O Negrinho do Pastoreio

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Você já ouviu a história do negrinho do pastoreio? Trata-se de uma lenda bastante famosa do folclore brasileiro.
Se a sua resposta for sim, esqueça tudo o que você ouviu.
Se a sua resposta for não, perfeito! Assim você poderá conhecer a verdadeira versão da história, não a que foi amolecida e fantasiada pela igreja católica.

O meu nome é Daniel Torres, por muitos anos dediquei a minha vida como historiador e arqueólogo. Minhas viagens ao continente Africano foram de grande esclarecimento, pois entre estudos e conversas acabei deparando-me com certos documentos e topando em uma certa história que eu jurava já ter ouvido antes.

Nossa história começa na região sudoeste da Nigéria, no século XVI.
Como é sabido por todos, nessa época muitos povos — principalmente os advindos das regiões Iorubá — eram trazidos à força, arrancados de sua pátria e de seus entes queridos para serem escravizados no Brasil, onde essa era uma prática legal e além de tudo, apoiada e incentivada.

O que muitos não sabem é que os próprios povos vizinhos, irmãos de raça, escravizavam a si mesmos muito antes de começarem a vender escravos para outras sociedades.

Em alguns casos, traficantes de escravos europeus conseguiam dominar as pessoas na África a partir do ataque a povos do litoral e através dos contatos com reinos africanos, que passaram a ver grandes vantagens no novo contexto comercial, que se mostrava cada vez mais promissor. Devem ter descoberto que com aquele mercado faturaram muito, principalmente os reinos mais poderosos, que por sua vez, escravizavam os mais fracos.

Nesse contexto, deu-se início a grande Diáspora Africana, onde milhões de pessoas foram trazidas para Américas navios negreiros como escravos, metade morria de fome, doenças e maus-tratos e quando chegavam em terras capixabas, muitos morriam pelo banzo, uma melancolia provocada pelo afastamento da terra natal.
Todos eles foram submetidos a um duro regime de trabalho onde não ganhavam nada em troca, além de dor e sofrimento.

Os Iorubá, que viviam principalmente na região do Golfo de Guiné, que hoje faz parte de comunidades importantes em países como Nigéria, Benin, Togo, Serra Leoa, entre outros, eram povos que tinham algo em comum: sua religião politeísta, sua devoção e adoração aos orixás, seus deuses, que eram mais — ou menos — importantes dependendo da região em que se vivia.

Ao leste de onde hoje é a Nigéria, numa zona florestal, havia uma pequena aldeia indígena de agricultores e pastores, onde viviam apenas pessoas ligadas por laços de parentesco.
A orixá que os regia era Euá*, a deusa das fontes, mãe dos Ibejis, orixás gêmeos, protetores das crianças e dos andarilhos.

É aqui que se inicia essa história.

* Reza a lenda que certo dia, Euá levou seus filhos para buscar lenha no meio do bosque e não conseguia encontrar o caminho de volta. Implorou ao Deus Supremo Olorum que os ajudasse e não permitisse que seus filhos morressem de sede. Então Olorum transformou as mãos e braços de Euá numa fonte d'água, que aos poucos deu origem a um rio. Com isso, os gêmeos puderam matar a sede e conseguiram voltar à aldeia, onde contaram a história da mãe-fonte.*

Muitos eram os cultos de adoração a esta orixá e seus filhos, a maioria deles ocorria num bosque que eles consideravam como sagrado, as cerimônias eram regidas por Nialá, líder do grupo. Havia rituais coletivos, sacrifícios de animais e muitas festas, os orixás costumavam aparecer para eles ou incorporar em seus sacerdotes, todos eles coexistiam em harmonia.
Era da natureza deles serem agricultores, pastores e sobreviver da natureza, que eles também adoravam e conheciam como Onilé.
A terra era considerada um bem coletivo e o líder passava aos chefes de família um terreno para cultivo, daí se tirava o necessário para sobrevivência.
Por isso, era interessante para os homens ter mais de uma mulher e muitos filhos para trabalhar.

Curtas Histórias Macabras Vol. 1Onde histórias criam vida. Descubra agora