Moça do campo

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Ferguson é um descarado.

Só digo isso.

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O baile beneficente na residência do marquês de Mansfield seria o evento da semana entre os principais aristocratas da região de Cumbria.

Mansfield era o oitavo marquês de sua família, e conhecido por ser uma das figuras mais relevantes não apenas da região como também da Câmara dos Lordes. Era um homem focado na tradição, e nos interesses de seus pares em primeiro lugar. Casado pela segunda vez, já tinha um herdeiro: o pequeno Simon, de quatro anos, filho do primeiro casamento.

Esse baile tinha um objetivo: arrecadar dinheiro para contratar professores que dariam aulas às crianças na escola da vila. A maioria dos aristocratas não se importava muito em educar os pequenos, já que no futuro, eles não seriam mais do que colonos e criados; porém, o poder do duque de Cumberland suplantava as vontades pessoais dos nobres. Se Ferguson dizia que a escola da vila deveria ter professores de qualidade, a palavra dele era cumprida.

A maior parte dos aristocratas da região não engolia muito bem o fato de que o famoso duque de Cumberland não era um inglês "puro sangue". Filho de um escocês com uma inglesa, Ferguson era visto com desconfiança; muitos diziam que ele não servia apenas à rainha Vitória, como também defendia os interesses dos "bárbaros". Para completar, casou-se com uma moça das colônias, ao contrário do que se imaginava – a união com uma princesa de outro país, ou a herdeira de um outro duque, um matrimônio arranjado pela própria rainha Vitória.

Pelo contrário: ele se casou com uma moça alvo de comentários sobre ter sido freira no passado; e muitos à meia-voz comentavam o fato de ela ser negra, de uma colônia "insignificante", cujo nome indicava a origem "bárbara irlandesa".

- Mas tu acreditavas que ele iria se casar com uma de nós? - comentou, venenosa, Lady Franklin, esposa de um barão local, e considerada uma das belezas de temporadas anteriores.

- Por quê? Ele é filho de uma inglesa. – replicou Mansfield.

- Mas o sangue bárbaro suplanta.

- Bem, isso é verdade. Com certeza ele viu na... Como é o nome da criatura? Caitríona...- falou o nome da jovem como se escrevia, e não de acordo com a pronúncia. - Uma negra de Bermuda... Irlandesa.

- E ele escocês. Se equivalem.

Conscientes de que seriam o assunto do baile, Ferguson e Kat decidiram que não ficariam muito tempo afastados um do outro durante o evento, e quando em conversas com os convidados, seriam bastante neutros, já que o objetivo final era conseguir os recursos para trazer os professores. Mas o duque tinha consciência de que haveriam provocações; e apesar de saber que Kat conseguiria responder à altura, com o seu comportamento elegante; existiam elementos de malícia que ele temia a jovem não notar.

Sua esposa ainda possuía a inocência patente de uma freira.

Não queria era ser considerado um pária, e caso percebesse tal comportamento contra ele ou Kat, faria questão de expor a cada um quem era o homem mais poderoso ali.

O casal chegou à mansão do marquês na carruagem dos Cumberland, com rodas banhadas a ouro e detalhes curiosos inscritos, que se refletiram em curiosidade vinda da duquesa:

- O que significam as imagens talhadas nas rodas? – perguntou Kat durante o percurso.

- São signos do zodíaco. – respondeu, diante de uma Kat espantada.- Não sei se conheces essa história, mas acredita-se que as constelações podem indicar traços de personalidade das pessoas de acordo com a posição das estrelas no dia em que elas nascem. E um dos antigos duques, um dos meus ancestrais, era amigo de um antigo rei português, e os dois tinham um interesse em comum – signos do zodíaco. O rei possuía uma carruagem cujas rodas eram banhadas a ouro e tinham símbolos que representavam os signos do zodíaco. Esse antepassado meu se inspirou no amigo e solicitou a construção de uma carruagem idêntica.

A TentaçãoOnde histórias criam vida. Descubra agora