012: O sabor do perdão

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Não posso negar, estou muito hesitante e ansiosa quando me aproximo de papai e ele ergue a cabeça para me encarar conforme chego perto e me sento do seu lado no banco, calada e temerosa. O peito quente e o coração batendo muito frenético dentro dele capaz de ser ouvido em meio a quietude da noite.

Nós dois não falamos nada um para o outro por longos minutos desconfortáveis. Compartilhamos o assento de madeira e encaramos o jardim iluminado por luzes de led subterrâneas, sob um céu pincelado de estrelas cintilantes.
Minhas mãos estão um pouco suadas embora a temperatura esteja baixa e favorável.
Eu as passo vezes seguidas pela calça de dormir antes de por fim virar um pouco o corpo e encarar o meu pai que mantinha a concentração nos astros brilhantes até estar me olhando de volta, olhos húmidos e semblante derrotado.

Papai é muito mais alto em relação a mim, mesmo sentado é possível notar a diferença em nossas alturas, tanto como o porte físico juvenil e atlético dele juntamente a sua postura que me fazem sentir, de alguma forma, muito pequena hoje, como também envergonhada por todas as vezes que fui desrespeitosa por acreditar ter motivos plausíveis para o ser.
Eu espremo os lábios e desvio o olhar tímido do dele antes de criar coragem e o fitar outra vez, disposta a ser a primeira a dar início a conversa. Mas hoje, neste instante, sem discussões, sem acusações, sem murmúrios.

Quero apenas ter o diálogo que por tantos anos nós vinhámos adiando.

— Eu... — começamos em simultâneo, o que torna todo o ambiente ainda mais tenso, desconfortável, estranho...

Papai pigareia e diz: — Comece você, Igith.

Eu nego com a cabeça e prefiro que seja ele a começar.

— Não, fale a vontade. — murmuro baixo, abaixando a cabeça e fitando os meus dedos se entrelaçarem sobre o colo.

— Eu insisto.

Então, eu assinto.

— Na verdade eu não tenho muito que dizer... Eu bom... tudo que poderia confessar eu falei naquela noite. — minha voz é um completo sussurro entrecortado pelo choro contido na garganta a medida que falo e fungo. — E, sinto muito... Mesmo. Não devia ter agido assim.

Pelo canto do olho eu vejo as mãos dele apertando levemente os joelhos sobre a calça folgada que está usando, depois, ergo o olhar e percebo ele balançar a cabeça em negação num movimento metódico.

— Não sinta, Igith — exprime ele, e depois me encara. — Já era hora de acabar com isso. Com essas barreiras, com a forma errada que temos vivido por culpa de erros nossos. Eu não imagino, nem faço ideia de como foi difícil para você guardar esses segredos horríveis, muito menos tenho noção do quão doloroso foi para ti levantar esse tapete onde sempre botávamos as nossas sujeiras.

Então, papai suspira lentamente e eu também, porque é a partir desse momento que tudo vem sobre mim como um grande balde de água fria.

— Há muita coisa que nós, como família, devíamos ter nos reunido para conversar. Falar abertamente sobre e nos resolveremos antes de tudo para evitar o infortúnio da noite de sexta, principalmente acerca das coisas que disse para a sua mãe. — Ele não está mais me encarando, sua atenção está vidrada nas pétalas rubras caídas no chão, das flores da acácia cobrindo nossas cabeças. — Talvez você não saiba, nem tenha se apercebido sobre o quanto foi injusta com ela naquele dia e não culpo você por isso, parte dessa situação é culpa nossa por nunca ter contado para vocês a situação que ela passa, Igith.

Eu aperto os olhos já percorridos pela ardência que antecede as lágrimas presas neles, somente a espera da continuação do mais velho.

— A mãe de vocês sofre de distimia faz muitos anos. Esse é o grande motivo que a levava a machucar a si mesma. O meu erro de anos atrás foi mais um fator que me martiriza a cada dia, pois foi ele que alterou ainda mais o quadro de sua depressão.

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