A Maldição do Boto - Parte 1

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O que estou prestes a contar é a verdade, a mais pura das verdades.
Hoje em dia vivemos cercados de céticos e desacreditados, eu mesmo já fui um deles.
Tudo o que estou prestes a relatar aconteceu, e aconteceu comigo...

Talvez eu não sobreviva até amanhã, serei transferido para uma prisão de segurança máxima, que fica a muitos quilômetros de distância daqui.
Duvido que irão me perdoar quando souberem o que fiz.

Acreditar na minha história é uma questão pessoal e quase todos que acreditaram estão agora mortos.
Morrer será uma dádiva, é mais do que mereço, mais do que anseio.
Não aguento viver carregando tanta dor e culpa, mas eu fui enganado.

Deixo aqui esse registro para os crentes e os descrentes, que analisem a minha história de forma parcial, e assim possam julgar se acreditam ou não em minhas palavras.
A vocês leitores, aos parentes e amigos próximos eu deixo a seguinte mensagem: Nunca matem um boto.

Tudo começou numa tarde de Junho, o inverno se aproximava, assim como o São João e como de costume, estava me preparando com meu primo Bruno para mais um dia de pesca.
Estávamos na mesma casa por um tempo, pois minha noiva Raquel viajou com seus pais para visitar uma tia no estado do Pará.
Não gostavam muito de mim, os pais dela. Achavam-me um sem futuro para sua filha.
(E não estavam errados)
Apesar de ter Raquel ter insistido, eu preferi ficar, mas além de qualquer coisa, era família, e eu gostava que ela passasse tempo com eles.

Raquel era enfermeira, uma das boas!
Amava cuidar dos necessitados e tratar de suas feridas e doenças, sempre cuidou muito bem de mim, da melhor forma! Não sei como pôde me aguentar, eu com tantas falhas , tantas faltas...
Espero que um dia ela (e eu também) possa me perdoar...

Nunca fui apreciador da solidão, por isso chamei Bruno para fazer-me companhia, éramos como irmãos.
Fomos criados juntos e a família era quase toda de pescadores; meu pai, meu tio e o nosso avô também viviam das águas do rio Amazonas e nos ensinaram a arte da pesca desde que éramos crianças.
De lá tirávamos nosso sustento a partir do que conseguíamos trazer para casa.
Geralmente trazíamos diversos peixes, a pesca era uma boa fonte de renda para nós, dava pra sobreviver...

Meu pai, assim como o meu tio, pai de Bruno já haviam partido, da família só restavam eu, meu primo-irmão Bruno e minha irmã Lenita.
Almoçamos um belo ensopado que ela havia preparado na noite anterior. As redes, varas e arpões haviam sido preparados na noite anterior, apanhamos e partimos para mais um dia de trabalho.

Morávamos numa comunidade ribeirinha, então levava menos de dez minutos para chegarmos até às margens do rio, onde nosso pequeno barco de pesca estava atracado, junto a alguns outros.
Mal trocamos palavras até estarmos já fundo, nenhum de nós ficava bem humorado pela manhã.

Preparamos a rede após termos posicionado as duas varas próximas às duas extremidades do barco.

Jogamos a rede e a primeira puxada nos trouxe uma grande quantidade de jacundás de quase todos os tamanhos, a maioria grande.
Devolvemos os pequenos para que pudessem crescer e colocamos os grandes em compartimentos espalhados pelo lado de fora do barco, armadilhas feitas para mantermos os peixes vivos, quanto mais frescos estivessem antes de morrer, melhor.

Na segunda vez vieram menos, a maioria peixes pequenos e alguns tucunarés.
Foi quando íamos jogar a rede pela terceira vez que algo bateu em nosso barco quase virando-o, fazendo com que eu caísse no rio, junto com as duas varas.

Como as águas de lá são muito turvas, é quase impossível se ver algo, subi rapidamente no barco com ajuda de meu primo, apanhamos as varas do rio e preparamos os arpões, que por sorte não tinham caído.
Poderia ser algum jacaré e pior ainda se fosse um açú.

Curtas Histórias Macabras Vol. 1Onde histórias criam vida. Descubra agora