Inside

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Eu não sabia como havia chegado na torre de Astronomia, e nem se a minha presença era autorizada lá. Mas eu não liguei. O vento era gelado e cortante, como se pequenas agulhas perfurassem minha pele. As lágrimas que ainda corriam estavam cada vez mais frias, e não havia nenhum som ali. Era, de certa forma, tranquilizante. A dor leve que o frio causava dividia o fardo com a notícia que eu havia recebido, e mesmo imersa nos meus pensamentos eu tinha alguns segundos de distração quando uma brisa cortava mais que o normal.

Mas mesmo com o silêncio de lá, nada falava mais alto que o vazio quê eu sentia, e eu conseguia ouvir a voz doce da minha mãe ecoando, longe demais para que eu pudesse alcançar.

"Te vejo no natal".

E eu não a veria. Não conseguia imaginar um único motivo para que alguém fizesse isso. Eu só queria vir para uma escola, aprender mais sobre mim e fazer amigos verdadeiros. Passar meses estudando e então me aconchegar com uma caneca de chocolate quente ao lado da minha mãe no recesso, ou até mesmo nossa tradição de nos arrumarmos juntas para o Baile de Natal de Oxford. Mas agora todas essas coisas eram inalcançáveis, e eu já conseguia imaginar um natal tão frio e solitário quanto eu me sentia.

E o mais angustiante era saber que foi um ato deliberado para me atingir. Afinal, meus pais estavam ilesos e vivendo suas vidas normalmente, enquanto eu estava em uma torre chorando pelo luto de dois pais vivos. Eu estava aliviada por eles estarem bem, e seguros. Mas eu não era altruísta o suficiente para não sofrer a falta deles. No fim do dia, eu ainda era uma menininha que esperava voltar para casa. Mas agora eu não tinha uma. Novamente.

Perdi a noção de tempo enquanto estava lá, até que as lágrimas secassem e o nó na garganta fosse desfeito. Depois do choque inicial, o quê havia restado era apenas um vazio, que parecia me consumir aos poucos. Decidi ir para o meu quarto, já que os alunos provavelmente estavam voltando para suas comunais e eu não tinha fome. Andei pelos corredores e todas as conversas ao meu redor pareciam distantes.

Eu vi Fred e George rindo de uma peça que pregaram em um terceiranista que agora estava cheio de furúnculos. E eles acenaram para mim, mas me senti incapaz de retribuir com o mesmo entusiasmo. Sam e Hannah estavam sentadas juntas e conversando, para a minha surpresa, mas nem isso conseguiu me animar. Chegando perto das masmorras, eu distraidamente esbarrei em alguém. E era Malfoy.

- Olha por onde anda, Walton.

Apenas peguei seu livro do chão e o entreguei, murmurando um pedido de desculpas ao qual ele reagiu com um olhar preocupado e segui em frente. Eu não tinha energia para mais nada, muito menos para brigas. Cheguei no quarto, e felizmente Charlie estava dormindo, assim eu não teria que responder suas preocupações. Mas para minha surpresa, Pansy reparou nos olhos avermelhados.

- Walton...

- Hoje não. - foi tudo o quê consegui dizer, antes de deitar na cama ainda de uniforme e fechar os olhos.

Não demorei a ser embalada pelo sono, e por algumas horas escuras eu pude esquecer de tudo.

(...)

Acordei antes do amanhecer, e tive um breve e tranquilo instante de alienação. Mas depois os acontecimentos da noite anterior voltaram, e eu me sentei na cama. O pequeno relógio na cabeceira mostrava que ainda eram quatro horas da manhã, mas eu saberia que não conseguiria adormecer de novo. Meus olhos ardiam e nem precisei de um espelho para saber que estavam inchados. Fiquei por uns momentos na cama e observei as minhas colegas de quarto dormindo. E céus, como eu senti inveja.

Levantei lentamente, e andei para o banheiro. Tinha tempo o suficiente antes delas acordarem, então enchi a banheira e deitei nela. A água quente não pareceu me aquecer nem um pouco. Desci na banheira até que meu queixo estivesse tocando a água, mas ainda estava tremendo. Eu estava tentando ser positiva, afinal eles não estavam mortos. Mas eu estava sozinha. Eu era apenas uma estranha para os meus próprios pais, para as pessoas que me acolheram e amaram. Quando eu os olhasse, seria capaz de enxergar nossas memórias juntos. Mas eles veriam apenas uma desconhecida em mim. Não tinha mais família ou casa. E ninguém... ninguém sentiria falta.

Sonserina: Born to Die (Completa)Onde histórias criam vida. Descubra agora