O sol escondia-se por entre as montanhas e Aggie notava o cansaço evidenciar-se em Ruffos, não queria parar, mas não forçaria o animal a continuar. Desceu do cavalo e o puxou para próximo as árvores, escondendo-se em meio aos arbustos e permitindo-se chorar após presenciar o massacre de sua família. As lágrimas caíam silenciosamente, porém o grito permaneceu trancafiado em sua garganta rugindo para sair por seus lábios e libertar a dor que continuava presa em seu coração.
Não possuía ideia de para onde deveria ir, não poderia confiar em qualquer vilarejo próximo a região e questionava-se o que faria caso alguém cruzasse o seu caminho. O medo de ser considerada uma bruxa tomou o seu interior, conseguia vislumbrar a mesma situação de sua família acontecendo consigo. Recusava-se a morrer de maneira tão covarde pelas mãos daqueles que tiraram a vida de pessoas inocentes.
Sua mente custou a crer que os moradores de Eslma tenham denunciado as ações curandeiras de sua mãe e avó, levando-as para o seu fim, incluindo suas irmãs por ajudarem-nas. Lembrava-se perfeitamente dos sorrisos carinhosos e amigáveis que as mulheres receberam por seus tratamentos e a disposição que tiravam mesmo em seus piores dias para ajudarem aqueles que necessitavam, contudo essas amizades não consideraram entregá-las à forca por um punhado de moedas que não renderia na alimentação da semana. O império de Conrado mostrou-se pior do que o antigo imperador resultando no aumento da precariedade entre os vilarejos e alargando a fome consideravelmente, degradando territórios com a falta de cuidados na fertilização dos solos e com as cruzadas impostas, a guerra dizimava aldeias deixando o rastro e o odor forte da lâmina ceifadora que foi empregada contra o coração daqueles que ousaram se rebelar contra o seu soberano.
Aggie sentiu o afago em seus dedos e ergueu os olhos deixando seus pensamentos dissiparam-se por segundos ao encontrar Ruffos a fitando, acariciou a pelagem e sorriu mesmo que minimamente, ainda tinha ele ao seu lado e aquilo já era um grande passo. Respirou fundo controlando suas emoções — ou ao menos tentou — pegou a mochila e retirou de lá algumas maçãs estendendo para o cavalo que abocanhou a fruta com rapidez arrancando um riso dela. Seus olhos repousaram na capa dura e surrada do livro. O pegou e dedilhou sua escrita, “Os Ancestrais da Família Carrier, a história que não deve ser mencionada.” O arrepio percorreu sua coluna e abriu a primeira folha, a poeira refletiu os anos intocáveis do conteúdo.
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Era uma vez, uma bruxa (ANTOLOGIA)
Kısa HikayeQuando crianças ouvimos falar nas velhas bruxas; todas más, feias e solitárias. Como viviam em casas mal arejadas, empoleiradas em vassouras e embrenhadas numa floresta densa, no qual a luz mal chegava a elas. Diziam para termos cuidado, fugirmos de...