A culpa e o perdão

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Durante o caminho minhas mãos tremiam tanto tanto ao volante que comecei a pensar se eu poderia perder o controle desse carro. Minha testa está tensa e isso começa a me causar dor de cabeça, aguento até onde eu consigo, porém percebo que preciso descansar. A noite está chegando e meus olhos inchados estão implorando para se fecharem, acordei cedo e estou dirigindo ha horas, não irei aguentar até o distrito 12. Quero voltar logo para casa por vários motivos, primeiro irei me desculpar com minha família por perder tudo que eu havia conquistado para elas, em seguida me desculparia com Garry por não ter apoiado o casamento quando soube dele por um orgulho que absorvi por conta do meu melhor amigo. E ele, Peeta Mellark. Preciso me desculpar por ter me envolvido em seu corpo e sentimentos, ter me aproveitado de sua bondade carinhosa e logo em seguida tê-lo magoado. Magoar Peeta sempre doeu em meu peito, desde aquela primeira vez que discutimos eu sabia que depois de ter dito que deveríamos nos afastar ele não merecia me ver voltando com saudade, isso só iria magoar ambos. Estaciono em frente a uma hospedaria do distrito 8, pensei até em parar no distrito 3 por ser mais próximo, porém ficar lá só me traria memórias fortes. Suor, sussurros, apertos, beijos, respirações ofegantes e gemidos abafados.

- Boa noite senhorita? - balanço a cabeça e volto a realidade enquanto retorno ao mundo fora da minha cabeça para dar atenção ao homem da recepção.

- Oi, eu preciso de um quarto para ficar uma noite.

- Claro, você quer uma suíte?

Balanço a cabeça.

- O quarto mais simples estará ótimo.

Ele sorri e assente com a cabeça.

- Certo.

Remexo em minha carteira e vejo algumas notas, possivelmente as únicas que me restam já que meus cartões provavelmente estão esgotados.

- Quarto 109, tenha uma boa noite.

Curvo os lábios para ser simpática e agradeço, seguindo em direção para o quarto. Ele é simples, possui uma cama, cômoda ao lado, armário com gravetas e banheiro estreito. Jogo minha bolsa no chão e vou direto para baixo das cobertas, só quero me deitar. Os momentos que vivenciei hoje passam pela minha cabeça, não posso dizer que vai ser fácil deixar a vida estável que havia construído, logo passo a repetir para mim mesma que eu estava infeliz vivendo daquele jeito e finalmente havia me livrado. Quando eu era jovem, via meus pais apaixonados dançando na sala de estar abraçados e felizes, pensava que o casamento era incrível, uma dádiva, e imaginava que eu seria feliz com isso, só nunca imaginei que me decepcionaria com a minha escolha. Gale pode ter sido um garoto que eu gostei quando era mais nova, porém hoje em dia só consigo enxerga-lo como o homem que me mostrou o lado chato da vida. Ao lado dele eu comecei a trabalhar em uma empresa que não me deixava feliz, com ele eu tive que aprender a ser educada e segurar meus impulsos em frente a pessoas que me magoavam, como sua mãe, e junto dele eu passei a ficar carente, torcendo para que algum dia me tratasse com carinho. Estou com a cabeça muito pesada para pensar nisso agora, amanhã tenho que planejar como recuperarei minha poupança e meus fundos, além disso devo pensar em todas as desculpas que darei.

***

Foi difícil de acordar, já era mais tarde quando tive coragem de sair da cama para tomar um banho e trocar as roupas que estava usando, penteio meu cabelo e faço uma trança lateral nele. Saio da hospedaria e vou direto para o meu carro, estava tão ansiosa que nem consegui comer, só queria chegar em casa logo.

Já era meio da tarde quando vi a placa "Bem-vindo ao distrito 12". Meu coração começou a palpitar e senti minha garganta se fechar, meu ar parecia estar acabando e um sufoco me penetrou, nesse mesmo momento passei pela padaria Mellark e minhas mãos apertaram forte o volante. Forcei o acelerador e virei o rosto. Foco Katniss, primeiro vá até a sua família.

Ao estacionar na frente de casa já me senti mais aliviada, não havia nenhum carro na garagem, supus que nem Garry e nem mesmo Prim estivessem por aqui. Em parte agradeci, pois sei que vou ser recebida apenas por minha mãe, e já está na hora de conversarmos. Fecho a porta do carro e saio dele desolada, vejo a tela da varanda abrir-se e encontro ela saindo de dentro logo em seguida. Seu rosto está preocupado e assustado, ela larga o pano que se encontrava em suas mãos e eu me aproximo da varanda. Ela vai ao meu encontro e no momento em que finalmente nos abraçamos me sinto confortável, suas mãos geladas massageiam minhas costas e seguram minha cabeça com cuidado, seus beijos quentes em minha testa me fazem relaxar um pouco e até a dor de cabeça se esvai.

- Querida...

- Você sabia que eu iria voltar em algum momento, não sabia?

Olho dentro de seus olhos.

- Sabia.

- Por que não disse nada?

- Você tinha que voltar por vontade e decisão própria sua Katniss, você é adulta e tenho certeza que está indo pelo caminho certo.

- Posso até estar indo, porém fiz muitos estragos nesse meio tempo.

Ela sorri e balança a cabeça.

- Todos fazemos, filha - limpa minhas lágrimas e segura meu rosto - Sabe, seus avós não queriam que eu me casasse com o seu pai, ele tinha menos condições que a minha família na época e pensavam que eu iria ser infeliz e medíocre ao lado dele. Eles estavam errados, seu pai foi uma das melhores coisas que me aconteceram, assim como você e Primrose. Saiba que eu também quase escolhi o caminho errado, o caminho da "vida boa e estável", já havia até uma data marcada para o casamento com o tal sujeito, mas eu nunca apareci.

- Você falando parece tranquilo - olho para ela - a nossa poupança se foi...essa casa, não sei como irei pagar para você.

Ela apenas suspira.

- Querida, eu não tive depressão depois que seu pai morreu porque não tínhamos dinheiro como você pensa. Eu fiquei daquele jeito porque havia perdido o meu grande amor e o pai das minhas filhas.

- Pensei que estava fazendo certo trabalhando para te dar sustendo, achei que a curaria, que daria mais ânimo em sua vida...

- Vai demorar para você entender que essas coisas não valem muito, querida. Mas, fique tranquila, seu coração agora está em paz.

Balanço a cabeça em negação.

- Meu coração nunca estará em paz.

Ela franze a testa e seus olhos enrugam.

- Por que não?

Respiro fundo e fecho os olhos.

- Enquanto eu estava com Gale, eu... - fico com vergonha de mim mesma - eu estive com Peeta. Estive próxima dele.

Ela apenas assente, entendendo do que se trata.

- Parece que você é bem minha filha.

- Não me diga que fez o mesmo.

- Todos cometemos erros.

- Me sinto péssima pelo que fiz.

- Você estava errada e reconhece isso, se resolveu o assunto com Gale e agora veio se desculpar com Peeta, pode ficar em paz.

- Só ficarei em paz quando Peeta me desculpar.

- Se você o conhece bem, já sabe a resposta.

- Nao mãe, dessa vez é diferente, eu o magoei muito.

- Nao tem como você saber antes de tentar.

Pisco meus olhos freneticamente, com uma certa esperança.

- E onde ele está?

Reunidos por um casamento Onde histórias criam vida. Descubra agora