TRINTA E OITO

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Passo os dias que se seguem até meu aniversário tentando me manter ao máximo ocupada. Tenho meu último dia de trabalho na Rabisco & Disco, torrando o salário com Bianca e Glorinha em todas as atrações das praias da redondeza. Elas fazem de tudo para que eu me divirta, tanto por estarem preocupadas com meu emocional quanto por quererem aproveitar minha presença. Mesmo que ainda me sinta um tanto consternada, os dias ao lado delas são maravilhosos.

Passamos a virada do meu aniversário em uma festa do pijama, com muita guloseima, máscaras de argila e maratona de filmes da Barbie. Dou tanta risada que quase me esqueço de Thalles. Quase.

Na manhã do meu aniversário, meu último dia na cidade, acordo mais cedo que o normal. Deixo minhas amigas dormindo e saio para caminhar a fim de apreciar meu primeiro nascer do sol com dezoito anos de idade.

Em vez de ir para a Queda da Mariposa, como fiz nos outros dias de caminhada, sigo um rumo diferente, atenta a cada filete de claridade que desponta no céu escuro. Quando estou me aproximando do meu destino, tiro os tênis e continuo o trajeto pela areia. O sol ainda não surgiu no horizonte, mas o céu está num tom cor-de-rosa bonito. Deixo que a maré alcance meus pés, congelando meus dedos, mas me deixando mais ciente de cada sentido.

Após saltar algumas rochas, meu coração começa a acelerar, inundando minha mente de memórias. Chego ao paredão de rochas que eu e Thalles costumávamos brincar na infância e onde demos nosso primeiro beijo. Todo o mural que desenhei como presente de aniversário para ele não existe mais, apenas resquícios de tinta e formas soltas. Há algumas pichações que eu não entendo e nomes acompanhados de datas. Passo os dedos por uma declaração (Luiza + Clara = Amor), sentindo a textura do pedregulho.

Nessa altura, o sol está no auge da beleza: uma bola vermelha surgindo por detrás da linha do mar, lançando cores quentes por todo o céu. Me sento em uma pedra e assisto o espetáculo natural com toda atenção possível, como se fosse meu filme favorito.

Perco a noção do tempo e só tomo consciência disso quando minhas nádegas começam a doer devido a superfície desconfortável do meu assento improvisado. Fico de pé, a fim de dar uma última olhada no paredão de pedra antes de partir. É então que meu olhar é atraído para uma frase num canto onde há mais resquícios da minha pintura, a familiaridade da caligrafia curvada me faz prender a respiração.

Sinto saudade todo dia, E.M.

A letra é de Thalles e as iniciais são minhas.

Choro pela primeira vez tendo dezoito anos.

            Apesar de não ter uma festa de aniversário desde os catorze anos, eu nunca recusaria uma boa refeição como comemoração

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Apesar de não ter uma festa de aniversário desde os catorze anos, eu nunca recusaria uma boa refeição como comemoração. Por isso, eu, meu pai, Glorinha e Bianca vamos almoçar frutos do mar no Sardinha. Mesmo tendo chorado pela manhã, este aniversário tem sido o melhor em muito tempo.

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