Cena III e Seguintes

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OS MESMOS, e sucessivamente as figuras que a seus tempos se irão indicando

FEITICEIRAS E FEITICEIROS

De Brocken ao rochedo,
correr, correr, bruxedo!
Onde a cana já loireja,
mas a espiga inda verdeja,
todo o bando unido seja.
Posto de alto e todo mano,
é o senhor Dom Fulano quem preside ao nosso arcano.

Por cima da folha, mais do pedregulho,
festança rasgada com todo o barulho.
O bode tresanda fartum que enfeitiça,
e a bruxa castiça, castiça e castiça.

UMA BRUXA

Lá vem, e vem só,
a velha Bóbó,
nossa rica avó.
Que flamante vem
para a patuscada,
toda escarranchada
numa porca-mãe!

CORO

Quem de todas é primeira,
toca-lhe ir na dianteira.
Tudo atrás da vo-vozinha,
que parece uma rainha
sobre a porca parideira.

UMA BRUXA (para outra)

Donde vens?

A OUTRA

Da roca
d'Ilsen, onde está,
dentro numa toca
funda negra e suja,
ninho de coruja.
Deitou-me de lá,
com ar macambúzio,
por ver a espreitá-la,
um lúzio... que lúzio!

BRUXA

Cal'-te aí! Quem te ora fala
de coruja? Subvertida
sejas tu!

OUTRA

Mas que pressa! Onde é a ida?

A OUTRA

Já do chouto vou ferida.
Podes vê-lo: olha este...

FEITICEIRAS E FEITICEIROS

Leva, leva, cavalgada,
que tão cedo não se apanha
ver o fim de tal jornada
por tais fragas de montanha.
A vassoira arranha.
O forcado fura.
E todas põe manha
na cavalgadura.
E o chouto nas panças
abafa as crianças.
E as mães coitadinhas,
a cada pinote
vão para as vizinhas
tocando fagote.

O CORIFEU DOS FEITICEIROS

Deixar lá ir as seresmas
de escantilhão nos seus potros.
Fica melhor a nós-outros
esta andadura de lesmas.
Se tudo vai para o paço
do Grão-Perro, não se queira
estranhar ao femeaço
que nos leve dianteira.

A CORIFÉIA DAS FEITICEIRAS

Falem, falem, linguarudos!
É que na estrada dos demos,
onde nós mil passos demos,
chegam num pulo os barbudos.

VOZ DO ALTO DO MONTE

Olá da lagoa,
vinde para a altura!

VOZ NA BAIXA

A vontade é boa,
mas o banho apura
do corpo a brancura.
Por isso, cá 'stamos,
se bem, coitadinhas,
que, mais que façamos,
por mais que lavamos,
por mais que esfregamos,
ficamos maninhas,

FEITICEIRAS E FEITICEIROS

Cala o vento; não há vê-la
meia estrela.
A baça lua
de todo amua.
Passa alvorotado
o bando encantado
como um turbilhão,
deixando crivado
de chispas o chão.

VOZ EM BAIXO

Parem, parem!

VOZ NO ALTO

Quem nos brada
dos algares do rochedo?

VOZ EM BAIXO

Levai-me deste degredo,
que a trepar pelo fraguedo
levo há já trezentos anos,
sem chegar à cumeada!
Deixai-me ir convosco hermanos!

O Fausto (1790)Onde histórias criam vida. Descubra agora