Vinte e cinco

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Victoria

   Quando dei por mim, já estávamos fazendo um percurso extremamente familiar: o caminho que dava acesso às ruas sinuosas de Hethersfild.
A entrada de meu amado vilarejo natal, era inconfundível: as oliveiras faziam um contorno belo, por entre a estrada.

Observei pela janela, a extensão do lago Valow, o mesmo em que Olivia, Michael e eu, brincávamos quando crianças. Estar de volta à Hethersfild trazia diversas recordações, das quais, eram sempre ao lado de Michael.

Ainda sentia-me em total descrença pelos fatos ocorridos nas últimas 24 horas; em um momento, James e eu estávamos bem, e no outro... Tudo desmoronou; as mentiras foram revelando-se gradativamente; éramos ambos culpados. James e eu, escondemos algo um do outro, e foi graças à isto, que tudo entre nós acabou.

Recostei-me no assento de couro atrás de mim, virando a cabeça na direção da janela. Aquela altura, era impossível conter as lágrimas em meu rosto. Ainda que estar de volta à Hethersfild me deixasse feliz, sentia como se tivesse esquecido algo em Longsford;

Desci os olhos para meus pés, onde a trouxa velha com os presentes de Michael estava posta. Inclinei-me, pegando-a logo em seguida. Dei uma última olhada em todos aqueles objetos; há uma semana atrás, se alguém me perguntasse, diria que aquele era meu maior tesouro. Agora, todavia, não passavam de recordações de algo já não existente: meu amor por Michael. Por fim, ergui a trouxa até a janela e liberei-a na estrada.

Observei atenta, os objetos caírem na estrada de chão, alguns submergindo nas águas cristalinas do lago Valow.
Faria diferente de James. Não permaneceria presa ao passado. Diferente dele, livraria-me de tudo o que foi um dia, relacionado à Michael e eu.

Enxuguei uma lágrima e peguei uma flor, que estava no assento à meu lado. Inspirei profundamente seu cheiro. Era um narciso. Aquela bela flor – que a esta altura já estava murcha –, era o único pertence que havia trago comigo, da casa de James. Deixara para trás, todos os objetos e vestidos que ele havia providenciado à mim. Ao contrário do que Michael pensava, eu não era interesseira.

   Alguns minutos depois, a carruagem fez uma curva adentrando numa estrada estreita, circundada por um belo campo florido. Conhecia muito bem aquele trecho: era o trajeto de minha casa. Ergui o pescoço tentando visualizar melhor os vislumbres da enorme casa localizada à minha direita: minha casa; era incrível como parecia ter passado tanto tempo desde que estivera ali, pela última vez. Não pude deixar de sentir-me nostálgica, vendo a casa em que cresci.

   A carruagem parou e segundos depois, a porta foi aberta, revelando um dos cocheiros; ele ergueu uma das mãos, e ajudou-me educadamente à descer da carruagem. Mal pus meus pés no chão, e já corri até a porta da casa. Bati na porta cerca de três vezes, e nada. Olhei para trás. Os cocheiros já estavam retirando as bagagens da carruagem.

   — Esperem um pouco, por favor. — pedi à eles, enquanto tornava à bater na porta.
Mas uma vez, ninguém atendeu.

Que estranho...

Foi quando decidi entrar por conta própria. Afinal, aquela ainda era minha casa. Que mal teria em entrar sem bater?

Dei um último olhar para os cocheiros, pedindo que aguardassem meus comandos para entrarem na casa. Eles assentiram.

Abri a porta da casa, e imediatamente, um aroma delicioso passou por meu nariz. Era o cheiro da comida de Bertha. Retirei as luvas e o casaco – que já não eram nescessários, considerando o clima quente –, prendendo-os no grampo, próximo á porta.

Dei mais alguns passos, o aroma tornando-se mais evidente e convidativo. Passei pela sala – que estava vazia –, depois pela sala de jantar – também vazia – e por fim, migrei até a cozinha.

Aceite meu coraçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora