. — Você acha que eu e a sua mãe vamos forçar você a fazer Medicina também?

— Tem outras coisas que podem não sair como o esperado — Heidi tentou mais uma vez, acrescentando a faculdade de Medicina na lista. — Acho que eu quero fazer Jornalismo, de qualquer forma.

— Ótimo! — ele disse com animação. — Você faz Jornalismo e a sua irmã, Veterinária. Se vocês mudarem de ideia e quiserem fazer outra coisa, tudo bem também.

— Acho difícil a Vasti mudar de ideia agora — comentou distraidamente, encarando o próprio reflexo na mesa de tampo de vidro. — É o último ano dela e ela parece já saber o que quer.

— E você não?

— Eu sei, mas talvez vocês não gostem. É bem possível que vocês não aprovem — Heidi suspirou, desejando mais do que tudo poder ser sincera e dizer o que queria dizer, mas a garganta travava toda vez que tentava falar em voz alta. Ela ainda não conseguia produzir as palavras em alto e bom som.

— Heidi, eu só quero que você seja feliz. É tudo o que importa — Heidi absorveu aquela frase por um minuto inteiro, encarando o pai com os olhos cheios de expectativa.

— Promete que vai lembrar disso depois?

— Prometo — garantiu com uma risada descontraída, aproximando-se da filha para beijá-la no topo da cabeça antes de começar a arrumar a mesa para o café da manhã. Heidi só podia esperar que ele cumprisse com a palavra.

***

Na segunda-feira pela manhã, Heidi saiu da aula de história direto para o intervalo, aproveitando o trajeto até o refeitório para contar para Melissa sobre o fim de semana que passou com o pai. Contou tudo em pormenores, mas evitou mencionar a angústia pela qual passou por boa parte da viagem.

Heidi olhava para a amiga e tentava imaginar a reação dela quando confessasse que gostava de meninas. O que ela diria se Heidi contasse que estava passando pela experiência mais dolorosa de sua vida? Apesar de imprevisível, Melissa jamais viraria as costas para Heidi por algo que fugia de seu controle. Disso ela sabia.

— Ei, me ajuda com umas coisas do francês depois da aula? — Melissa parou no meio do refeitório, encarando a amiga com expectativa. — Depois a gente pode começar a nova temporada de Killing Eve. Aquele final me deixou nervosa. Em troca, posso te ensinar algumas frases em japonês. Que tal?

Minha Sina CarolinaOnde histórias criam vida. Descubra agora