CAPÍTULO DEZ

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CAPÍTULO DEZ

ANO: 2050

Luanda: 13:00

Quarta-Feira

Micael Tchilomba

– É possível falar com o senhor Micael? – Perguntou a voz do outro lado do telefone.

– Falas com ele. – Respondi.

– O governador de Luanda foi assassinado, o presidente quer vocês na cena do crime.

– Aonde?

– Em casa dele.

Nos organizamos todos e fomos a caminho da casa do governador, ou ex-governador. Alisson conduzia, Marcos estava na parte traseira do veículo e eu no banco a direita na parte de frente. Depois de umas horas de caminhadas chegamos ao local. Já encontramos a casa isolada, carros de policias rondavam o lugar, jornalistas e repórteres de tv lutavam para entrar e recolher informações. Passamos por todos eles, mostrei meu crachá na porta de entrada e eles abriram para nós. Quanto mais nos aproximávamos da sala da casa mais ouvíamos gritos de choros, entramos e nos deparamos com três mulheres chorando. Deduzi que eram a esposa e as filhas.

– Estas são a esposa e filhas do governador. – Disse Vanessa que já estava no local da cena do crime assim que chegamos.

– Onde está o corpo?

– Lá em cima, no quarto.

– Vocês mexeram nele?

– Não senhor, em momento algum.

– Leva-nos até o corpo. – Subimos as escadas até um quarto que se encontrava no primeiro andar. Lá estava ele, sentado em uma cadeira com a cabeça inclinada para trás e sangue seco que acabara de escorrer de seu pescoço.

– O que vocês acham? – Perguntei a Marcos e Alisson.

– Foi ele. – Disse Alisson.

– Marcos? – Perguntei.

– Eu quero saber é como ele entrou nessa casa. – Disse Marcos. – O sistema de segurança me pareceu ser um dos melhores, notei assim que entramos.

– Olha para janela, parece que ela foi perfurada por um lazer. – Disse Alisson.

– Os guardas disseram que houve um apagão que restabeleceu dez minutos depois. – Disse Vanessa.

– Então ele desligou o sistema de segurança. – Falei. – Usou o tempo entre o apagão e o restabelecimento da energia para invadir sem ser notado, subiu pela janela, furou ela com um lazer, esperou o governador entrar no quarto e fez que fez.

– Você disse que no ataque dele ao presidente, ele deixou uma escuta no local. Será que não fez o mesmo neste? – Perguntou Alisson.

– Eu vou lá em baixo fumar um pouco. – Disse Marcos. Sinceramente, ele só pensa nisso.

Parece até que só Alisson e eu estamos interessados em apanhar este individuo. Marcos desceu, enquanto isso... Alisson, eu e Vanessa começamos a procurar por escutas. Por fim, achamos uma. Peguei nela, ele estava a ouvir tudo do outro lado.

– Você está aí? – Perguntei com o aparelho na mão perto da boca.

Olá Micael, o que achou da minha obra de arte? – Perguntou a voz do outro lado, havia modificação nela, parecia um robô a falar.

– Se isso é uma obra de arte, então tu és um péssimo artista. – Falei.

– Eu não disse que tinha talento. – Respondeu ele com risos no final.

– Por quê você matou esse homem?

– Ele tirou algo de mim, algo muito valioso. Ele era um impuro e desonesto. Mereceu a morte.

– Tu és honesto?

– Você já ouviu falar de Digenes?

– Foi um filósofo cínico. O que tem ele?

– Ele fazia uma coisa muito estranha, ele pegava um candeeiro e andava com ele aceso pelas ruas a luz do dia. Quando as pessoas perguntavam o que ele está a faze?r ele respondia: Estou a procura de um homem honesto.

– Com isso queres dizer que homens honestos não existem.

– Você aprende rápido.

– Você matou um pai de família, eu quero saber o por quê?

Você lê a bíblia Micael?

– Nem tanto, tenho outras ocupações.

Eu leio e muito. Há uma passagem no livro de salmos que diz "Mil cairão ao teu lado, e dez mil, à tua direita, mas tu não serás atingido." Durante muito tempo eu achei que eu era esta pessoa que todos cairiam a sua volta mas não seria atingida, mas com o tempo eu descobri que eu sou quem deixaria cair todos, enquanto os inocentes não seriam atingidos.

– Então você se vê como um justiceiro? Mas por quê o governador?

Eu não posso te dizer o "Por quê" eu não sou burro. Imaginemos que eu te conte a seguinte história: matei esse homem porque ele roubou toda fortuna que eu tinha. Aí você vai ter ferramentas para me pegar, basta procurares por pessoas falidas no país, aos poucos você vai me achar. Eu não sou burro que nem vocês.

– Não importa, eu vou capturar você de qualquer forma.

– Com essa forma lenta de pensar e agir? Sério?

Que filho da mãe! Ele está a brincar com a minha cara, só pode. Vou puxar mas assunto com ele, eu preciso saber mais sobre ele, perguntas aleatórias ajudam bastante nisso.

– Você acredita em Deus? – Perguntei.

– Acredito, até que eu deixar de existir.

– Então a tua crença é limitada?

– É a teoria da subjectividade, se eu não existo, o mundo não existe. Se eu não existo, Deus não existe.

– Uma boa teoria, mas que não faz sentido nenhum.

– Se eu te dizer que tem um sapo com asas na índia, você acreditaria?

– Claro que não, Sapos com Asas não existem.

– É aí que entra a teoria da subjectividade, se tu não veres o sapo então ele não existe. Se tu morreres o mundo deixa de existir porque você morreu.

– Ainda assim ela não faz sentido.

Concordo, a existência corresponde a objectividade. Mas eu gosto dessa teoria. Ela me faz acreditar que eu sou meu próprio universo movido por mim mesmo.

– Eu sei, você é um homem com princípios. Você quer vingança, eu só não sei o por quê.

– Vingança é o meu oxigénio.

– Até pode ser, mas antes do oxigénio terminar eu vou apanhar você. Você vai cometer um erro em qualquer momento e esse erro vai me levar até você.

– Eu escalo o topo com uma corda no pescoço. Se eu cair morro asfixiado, pois não gosto de segundas chances. – A chamada foi desligada. Ele saiu da linha.

– Vamos rastear a ligação. – Disse Alisson.

– Não vai dar em nada, mas podem tentar. – Alisson levou o dispositivo para tentar rastear a ligação, fiquei em pé estático com o olhar fixo no cadáver do governador, eu só me perguntava "O que ele fez?".

O VILÃO NÃO MORRE NESTE LIVROOnde histórias criam vida. Descubra agora