Quando Alberto abriu os olhos outra vez, o amanhecer já despontava atrás das colinas que cercavam Portorosso.
O grande peixe já havia ido embora e as anchovas o estavam seguindo, suas nadadeiras deixando para trás ondas que brilhavam com o sol em tons de rosa e laranja e azul claro. No vilarejo, as luzinhas começavam a se desligar e tudo começava a se colorir outra vez.
Era uma visão bonita que Alberto sempre gostava de apreciar. Mas, naquela manhã, ela não era o motivo de seu sorriso espontâneo e sonolento, oh não.
O motivo dele era o calor gostoso em seu peito que afastava qualquer frio; fosse da noite, fosse da maresia, fosse da solidão. O calor que era o rosto de Luca pressionado contra seu coração e os braços dele jogados ao redor de seu corpo, suas pernas emboladas debaixo do cobertor grosso.
Quanto tempo Alberto tinha esperado por isso...
Depois de Luca tê-lo beijado na noite anterior, Alberto se sentira tão feliz quanto jamais havia se sentido em toda sua vida. Mais do que pensou que poderia se sentir.
Porque depois que o pai o havia abandonado, ele pensou que mais ninguém poderia querê-lo por perto. Luca mudou isso quando chegou em sua vida. Ele mudava isso sempre que insistia em ir com ele para o forte, sempre que o fazia contar sobre tudo e com riqueza de detalhes sobre seu ano ali, sempre que o olhava nos olhos por longos minutos e apenas sorria, como se Alberto fosse a coisa mais importante que ele tinha, mesmo que pudesse ter o mundo inteiro ao seu alcance.
Luca, mesmo sem saber, silenciava o Bruno que havia em sua cabeça que o dizia que um dia Luca o deixaria como seu pai fizera. Que então Alberto voltaria a ser sozinho, deixado no mundo e esquecido por todos. Luca nunca o permitia falar quando eles estavam juntos. E Bruno sabia seu lugar o suficiente para nunca se atrever a falar nada quando Luca estava por perto.
Mas, depois da noite de ontem, Alberto sentiu que talvez ele houvesse se calado para sempre sobre aquelas coisas. Porque depois do primeiro beijo vieram muitos outros, e então risadas tímidas e bobas e um abraço forte que parecia que iria uni-los em um só.
Alberto nunca tinha beijado ninguém. Ele sabia o que era, é claro. Os pais de Luca e o pai de Giulia não pareciam dispostos a ensiná-lo do que se tratava, mas ele fez como sempre havia feito em toda sua vida: aprendeu por conta própria.
Tinha feito amigos em Portorosso depois que Luca foi embora pela primeira vez, amigos que cultivava até os dias de hoje, que sabiam mais sobre o mundo e os costumes humanos do que ele e que lhe ensinaram muitas coisas sobre relacionamentos.
Foi quando Alberto descobriu que amava Luca.
E o amava tanto que havia sido capaz de abrir mão de seu sonho para realizar o sonho dele, porque a felicidade de Luca era muito mais importante.
Naquela época, ele nem havia pensado sobre essa decisão. Mas então ela havia feito muito sentido.
E desde então, seus sentimentos por Luca apenas aumentavam. E ele esperava o dia em que pudesse dizer isso à ele.
Ontem, ele finalmente pôde dizer. Pôde confessar o segredo mais precioso de seu coração apenas para os ouvidos de Luca, sussurrando baixinho, segurando-o perto e sentindo seus corações acelerados baterem juntos.
E o de Alberto bateu ainda mais forte quando Luca confessou sentir o mesmo.
E eles ficaram em silêncio partilhando aquele segredo até que Luca adormeceu, seus cachos castanhos esparramados na plataforma acolchoada que Alberto havia dado um jeito de instalar ali em cima. Então ele levantou, buscou o cobertor no andar de baixo do forte e voltou, cobrindo Luca até o queixo e se deitando ao lado dele.
E o outro, mesmo adormecido, se achegou para perto dele e enfiou o rosto em seu peito, os braços se enroscando em seu corpo, e suspirou contente. E assim ficou até que Alberto adormeceu e acordou outra vez.
Observando os primeiros raios de sol brilharem na copa das montanhas verdejantes, Alberto soltou uma risadinha pelo nariz, beijando os cabelos encaracolados do garoto abraçado a ele.
Ele não podia acreditar na própria felicidade. Porque apesar de ter aprendido sobre beijos, sobre relacionamentos e sobre o amor, Alberto sabia, no fundo de seu ser, que havia apenas uma pessoa com quem ele queria tudo aquilo e pensou que ela estaria fora de seu alcance para sempre.
Mas Luca estava mais próximo do que nunca.
— Buongiorno — veio a voz sonolenta, soando por sua pele, e Alberto se afastou um pouco para ver os olhinhos castanhos piscando para ele na luz da alvorada.
Então Luca bocejou, voltando a se aproximar e se enroscar em seu peito. Alberto sorriu outra vez.
— Buongiorno, amore mio.
— Você não conseguiu dormir?
— Na verdade, acabei de acordar.
— Dorme mais um pouco.
— Mas, se eu dormir, como vou te mostrar a sua surpresa de boas-vindas?
Com aquilo, Luca voltou a erguer os olhos, como Alberto sabia que faria. Ele nunca deixaria de ter aquela alma curiosa.
— Uma surpresa? O que é?
— Se eu contar, Luca, vai deixar de ser surpresa — rebateu, sorrindo preguiçoso, e Luca riu.
— Por que não me mostrou ontem quando cheguei?
— Porque sempre que você volta da escola há sempre tantas pessoas ao seu redor, querendo falar com você e matar a saudade e blá blá blá — revirou os olhos, e Luca riu outra vez. — Um cardume irritante de peixes. Eu quase não pude te ver.
— Alberto, eu fiquei o tempo todo do seu lado! — rebateu, rindo, e Alberto o olhou com tédio.
— É, sei, tá. Mas enfim — ele voltou a sorrir. — Eu não poderia mostrar a surpresa ontem porque queria que fosse algo apenas seu. Bem... na verdade, nosso. Você e eu.
— E o que é?
— Já disse que vai deixar de ser surpresa se eu te contar.
— Então me mostra!
Luca se afastou e sentou, em seguida saltando animado e parando de pé, olhando Alberto com os olhinhos castanhos brilhantes.
Alberto também se levantou, rindo.
— Você não tinha dito para que voltássemos a dormir?
— Isso foi antes de eu saber que tinha uma surpresa esperando por mim.
Alberto então chegou mais perto dele, gostando da maneira como o fato de Luca ser alguns centímetros mais baixo o permitiam beijar sua testa sem esforço. Enrolou as mãos em sua cintura e apertou, sentindo Luca tocando seus ombros.
— Então vem comigo.
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N/A: Isso aqui era para ter sido só uma oneshot. Mas então eu me peguei pensando: “Você sabe que quer escrever mais. Não precisa de uma fanfic nova, super grande e elaborada para isso. Apenas continue.”
Então cá estou eu. Obrigada a todos que leram, votaram e comentaram. Amo vocês.
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Sob as Anchovas
Fanfiction{Luca x Alberto} ...e eles voltavam para ela todos os anos quando Luca voltava para casa. E se deitavam lado a lado na plataforma de madeira do topo, olhando para as anchovas brilhantes acima deles enquanto Luca contava tudo o que havia para ser co...