Nove

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James

   Bufei, largando o livro sob a mesa diante de mim.
Aquela altura, todos os empregados já estavam informados sobre a chegada de minha "noiva". Em resposta, minha casa inteira estava um verdadeiro caos, tendo os sons de móveis sendo afastados, para todos os lados.

Era insuportável.

   Marilyn surgiu com sua habitual bandeja por debaixo do braço, na porta de meu aposento. Ela sorriu, aproximando-se de mim, antes de fazer uma reverência.

   — Lorde James, desejas algo?

   — Um pouco de sossego me cairia bem...

Ela deu uma risadinha.

    — Ora, por favor! Sua noiva já deve estar á caminho, e imagino o quão nervoso estejas.

Não sei se "nervosismo" era a palavra correta para descrever como realmente sentia-me naquele momento.

Marilyn interpretou meu silêncio como um incentivo, pois continuou à falar:

   — Lorde Harold disse-me que sua noiva é realmente muito bela.

    — Sim. Ela é, de fato.

Voltei o olhar para a lareira, sem o menor ânimo ou intuito de falar sobre Victoria Jones. Meu pai havia feito-me o favor de ter passado a noite anterior inteira instruindo-me sobre como deveria "agir", agora que teríamos Victoria conosco.

De acordo com ele, eu tinha um comportamento um tanto "desanimador" e atípico, para alguém da minha idade. O que meu pai não entendia ou recusava-se à entender, era que eu não era mais o mesmo James de antes.

As perdas costumam deixar sequelas e de fato, o fizeram comigo. Entretanto, não fizeram isto apenas comigo. Antes da morte de Dylan, todos éramos mais felizes. Mas é claro, que meu pai enxergava apenas a minha mudança.

Ele não conseguia enxergar que sua esposa havia enlouquecido? ou que até mesmo ele, havia tornado-se mais amargo?

A morte de Dylan havia afetado à todos nós, e deixado um vazio insubstituível. Ou pelo menos era o que eu pensava, até conhecer Elsa; ela ensinou-me à voltar à viver e sentir prazer com as coisas mais simples da vida. Mas como poderia reerguer-me agora, sem Elsa?

Agora, eu estava sem Dylan, sem Elsa, sem minha mãe... Estava sozinho.

   — Lorde James? Ouviste o que acabei de dizer-lhe?

Voltei o olhar para a senhora diante de mim, com sua testa enrugada e franzida.

   — Perdão. Podes repetir?

   — Eu lhe disse, que seu pai parece estar realmente satisfeito com seu progresso.

Arqueei uma sobrancelha.

   — "Progresso"?

   — Bem, tendo em vista que o senhor concordou com a proposta feita por seu pai...

Bufei, apoiando o queixo sob uma das mãos.

   — Isto é o que você pensa, Marylin. Só concordei em fazer parte desta loucura, pela minha mãe.

Marilyn arregalou os olhos.

   — Pela senhora Josephine? 

   — Sim. Lembras de como ela costumava atuzinar-me para que encontrasse uma noiva?

Marilyn riu, nostálgica.

   — Oh, sim! Bons tempos. A senhora Josephine era uma mulher realmente sensata antes de... — pigarreou—, bem, o senhor sabe o quê. 

Assenti.

   Josephine White era uma mulher muito elegante e refinada, antes do acidente de Dylan. Lembro-me perfeitamente, de como ela costumava pegar no pé, para que encontrasse uma noiva; se ao menos ela estivesse sã, quando conheci Elsa... Tenho certeza de que a teria adorado.

   — Lorde James! Como estás distraído, hoje!

   — Desculpe, Marilyn. O que estavas à dizer?

Marilyn abriu um sorriso e apontou para a enorme porta francesa, que dava acesso à varanda de meu quarto. 

Estreitei os olhos.

Marilyn bufou, aproximando-se e puxando-me da poltrona.

   — Vamos, Lorde! — apontou para a porta—, veja você mesmo!

Fiz cara feia para ela, antes de atender seu pedido.

   Caminhei sem pressa alguma até a varanda de meu aposento. De onde estava, já era possível ouvir o som dos cascos dos cavalos. Cheguei na varanda e direcionei meus olhos imediatamente para a carruagem que acabara de pousar na frente de casa.

   Inclinei-me no guarda-corpo da sacada, tendo uma visão privilegiada de todos os eventos que sucediam lá embaixo: da parte dianteira da carruagem saíam dois lacaios que se despuseram à descer e abrir a porta da carruagem; de dentro da carruagem, saiu uma jovem no mínimo aterrorizada.

   Ela ergueu os olhos e os passou pela extensão da propriedade, demorando-se no momento em que seu olhar chegou ao andar mais alto da casa, onde jazia meu aposento.

   Depois de alguns segundos fitando-me, Victoria foi recebida por alguns criados da propriedade, que a receberam e praticamente a empurraram por adentro.

Entretanto, antes que se dispusesse à entrar na casa, Victoria ergueu mais uma vez o olhar, observando-me com uma expressão séria, no rosto.

Arqueei uma sobrancelha.

O que ela queria? Que eu a estivesse aguardando na porta de casa, agindo como alguém que estivesse realmente entusiasmado com sua presença?

Claro que não.

Não a queria ali e tampouco esforçaria-me para fingir que o faria.

Atrás de mim, Marilyn pigarreou.

   — Muito bem, Lorde. Creio que seja o momento em que  o senhor deve  descer para receber e dar as boas vindas à sua noiva.

Permaneci em silêncio, ignorando-a e fitando apenas à vista maravilhosa proporcionada pela varanda de meu quarto.

   — Lorde James?

Bufei.

   — Se quer tanto receber a visitante, faça isto você mesma.

Marilyn permaceu em silêncio por alguns segundos, até por fim dizer:

   — Se me permite, senhor... Farei exatamente isto. Afinal, a senhorita Jones não merece ser tratada com arrogância e grosseria. Com licença.

   Soltei um suspiro assim que ouvi o som da porta do quarto ser fechada. Exatamente, Marilyn.
Victoria não merecia ser tratada com grosseria, mas ainda assim, não parecia-me justo tê-la sob o mesmo teto que eu, antes mesmo de casarmos. Meu pai não queria uma esposa para mim. Queria uma babá. Alguém que vigiasse todos os meus passos de perto;

Infelizmente para ele, não daria tal gostinho. Victoria Jones era como um fantasma, que estava ali para atormentar-me.

Mal sabia ela, que era exatamente assim que ela seria tratada por mim: como se fosse um fantasma.

Aceite meu coraçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora