Capítulo13

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Saíram pelos fundos novamente e novamente encontraram o policial no estacionamento. Parecia que ele mantinha-se atento a qualquer movimento de Jéssica. Certamente fora enviado pelo delegado para ver se iriam encontrar-se com alguém suspeito. Acharam melhor fingir que não o viram.

Como sempre, Ricardo dirigiu. Em menos de vinte minutos estavam a uma quadra da casa paroquial, onde um pequeno quarto fora gentilmente cedido a Victor. A porta estava entreaberta, mas não havia ninguém para recebê-los. Ricardo sugeriu que voltassem mais tarde, mas Jéssica lhe garantiu que não tinham muito tempo.

Estava escuro na saleta de recepção e as sombras projetadas nas paredes brancas pareciam espectros sobre os crucifixos e cruzes pendurados em todos os lados. Pesadas cortinas de veludo cor-de-vinho cobriam a janela frontal. Na lateral direita, bem ao lado da imagem de São Jorge esmagando a cabeça do dragão, estendia-se uma circulação larga, na qual se podiam observar muitas portas em ambas as laterais. Entraram bem devagar, temendo desconcentrar alguém que estivesse orando, ou meditando.

Jéssica tremia. Aquele lugar lhe causara uma péssima impressão. Era igual a um cenário de filme de horror. Logo depararam com uma imagem do Sol, pregada em uma das portas. Não do sol como o conhecemos, mas uma antiga imagem do deus Sol maia. Logo, deduziram que se tratava do dormitório de Victor.

Ricardo entrou na frente e ela o seguiu. O mesmo ar fantasmagórico pairava pelo ar dali também. As cortinas desta vez eram verde-musgo, mas estavam semiabertas, deixando passar um fraco raio de sol pela pequena abertura. Coincidentemente, a luz refletia diretamente no peito de Victor, em uma foto posta em cima da escrivaninha. Um gelo súbito percorreu todo o corpo de Ricardo ao vê-la. Parecia um presságio.

 — Jéssica, veja isso. O que acha que significa? — perguntou ele apontando para a imagem retorcida da cabeça de um homem com o crânio alongado, que jazia em cima do criado-mudo de Victor.

— Eu não sei, mas parece o crânio de algum animal, você não acha? Seria um macaco?

— Não acho que seja o crânio de um macaco. De qualquer forma, está entre uma imagem de São Jorge e uma de Nossa Senhora Aparecida. Parece que ele a colocou ali para que os dois santos pudessem deter a criatura. Um dragão? — perguntou Ricardo, obviamente brincando.

— Não seja tolo. Isso aqui é muito sério, não dá tempo pra suas gracinhas.

— Desculpe — retratou-se. Jéssica adentrou até o fundo do dormitório, onde um espaço obsoleto ao lado da parede a fizera lembrar-se de uma passagem secreta em um dos filmes de aventura a que assistira. Aproximou-se e viu que várias prateleiras haviam sido pregadas na lateral, recheadas de livros de história e livros sagrados das mais diversas religiões. Havia muitas bíblias também, impressas em várias línguas diferentes.

— Victor é um homem muito culto — observou ela. Ricardo apenas consentiu com a cabeça. Retirou um dos livros da estante e abriu em uma página marcada. Figuras horríveis de rituais com sacrifícios humanos e cenas de batalha, aparentemente de alguma tribo indígena.

— O que está escrito? — perguntou ele. O livro estava escrito em espanhol e nem Jéssica pôde entender o que as páginas diziam exatamente. Parecia um volume bastante antigo, como a maioria deles. Folhearam mais algumas páginas, amedrontados pelo que viam, quando de repente ouviram passos no corredor.

— Feche a porta! — sussurrou ela para Ricardo. Ele a encostou suavemente, sem fazer ruído algum. Espremeram-se no canto, próximos às prateleiras e permaneceram em silêncio, tentando conter até a respiração. Os passos se aproximavam cada vez mais. Ricardo estava em pânico, pronto para sair correndo dali a qualquer momento. Ouviam as vozes de dois homens conversando enquanto chegavam cada vez mais perto.

— Eu sei, sempre achei que isso acabaria se tornando perigoso demais. Eu avisei a ele, mas nunca me deu ouvidos — disse um dos homens. — Mas eu concordo que não podemos nos manter passivos diante de uma situação como esta. É responsabilidade de todos nós, como clérigos, como seres humanos.

— Sim, você tem razão. Fomos tolos em pensar que ele poderia resolver tudo isso sozinho. Agora que as provas se tornaram evidentes, a descoberta terá ênfase real junto ao Vaticano. Não correremos mais o risco de sermos considerados loucos ou hereges. — Os passos cessaram. Os dois estavam agora bem em frente à porta do quarto de Victor. O coração de Jéssica parecia querer sair pela boca a qualquer momento.

— Vou telefonar para o bispo ainda hoje. Ele terá de nos dar um voto de confiança. Vamos recolher o material depois das seis, quando a casa paroquial já tiver terminado as atividades diárias para não atrair atenções desnecessárias.

— Espero você às sete, então?

— Sim, às sete está ótimo. Não se esqueça de levar o que lhe pedi. Sei que foi muito difícil de conseguir e é de suma importância para nós agora. Temo que o futuro da nossa Igreja esteja dependendo de nós dois, agora que já cuidamos de Victor. Vamos ter de encontrar os endereços e cancelar todas as reuniões em El Salvador. Só assim terminaremos com essa sandice.

— Eu me encarregarei dessa parte. Aliás, já mandei publicar na Internet as novas datas para as profecias. Isso fará com que apenas os tolos a levem a sério, principalmente aqui no Brasil. Ninguém jamais acreditou nos boatos que circulam na rede, não vai ser diferente desta vez. Tudo será atribuído a mais uma enquete sensacionalista, apenas isso.

— Mas, se acreditarem? Você tem certeza de que a divulgação que mandou fazer não causará pânico em massa?

— É claro que tenho! Coloquei a notícia em sites “não confiáveis”, o que certamente garantirá que nenhuma instituição séria se interesse pelo assunto. As profecias foram consideradas fraudulentas, como a maioria das notícias que vazam pela rede. Nada será diferente desta vez. E o melhor de tudo isso é que o nome da nossa Igreja nem ao menos será mencionado. Estamos imunes a qualquer tipo de ligação com esse caso.

— Muito obrigado. Você está sendo uma peça-chave para nós. Garanto que saberemos recompensar os seus esforços. Nossa congregação é forte, a mais forte que existiu. Desde sempre nós conseguimos o poder absoluto, livramo-nos dos oponentes que tentaram nos destruir. Continuamos vivos! Ainda estamos no poder, embora muitos não acreditem.

— Mas os que tentam nos destruir estão se fortalecendo. Vamos acabar logo com essa sandice — respondeu o segundo homem.

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