Vinte e oito

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James

   Eram cerca de 16:00, quando a porta de meu aposento foi aberta, assustando-me com o estrondo.
A luz quase ausente do sol transcorria por entre a porta que dava acesso à sacada, fazendo com que o vento gélido atravessasse-a, vindo até mim.

  Levantei-me abruptamente da cama, vendo apenas o vislumbre de alguém: uma silhueta feminina. Então, aos poucos, à medida em que ia aproximando-me, seus detalhes foram ficando mais perceptíveis.

   A primeira coisa que notei foi o vislumbre de um vestido rosa-claro, seguido por pés extremamente delicados, calçados por sapatilhas que revelavam-se por entre o babado inferior do vestido; em seguida,  reparei um cabelo levemente dourado, com algumas mechas soltas, aparentando desleixo; e foi apenas aí, que foquei o olhar em seu rosto. Era um rosto belo, com enormes olhos acastanhados, cílios espessos, lábios estreitos e um nariz levemente arrebitado. Era o rosto com o qual sonhava todas as noites. Era ela: Victoria.

Esfreguei os olhos, ainda incrédulo por ela estar ali, diante de mim. Talvez fosse apenas uma peça aplicada por minha mente, devido à meus pensamentos excessivos à cerca dela. Mas não. Ela estava de fato, diante de mim.

Sua respiração estava ofegante, com seu peito subindo e descendo de maneira irregular. Voltei o olhar para seu rosto, haviam lágrimas em seus olhos.

   — Victoria, o que estás fazendo aqui...?

Ela deu um longo suspiro, dando mais alguns passos e aproximando-se de mim.

   — James eu sou uma boba.

Franzi a testa.

   — Sou completa e inteiramente tola, por não ter percebido antes, o erro tremendo que cometi, ao ir embora daqui.

Abri a boca para responder, mas ela ergueu uma das mãos, silenciando-me.

  — Não pude perceber antes o quanto amo você, James White. Perdoe-me por meu orgulho, por minhas ações impensadas e por não ser forte ou corajosa o suficiente para ter vindo aqui antes. Eu amo você, James. Com todo o meu coração, com cada pedacinho de meu ser. Por favor, peço que me aceite de volta. Não quero que o contrato seja desfeito, porque quero continuar aqui, com você. —, fez uma pausa, fitando-me no fundo dos olhos, com atenção. —, quero ser sua esposa, James.

Não pude conter o sorriso que surgiu em meus lábios, assim que ouvi suas palavras. Fui incapaz de proferir qualquer palavra, meu coração batendo desregulado contra o peito. A única coisa que fiz foi abrir os braços, tendo ciência de que as lágrimas já haviam deferido-se à meus olhos.

Victoria abriu um sorriso, e sem hesitar, veio correndo até meus braços.

   — Senti tanto a sua falta... — sussurrei ao pé de seu ouvido.

   — Tenho certeza de que não mais do que eu. — retrucou ela, apertando-me forte contra seu peito. Aquele era meu lugar preferido em todo o mundo: dentro de seu abraço.

Recuei um passo, apenas para poder visualizar melhor seu rosto. Toquei ambos os lados de seu rosto, depositando um beijo saudoso em seus lábios. Ela retribuiu avidamente o ato, com lágrimas serpenteando por entre seus olhos fechados.

De repente, meu peito apertou, com a recordação de nosso último beijo, onde havia acontecido exatamente a mesma coisa. Afastei o rosto do dela, causando-lhe confusão.
Olhei para suas lágrimas e sequei-as com os dedos.

   — Não quero nunca mais ser a causa de suas lágrimas.

Ela deu um sorriso, secando as lágrimas que ainda jaziam em seu rosto com a palma das mãos.

   — Não se preocupe, isto aqui — apontou para o próprio rosto —, é apenas um reflexo do que acontecerá se você me expulsar novamente de sua vida.

   — Eu não a expulsei.

Ela arqueou uma sobrancelha.

   — Ah, não?

   — Não. Ou esqueceu-se de que foi você que quis ir embora?

   — Eu não... — suspirou —, olhe só para nós! Estamos discutindo novamente!

Olhamos um para o outro, desatando-nos em gargalhadas, logo em seguida.

   — Olivia tem razão, creio que eu realmente tenha uma natureza um pouco...

   — Orgulhosa e presunçosa?

Ela fez cara feia, antes de assentir, constrangida.

Seus braços já iam enlaçar-me, quando seus olhos fitaram algum ponto fixo às minhas costas.
Segui seu olhar.
Seus olhos estavam fixos no local vazio onde costumava jazer o retrato de Elsa.

Parecendo hesitante, seu olhar voltou ao meu.

   — Você... retirou o retrato?

Assenti.

   — Porquê...? — perguntou ela, esbanjando insegurança.

Passei uma mecha de seu cabelo por detras de sua orelha.

   — Porque eu amo você, Victoria.

   —  Não há necessidade de...

   — Não, Victoria. Você estava certa. Elsa foi muito importante para mim e creio que ainda seja, mas não tanto quanto você. O fato de guardar todas aquelas coisas era... bizarro.

   — O que você fez com o retrato?

   — Mandei para Londres, onde os pais dela residem. Creio que gostarão do presente.

Ela assentiu.

    — Imagino que deve ter sido difícil para você, digo...desfazer-se do retrato.

    — Bem, sim... mas, há algo que consegui compreender ao retirá-lo daqui.

Ela piscou.

    — O quê?

    — Que você é mais importante do que qualquer coisa na minha vida. — acariciei seu rosto —, que você é meu  futuro.

Ela sorriu, recostando sua cabeça em meu peito. Alguns segundos sucederam-se conosco em silêncio, até que ela por fim, falou:

   — James?

   — Sim...?

   — Teremos de nos casar o mais rápido possível. Não creio que meu pai seja... a favor da cerimônia, depois que retornei para Hethersfild.

   — Porquê?

   — Digamos que ele pensa coisas horríveis à seu respeito.

Afastei-me de seu abraço, estreitando os olhos para a mulher que sorria de forma suspeita à minha frente.

   — O que foi que você fez...?

Ela deu de ombros.

   — Nada. — suspirou —, mas minha irmã caçula sim. Ela criou uma péssima imagem de você, já que você "me expulsou" de sua casa.

Suspirei.
Ótimo, agora tinha um sogro e uma cunhada à agradar.

   — Mas não se preocupe. — disse Victoria, num tom tranquilizador —, nada será capaz de nos separar novamente. Permanecerei até o fim de minha vida, à seu lado.

Sorri.

   — Até o fim.

   — Até o fim. — ela repetiu.

Nunca acreditei em destino. Para mim, nada acontecia porquê tinha de acontecer; mas ali, tendo aquela mulher á meu lado, depois de tudo o que passamos, pude perceber que talvez nossos destinos sempre estiveram entrelaçados.
Ela fora destinada à mim, assim como eu fui à ela.

Pertenciamos um ao outro, de alma e coração.

  

Aceite meu coraçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora