Small Shadow

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14/02/2004

  Meu tio me contou sobre vocês, e somente graças a ele sou capaz de enviar esta carta em minhas condições. Sou grato por ele me ouvir, ao contrário de meus pais. Talvez vocês não acreditem em mim por eu ser uma criança, mas eu juro por tudo que me representa que nada nesta carta é mentira.

  No momento, eu estou hospitalizado. Depois de uma queda na pista de skate terminei com a perna fraturada, e com o fim do tumulto que meus pais criaram, os médicos me internaram como esperado. Inicialmente tudo corria bem. Meus pais me visitavam de vez em quando, assim como alguns colegas, mas quase sempre quem ficava comigo era meu tio. São dias monótonos e bem entediantes, sendo meu único passatempo olhar pela janela de meu quarto.

Foi então que as coisas se tornaram estranhas.

  Pouco a pouco comecei a sentir a presença de algo. Já teve a sensação de que alguém está te observando? Que tem alguém vendo tudo que você faz? Eu sentia isso, e toda paz me foi tomada lentamente. As enfermeiras apenas achavam que eu estava piorando, então passei a fingir que não havia nada de errado comigo.

  Depois, veio a sombra. Volta e meia, eu acreditava ver algo no canto de meus olhos. Sabe quando você vê algo de relance? Mas quando você olha, não tem mais nada lá. Isso se repetiu muitas vezes, cada vez mais me dando alguma certeza de que havia alguém no meu quarto, uma pequena sombra que habitava o canto de meus olhos, me observando, brincando comigo.

  A este ponto, eu não aguentei mais e comecei a contar para meus familiares o que sentia. Meus pais apenas concordavam de forma aleatória, e depois cochichavam longe de mim. Deviam achar que eu estava louco, e se eu continuasse com isso, nunca sairia desta cama de hospital.

  Felizmente meu último recurso, meu tio, me deu ouvidos. Ele também não acreditava, mas pelo menos me ouvia e tentava entender o que estava acontecendo. Passei horas descrevendo a meu tio sobre minhas experiencias, e foram tantos detalhes que ele teve de dar o braço a torcer e me levar mais a sério.

  Mas foi em uma certa noite que meu verdadeiro sofrimento teve inicio. Já devia ter passado da meia-noite e meu sono não aparecia de jeito nenhum. Sem conseguir dormir, me limitei a apenas olhar pela janela, um belo céu estrelado cobria a noite, com os altos prédios tentando alcançá-lo. Mas, no canto de meus olhos surgiu uma pequena sombra, um vulto. O mesmo que já me atormentava nos pesadelos. Aquilo já havia acontecido muitas vezes, mas ainda me assustava. Com um pouco de coragem, eu olhei para a sombra...

Mas desta vez, ele não foi em bora.

  Parado ali, dentro do quarto, estava uma criatura. Tinha forma humana, como um homem esguio, sem roupa, com a pele cinzenta e cheia de feridas. Ele não tinha rosto, mas parecia olhar pra mim atentamente, me estudando, como se pudesse ver minha alma.

  Pensei em sair correndo, mas minha perna ainda doía e ele iria me pegar desse jeito. Com o corpo todo tremendo, me escondi debaixo das cobertas e comecei a rezar por minha vida. Meus olhos ficaram fechados por muito tempo, com medo dele aparecer.

  Esta foi a pior noite de minha vida, e pareceu durar mais que todas as outras. Quando enfim amanheceu, o monstro não estava mais lá e isto me encheu de tranquilidade. Mesmo que uma certa paranoia ainda me persiga.

  Vocês devem pensar que tudo terminou bem. No entanto, naquela manhã, meu tio chegou com uma notícia ainda mais bizarra.

Todos os pacientes do hospital morreram naquela noite... menos eu.

  Esta carta não é um pedido de ajuda, não é apenas um relato. Esta carta é um aviso. Tomem cuidado com a sombra que espreita no canto dos olhos.

Oliver Juscyne

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