O som da sua voz

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[Point Of View Win]

Papai, papai! Não podemos deixar ele aqui.

A voz chorosa do menino fez Win levantar a cabeça apoiada em seus braços que abraçava o próprio joelho, para fitar o adulto parado alguns metros de distância.

A família Metawin apareceu cedo para vê-lo naquele dia, diferente das outras vezes que vieram.

– Mick, nós vamos buscá-lo na semana que vem, mamãe e papai já te explicaram.

O tom amável do homem não condizia com sua aparência. Ele era alto e magro, usava óculos, alguns cabelos grisalhos e sobrancelhas grossas. Vestia terno todo preto, a gravata frouxa e suas mãos no bolso na calça observando os dois garotos de longe. O sol era escaldante e a camisa branca por debaixo do blazer estava ensopada.

– Mas papai... – a criança choramingou sentada no chão ao lado de Win encostados na parede de tijolos cheios de musgo.

Os dois estavam de mãos dadas e os dedinhos gordos de Mick apertavam os dedinhos sujos de Win.

– Papai, Win disse que estava com medo. Por favor, vamos levá-lo agora.

O homem os fitava com um olhar de pena e impaciência ao mesmo tempo. Ao fundo, a porta do BMW 320 se abriu e sapatos de salto alto voltaram a chamar a atenção de Win. O garoto limpou as lágrimas silenciosas que insistiam em correr pela bochecha para ver quando a mulher parou ao lado do marido, lançando um olhar de ternura em direção às crianças.

– Querido, obedeça ao papai, certo? Vamos para casa agora – Ela estendeu a mão e Win viu pelo canto do olho que Mick não se moveu um centímetro sequer.

– Nós iremos buscá-lo na semana que vem, Mick. A mamãe promete, você pode confiar em mim?

A voz doce soava tão verdadeira que a criança, que antes chorava, agora estava em silêncio olhando para Win.

– Você me promete, mamãe? Vamos poder levar Win pra casa na próxima vez?

– Sim, querido, prometo. Agora vamos, por favor? Papai está atrasado.

A mulher, que aparentava ter uns 30 anos, veio até os dois garotos e se agachou na frente deles. Seus dedos perfumados limparam o rostinho gorducho de Win, mantendo seus olhos   sobre ele por segundos até que suas mãos delicadas soltaram as dos dois garotos e ela pegou o filho no colo.

Win viu Mick acenando enquanto a mãe o levava e o pai dava um aceno para Win que voltou a chorar. Ele só queria ir para casa com seu novo irmão.

~

O celular vibra no criado mudo fazendo Win despertar confuso após o sonho que teve com a família. Sua mão procura pelo aparelho que insistentemente chama em cima do móvel. Sua outra mão limpa o suor que brotava em sua testa, dando uma rápida olhada no visor antes de leva-lo ao ouvido aceitando a chamada.

Snowball?

Win reconheceu a voz imediatamente e se virou para ficar de barriga pra cima.

– Mick Mouse?

A voz do outro lado suspirou e ele sabia que o irmão estava dando um meio sorriso ao escutar o apelido.

Feliz aniversário, Snowball – após a simples felicitação, Mick limpou a garganta com um pigarro e Win sorriu de lado.

– Obrigado.

Win não queria parecer estranho, nem assumir que sentia tanta falta do irmão, mas teria que perguntar.

Liberta-meOnde histórias criam vida. Descubra agora