Sogni

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A tarde passou depressa e quando me vi ao lado da janela já estava prestes a anoitecer.
Pauline me levou em casa e insistiu que deveríamos refazer nossa viagem de verão, decidiu que seria nostálgico o suficiente para ser revivido depois de tanto tempo.
Eu tomei o banho mais demorado da minha vida aquela noite, eu queria lavar de mim toda a angustia e o medo, eu sabia o quão artificial tudo aquilo estava se tornando mas parecia tão inevitável para mim.
Meu reflexo parecia apenas a sombra da garota que um dia fui. Eu carregava comigo, visivelmente, além do cansaço, olheiras profundas, lábios cortados e lágrimas que jamais escorreram pelo meu rosto.
Chorar para mim sempre foi o ápice de tudo, eu simplesmente não conseguirá, nunca havia chegado ao profundo de mim mesma a ponto de ter pena do que via e isso foi frustrante. Como se um nó estivesse preso em mim garganta, impossibilitado de ser removido com facilidade e o difícil pra mim sempre foi tão distante.
A grande verdade era que eu não sabia conviver comigo porque eu simplesmente não sabia quem eu era.
Aquela noite, também, eu não dormi, me sentia cansada mas vazia de sono, eu não tinha disposição mas meus olhos permaneceram abertos até o dia amanhecer.
Coloquei um roupão e desci para a cozinha, talvez um café ajudasse a afastar o sentimento de não ter dormido que mais parece uma surra do invisível que impregna seu corpo.
- bom dia - Constantine sorria, ela sempre sorria, eu nunca vi alguém sorrir tanto.
- bom dia querida - beijei sua testa.
- como foi na casa dos Chalamet's?
Meu pensamento se esvaiu de mim e foi recordando o que eu lutei pra não reparar porque geralmente quando reparamos em algo ele se torna presente e isso era a última coisa que eu queria naquele momento. A última coisa que eu queria era o rosto de timothée assombrando minhas imaginações quando eu deveria me lembrar apenas de como foi bom rever Pauline mas era como se só estivéssemos eu e ele lá, naquela casa, naquela cozinha, nos observando.
- foi tudo bem - falei tentando me auto-sabotar.
- eu tenho uns exames pra fazer está semana e terei que me ausentar, tudo bem pra você?
- claro Constantine, você está fazendo um favor em me ajudar esses dias, nada mais justo.
- você vai ficar bem?
- é claro, eu sei me virar, prometo.
- ainda é difícil para mim aceitar como cresceu - ela falou rindo com seus pensamentos - num instante vejo você e Pauline correndo escada baixo fantasiadas de alguma coisa e no outro uma mulher.
- as vezes parece que eu nunca estive aqui... tudo aconteceu tão rápido.
- a infância sempre parece um piscar de olhos quando estamos mais velhos, é como um sonho e a gente tenta reviver aquilo de tantas maneiras... o processo de se tornar adulto é muito delicado, você corta o cordão da inocência e se depara com o lado sombrio da vida, das responsabilidades e deveres.
- as vezes me sinto frustrada, como se eu não tivesse aproveitado o suficiente.
- talvez o seu presente não supra todas as emoções vividas e isso te deixe assim, se permita viver coisas diferentes, mesmo que erradas!
- Constantine!
- acho que tudo vale quando se trata dos sentimentos que extraímos de tudo e nos beneficia... pense nisso, okay?
- obrigada - ela beijou o topo da minha cabeça.
- preciso ir, volto em alguns dias mas se precisar sabe onde me encontrar.
Assenti com a cabeça enquanto ela pôs seu casaco fofinho.
Eu estava sozinha. De novo.
Me sentei naquele sofá exageradamente grande e fitei aquele teto de madeira que parecia ser polido todos os dias.
_A campainha tocou e eu me arrastei até aquela porta, certamente assim que a abri minha cara foi de espanto e eu devo ter ficado assustadoramente estranha mas ele estava lá e qualquer outra expressão não se corresponderia ao que eu realmente estava sentindo.
- oi? - falei fazendo alguma careta.
- me desculpe vir sem avisar, não que eu tivesse como avisar mas eu precisava falar com você.
- em que posso ajudar?
- é um tanto logo, te aconselho a me convidar a entrar! - ele sorriu e um suspiro veio do fundo da minha alma naquele instante e eu soltei alguma palavra que o fez passar por mim e se sentar próximo a lareira, com as pernas cruzadas, enquanto me encarava animado.
- quer algo pra beber?
- whisky seria bom para mim
- whisky - repeti a palavra e nos servi uma dose - em que posso ser útil?
- eu só tive curiosidade na verdade, o que você faz aqui depois de tanto tempo coincidentemente na mesma época que Pauline?
- na verdade foi pura coincidência.
- como... - ele suspirou - como era os verões com eles?
- eram como qualquer outro verão em qualquer outro lugar do mundo...
- eu adoraria que fosse mais específica, passei todos os verões que me lembro estudando então isso é realmente importante para mim.
- eram quentes? - timothée riu mas não como se tivesse graça mas como se ele estivesse se esforçando para ter - nós nos reuniamos, as famílias no caso, fazíamos coisas que famílias com crianças fazem...
- você passou mais tempo com minha família do que eu mesmo e agora eu tenho que tentar conhece-los através de outra pessoa - ele se levantou caminhando em direção a porta, talvez percebendo o quão patético estava sendo.
- espera, eu tenho uma ideia. - eu quis ajuda-lo e eu nunca saberei o porque.
Coloquei meu casaco e o direcionei para o carro. Paramos na praça onde tudo costumava acontecer e Timothée parecia perdido, como diabos ela me mostraria o verão com tanta neve? certamente foi o que passou pela sua cabeça.
- sente-se e feche os olhos.
- ótimo, vamos nos fingir de cegos alimentando pombos que não existem.
- em silêncio - ele tentou rir mas seguiu meu conselho, dessa vez pude ver tão de perto todos os teus detalhes que quase era impossível não parar a cada palavra que saia da minha boca - imagine vozes masculas falando sobre negócios, empreendedorismo, crianças gritando enquanto seus pés percorrem toda a grama verde e recém cortada, mulheres discutem qual vitamina ajuda mais no desenvolvimento das crianças e em como a prevenção ao câncer de mama é importante... a uma distância considerável, um senhor vende pipoca doce, longe o suficiente para se alcançar e perto o suficiente para que o cheiro doce se faça presente em seu nariz e no meio de tudo isso pássaros cantam suas canções sob as árvores envolta, tudo está em harmonia, em seu devido lugar. naturalmente.
- nem se eu tentasse por mil vezes saberia o que estás palavras representam.
- seja otimista, você ainda tem muitos anos pra ter essas... coisas?
- me sinto, de alguma forma, ligado a você. - ele parecia perdido, fugindo de alguma coisa mas sempre que nossos olhos se encontravam ele sorria, ou tentava sorrir.
Eu não tinha palavras, eu nunca tinha palavras então acendi um cigarro, esperando que ele dissesse algo que estava ao meu alcance de responder mas ele não falou mais nada, as vezes agradeço por isso.
Me levantei daquele banco que já havia se acostumado com a temperatura do meu corpo e caminhei para longe dele, longe do gosto da sua presença_

Acordei num susto, a porta estava sendo nocauteada pelo barulho que ecoou, eu estava jogada naquele sofá solitário. Foi a primeira vez que meus pensamentos se fizeram fisicamente e o trouxeram para perto de mim. Foi quando eu deveria ter evitado tudo mas em vez disso eu corri para a porta, cheia de esperanças e inseguranças.

- oi

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