13- Wylan

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O jantar ocorreu no dia seguinte. Wylan sentia cruéis blocos de gelo dentro de si. Pedrinhas frias que agitavam-se sem parar em seu estômago, em seu peito, por todo seu corpo. Respirou fundo. Expirou. Quando abriu os olhos, uma enorme casa emergiu à sua frente. As portas azul cobalto eram convidativas e elegantes, de um jeito que a mansão Van Eck nunca seria. A mansão possuía colunas entalhadas em mármore branco, uma porta de madeira maciça extremamente pesada e um jardim com raras tulipas pintadas de Poliznaya. O casarão diante de si era o oposto: simples e encantador. Algo se revirou dentro dele.

"Você está bem?", O rosto anguloso de Jesper emergiu em seu campo de visão, bloqueando o encantador cenário. Ele exibia um olhar curioso, parecendo alheio ao que iriam fazer. Apenas as mãos o traíam, tamborilando levemente nas armas cuidadosamente escondidas em meio ao uniforme de serviçal que Nina havia roubado na cafeteria.

"Só um pouco nervoso", Wylan forçou um sorriso tranquilizante. Mexeu nos cabelos ruivos, e percebeu que os cachos estavam mais compridos, quase alcançando os ombros. "É que... teremos de ser muito cautelosos agora, qualquer movimento em falso e tudo entrará em colapso"

Ele não estava surpreso ao ver o sorriso brincalhão de Jesper em resposta. Aquele sorriso poderia fazer o mundo parar, exércitos se ajoelharem e Wylan enlouquecer. Só queria puxá-lo para perto e sentir seus lábios apertados contra os dele. Só depois Wylan se deixaria rir também.

"O que é a vida sem riscos?", disse, puxando as mãos do garoto. Wylan cedeu, permitindo-se ir em direção às largas portas. Jesper girou a maçaneta de metal dourado de uma vez. Wylan desvencilhou-se das mãos do garoto com suspiro e posicionou-se no que imaginava ser uma postura de serviçal, os ombros levemente arqueados para baixo, passos leves e discretos o levando para a missão. Missão. Era assim que Matthias chamava as emboscadas que eles entravam. Wylan sentiu uma pontada dolorosa no peito.

A brisa quente balançou as delicadas cortinas de renda branca, e um cheiro agradavelmente adocicado preencheu os pulmões de Wylan, que relaxou imediatamente. Chocolate quente com marshmallows. Era como um abraço afetuoso o envolvendo, uma sensação de segurança o cobrindo como um cobertor de lã macia.

Jesper não parecia abalado. Pelo contrário, olhava os arredores com uma posição alerta, o que surpreendeu Wylan. Havia uma ruga de preocupação entre as sobrancelhas do atirador enquanto analisava a acolhedora sala. O olhar inquieto percorreu os sofás abarrotados de almofadas coloridas trançadas em linho, o detalhado tapete característico das Colônias do Sul, e, por fim, o papel de parede de pequenas e delicadas rosas que se embaralhavam aleatoriamente em buquês amarrados por fitas douradas. Por fim, se virou em direção à lareira a qual um punhado de lenha queimava lentamente. Os estalidos da lenha ao fogo eram como música aos ouvidos de Wylan.

Jesper se aproximou rapidamente da lareira, os olhos já haviam perdido há tempos o tom brincalhão. Wylan deu um passo à frente para observar o motivo pelo qual o atirador estaria perturbado. O que viu foi uma poeira densa sobre os tijolos e as cerâmicas da lareira. Jesper passou a mão em um pequeno gato de cerâmica que era exibido diante da sala. Sua mão tornou-se cinza.

"Eles precisam dar uma limpada nessa lareira", Wylan brincou, tentando chamar a atenção de Jesper.

Jesper pareceu sair de um transe, olhando para Wylan com um pequeno susto. Seus lábios tornaram a ser puxados para cima novamente, formando um sorriso de canto.

"Já te conto", Jesper afirmou, limpando a mão na larga blusa marrom escura que servia de uniforme. Nina havia escolhido roupas largas para esconder as pistolas, só adicionando um xale da mesma cor, para garantir que não seriam vistas.

"Estão roubando alguma coisa?", uma mulher loira atarracada surgiu entre o batente da porta que levava à cozinha. Ela parecia brava.

"Desculpe-nos, senhora Hertzoon. Estávamos esperando ordens, e acabamos nos distraindo com essas belíssimas cerâmicas que você tem", Jesper relatou com os ombros encolhidos em uma postura envergonhada. Sua mão coçou a nuca devagar, a imagem de um menino tímido e ingênuo. Wylan, se não o conhecesse, acreditaria sem pensar duas vezes. Ele tentou imitá-lo.

A Sombra do Passado - Uma história de Six of CrowsOnde histórias criam vida. Descubra agora