Observador

39 9 10
                                    

   Já faz alguns dias desde que percebi, foi por acaso, mas logo tomei conhecimento de sua presença à minha espreita. Todas as noites ele vinha me visitar, esperando no beco atrás de minha casa, encarando a janela de meu quarto. Pela fresta da cortina eu lhe observava, trajava um terno e um chapéu negro, mas... Não conseguia ver seu rosto.

  Quem eu sou não é importante, um mero assalariado qualquer não merece menção aqui, apenas meu fascínio por aquela coisa importa. Por que escrevo para você? Eu já vi um de vocês, eu sei que é real. Então somente você pode dar um fim nele, pois não vou durar muito e tenho consciência disso.

  Quando uma criatura estranha fica te observando toda noite, você começa a temer por sua vida, não é mesmo? Mas, eu não mereço muito. Lembro bem dos gritos de minha mãe, nas garras daquele outro monstro... Por que Deus nos colocou em um mundo tão maldito? 

  Não importa.

  Já pensei em saudar meu visitante sob a lua, mas quando desço a escadas e olho através da porta, ele desaparece. Um ser que deseja observar, não ser encontrado. Até onde será que ele consegue ver?

  Noite após noite, sua figura me irritava. Ele não tinha sombra, ele era a sombra. Seu rosto, o que escondia? Seria ele mera loucura minha? Oh sim, as pessoas adoram essas respostas convenientes. No entanto, nós dois sabemos que não é assim...

  Na sétima semana, eu me entediei. Deitei em minha cama e tapei os ouvidos, o som de alarmes de carro disparavam sem parar, tentando esquecer aquela coisa. Seu olhar ainda devia estar ali, era irritante, agoniante, queria que ele sumisse.

  Hoje é a oitava semana. Cobri meu corpo com um pano negro, e esta sensação foi embora num passe de mágica... Mas ele não gostou.

  Em segundos, numa falha da luz de meu quarto, ele apareceu diante de mim. Olhos brancos e arregalados, com veias vermelhas pulsantes transbordando sangue. Ele me observa. Ele me observa. Ele me observa... Ele ainda está aqui... Me olhando, freneticamente, sem piscar, com sangue escorrendo por seu rosto vazio.

  Ele ainda está aqui... Observando meu coração bater, meus ossos ranger, meus órgãos se mexer, meu medo se alastrar... Eu continuo a escrever, até quando vou poder...

  Por favor pare... Pare de me olhar.

Relatos MalditosOnde histórias criam vida. Descubra agora