Capítulo 2

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Me olho no espelho, completamente em choque.

Meus cabelos castanhos acobreados – herança da minha genitora – caem soltos pelas minhas costas, lisos na parte de cima e cheios de ondulações embaixo. Graças à Maya e seu talento em fazer babyliss rápido, os fios finos e lambidos que ela disse precisarem de uma reforma para parecerem de luxo, se transformaram em ondas castanhas levemente alaranjadas.

Com algumas roupas que parecem, sentem e até mesmo cheiram caras, eu pareço uma pessoa completamente diferente. Não pensei que fosse verdade, mas no fim dinheiro realmente pode mudar a cara de uma pessoa – e no momento tudo que Maya colocou em mim são algumas maquiagens, roupas e sapatos caríssimos.

– Eu pareço... – Começo, me analisando.

– Rica. – Maya me olha pelo espelho e dá um sorriso. – Muito rica.

Engulo em seco. Não importa quantos milhões de reais eu usar em meu corpo, não sei se é o suficiente para manter essa imagem por muito tempo.

– Ei – Ela chama minha atenção, percebendo o nervosismo em meu rosto. – Lembre-se: as aulas só começam amanhã, então leve a palestra de hoje como um teste. Tente se acostumar na sua nova pele, ande de nariz empinado e finja que é tão rica quanto parece. Não deixe te descobrirem.

Eu engulo em seco. Não sei se ela conseguiu me acalmar muito bem...

– E acima de tudo: não chame atenção. – Termina ela. – Apesar de que agora isso vai ser difícil, você está bonita demais.

Solto uma risada, surpresa pelo elogio.

– Estou falando sério, Sienna. Você está linda e precisa estar preparada para lidar com uns demoniozinhos escrotos provocando você. Não dê bola e se faça de inalcançável porque, a partir de agora, você é.

Assinto com a cabeça, tentando me preparar psicologicamente para o início da minha jornada em Titanos.

– Mas agora temos que ir – Maya diz me puxando e indo para fora do quarto. – Estamos só... meia hora atrasadas.

•••

Não se passaram 10 minutos até eu me perder de Maya.

As aulas começam amanhã de manhã, e existem muito mais alunos do que eu imaginava residentes no Instituto. Me deparo com tanta gente que começo a ficar tonta.

De onde saíram todas essas pessoas ricas? Será que vivemos no mesmo mundo?

Assim que parei um segundo para admirar o colégio, Maya – que antes estava na minha frente –, já tinha desaparecido.

E agora depende de mim encontrar o auditório sozinha nesse labirinto de seres que parecem de outro planeta.

Começo a seguir as pessoas, mas cada uma parece ir para um lado diferente. E então, eu me encontro na frente da biblioteca de Titanos – simplesmente uma das mais tecnológicas bibliotecas do mundo.

Olho para os lados e mordo o lábio, ponderando. Já estou muito atrasada para a palestra, e talvez essa seja uma das únicas chances que eu tenha de ver essa biblioteca praticamente vazia.

Tudo bem, vou dar uma pequena olhada e depois finalmente tomo coragem e pergunto para alguém o caminho do auditório.

E definitivamente, não estou arrependida. Esse é simplesmente um dos lugares mais legais que já visitei. Ao invés de ter uma aparência antiga, se parece mais com uma construção futurística. Dois andares lotados de livros e com iPads em cada seção para conseguir localizá-los. Áreas de MacBooks, salas de estudo individuais com isolamento de som e também de estudo em grupo, todas com um painel para regular a luminosidade, temperatura, som...

Não parece real.

Me dirijo até o final dos corredores do primeiro andar, querendo conferir se estou deixando alguma última sala que não vi passar. Assim que chego na penúltima estante de livros, escuto o que parecem ser duas pessoas discutindo sem se importarem muito com o barulho.

Mesmo assim, eles parecem estar escondidos entre a última estante e a parede. Eu até cogito dar meia volta, mas, antes disso, algumas palavras prendem minha atenção:

– ... você é um filho da puta! – Fala uma voz feminina em um misto de choro e raiva. – Não tem vergonha de ser escroto desse jeito?

Pego um livro qualquer e coloco no meu rosto para fingir que sou uma parte da estante. Talvez se eu realmente acreditar que eu sou, no fim acabe parecendo e eles não percebam que estou ali escutando sua discussão.

Não sou fofoqueira, mas também não sou de ferro.

– Vergonha, meu amor? – Uma voz grossa e rouca masculina retruca. Não consigo vê-lo, mas alguma coisa em sua entonação me diz que ele está sorrindo. – Você sabia como eu era antes de vir atrás de mim. Sempre soube o que eu fazia com as garotas e provavelmente sabia que aconteceria o mesmo com você. E agora coloca a culpa em mim por estar decepcionada? – Sinto ele se debruçar sobre a estante, em cima da garota. – Acho que quem tem que sentir vergonha aqui não sou eu.

Uso toda força que tenho para não soltar um suspiro alto, completamente em choque.

– Como você pode... – A menina começa, e eu sinto que ela está prestes a explodir. – Você realmente...

Ele dá uma risada, caçoando da garota e agindo como se ela não passasse de uma criança fazendo birra.

– Escuta, meu bem. Eu já estou de saco cheio disso, mas vou dar um conselho pra você: – Não consigo vê-lo, mas sinto sua satisfação em tratá-la desse jeito. – Não culpe os outros pelas suas decisões de merda. Se ficou comigo foi porque você quis, eu não te obriguei a nada. Então poupe a nós dois e não venha para cima de mim com essas porras aí, agindo como uma vadia que não sabe arcar com as consequências dos próprios atos. É patético.

Um silêncio ensurdecedor se estende sobre todos os corredores de livros.

E então, subitamente ela começa a pegar os livros da estante em que estou apoiada – e usando como esconderijo da fofoca – e a atirá-los no garoto.

Eu começaria a rir se não tivesse me abaixado na velocidade da luz e não estivesse de cara no chão, morrendo de medo de ser descoberta. E agora eu não tenho como me levantar e muito menos como sair daqui sem ser vista. Que ótimo.

– Seu merda narcisista – Ela grita atirando outro livro. – Você acha que pode me tratar assim só porque...

Então, o garoto arranca mais um livro de sua mão e prende seus braços contra seu corpo.

– Sim, eu posso. – Ele fala quase em um sussurro, calmamente. – Quem não pode me tratar assim é você. Não importa quão boa você seja na cama, não vou deixar uma vadia que me agrediu ficar andando por esses corredores. Então pense bem se quiser me dizer mais alguma coisa, porque é a última que eu vou escutar vindo de você. 

Sinto o pior silêncio da minha vida dominar a biblioteca. A menina funga, mas desiste de qualquer outra coisa que estivesse pensando em fazer. Imediatamente ela se vira e sai correndo de cabeça baixa – chorando – e sequer me nota abaixada que nem uma idiota em prol da fofoca.

Solto um longo suspiro tenso, incrédula. Que porra foi essa? Não é possível que realmente existem pessoas no mundo tão desprezíveis assim como esse nojento. Se eu cruzar com esse desgraçado, eu juro por Deus que...

E, então, sinto uma sombra alta cobrir meu corpo estendido no chão.

– Perdeu alguma coisa, meu amor? – A mesma voz masculina que escutei segundos antes, agora fala comigo.

Puta que pariu.

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