- Merda, ainda estão molhadas.
Fazia um tempo que eu acabara de acordar, Arvid e eu havíamos dormido na pedra novamente porém dormimos com nossas roupas. Além de eu ter que explicar para minha mãe porque estou assim ainda terei resfriado.
- Tem banheiro no meu quarto, você pode tomar um banho melhor lá e pegar umas roupas emprestadas. - Arvid falou, também havia acordado.
- Suas roupas servem em mim, não é?
- Provavelmente, sou quase da sua altura, e nosso físico é até parecido. - Descemos da pedra, andamos mais um pouco e pulamos a cerca, logo indo em direção à sua casa.
Claro que não íamos andando realmente na rua, íamos por trás das casas ou até pelo mato alto, saíamos juntos todo dia, não poderiam nos ver assim tão fácil.
Chegamos em sua casa e Arvid pulou primeiro a janela e fui logo em seguida. Assim que ele soltou um suspiro por ter conseguido entrar, ouvidos batidas na porta e seu nome ser chamado.
- Merda... Já estou indo! - Respondeu a pessoa, que pela voz seria seu pai e então me mandou para o banheiro, foi isso que fiz.
- O quê eu faço? - Sussurrei.
- Você.. Me espere, irão estranhar o barulho da água. - Ele fecha a porta do banheiro comigo dentro e eu suspiro, logo me sentando no chão, o esperando.
Nesse tédio todo, acabei reparando em coisas bestas do banheiro, como, por exemplo, as toalhas eram alinhadas, a lixeira cheia porém o resto do banheiro era impecável.
Ouvi batidas na porta do banheiro e tomei um susto, então percebi que era apenas Arvid quando entrou.
- Que susto. - Suspirei falando baixo.
-Desculpe, olhe, peguei algumas roupas para ti. Tome um banho e se vista. - Ele deixa as peças encima de algo e vira de costas.
Ele iria ficar lá? Não que isso seja horrível, mas... Meu deus, isso vai ser estranho.
- Você vai.. Ficar aí mesmo? - Falei e Arvid deu uma olhada para trás, para mim, depois virou novamente.
- Vou.. Eu falei para meu pai que eu iria tomar banho então, seja rápido.. - Apenas respondi com um "ok" e tirei minhas roupas aos poucos porém meio apressado.
- Você vai sair com seu pai? - Entrei na banheira ainda de cueca, não me pergunte por que.
- Na verdade não sei, ele apenas disse que queria conversar comigo, provavelmente me levar algum bar e me usar para trazê-lo para casa.
- Entendo. Pelo menos você pode beber, não é? - Tirei a cueca lá dentro e então comecei a me molhar.
- Meus pais nunca me viram beber, no máximo vinho, mas meu pai aceita esse tipo então.. Acho que sim. - Arvid falou o final se virando para mim, como se fosse automático, e eu quase entro em pânico.
Assim que percebi que ele me olhara rápido, corei e joguei sabão na água para fazer bolhas e ele não olhar. Sim, nos amávamos, mas ainda havia limites (mesmo eu querendo isso também...).
- Ah, desculpe. - Ele fica de costas novamente.
- Tudo.. Tudo bem.
- Você.. Tem algum problema com isso não tem? De ficar pelado ou me deixar te ver. - Arvid falou de uma vez, como se fosse uma confissão. E eu não podia negar totalmente.
- Não é exatamente isso Arvid..
- ..Não tens confiança em mim? - Seu tom se voz saiu decepcionado.
- Não, claro que eu tenho Arvid, o quê está pensando? - Me levantei e peguei uma toalha, indo até ele. - Não quero que pense que não confie em ti, é só que.. Eu já disse uma vez, é tudo novo para mim, estamos indo devagar, não estamos?
- Eu não quero ir devagar! Eu quero viver com você e poder te ver por completo! - Arvid praticamente grita se virando para mim, com uma expressão de raiva mas ao mesmo tempo parecia que queria chorar. Igual à uma criança..
- Você não entende? Eu também tenho a maior certeza do mundo que quero viver com você, mas se não entende que eu todos temos um tempo para pensar, e que eu tenho medo desse mundo, não podemos ficar assim, juntos. - Falei olhandos em seus olhos e respirei fundo saindo do banheiro e pegando as minhas roupas úmidas mesmo.
- Ronald, por favor, desculpe-me. - Me seguiu e eu me vesti rapidamente. - Eu não te entendi direito eu sei! É só que.. - O interrompo.
- Não tente continuar isto. Não quero.. Falar contigo por agora. - Dei uma última olhada nele, até sair pela janela, nem olhar para trás.
Eu queria muito gritar no meio na rua, chorar bem dane-se para o mundo. Tantas perguntas que iriam me fazer, fazer para Arvid...
Ele praticamente gritou meu nome em seu quarto, claro que devem ter ouvido, e eu estou com roupas ainda molhadas voltando para casa, descalço ainda.
Não sabia se eu estava sentindo ódio, tristeza, rancor, nada! Eu só queria ficar só e pensar sobre tudo isso.
Entrei pela porta da frente de casa e minha mãe me olha surpresa.
- O quê aconteceu com voc.. - Interrompi ela.
- Não fale comigo, não me encha de perguntas, tá bom?! Não me incomode por um dia inteiro. - Entrei e fechei a porta do meu quarto com força.
Eu estava parecendo aqueles adolescentes rebeldes dos livros. Em toda minha vida só havia agido dessa forma com minha mãe duas vezes, e as duas ela praticamente me espancou.
- Que merda, que merda, quer merda... - Deitei em minha cama, de cara para o travesseiro.
Foi nossa primeira briga hoje. Eu.. Deveria ter deixado ele me olhar pelo menos, não devia ter falado aquilo para Arvid, pareceu que eu não gostava mais dele, mas eu o amo! Eu queria que essa cena toda fosse apenas um sonho.
Pensei tanto e tanto na mesma coisa que acabei dormindo, sem mesmo tomar um único banho descente.
[...]
Voltei ao meu quarto.
Dormi até de noite, não almocei, não comi nada o dia inteiro, mas minha barriga não roncava e eu não sentia fome. Finalmente tomei um bom banho. Assim que entrei, vi um bilhete que balançava com o vento vindo da janela e o peguei, logo sabendo que era de Arvid.
No nosso lugar.
Continua...
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Talvez em Outra Vida
Short StoryRonald era visto como o garoto perfeito da cidade, o dito marido perfeito para as damas. Seu mundo começa a se complicar quando a família Evans, os novos moradores daquela cidade pequena que praticamente ninguém visitava, chegaram; junto deles o fil...